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Desapropriação no Pará beneficia dois empresários
Proprietários de 7,6% da área onde será construída usina siderúrgica da Vale devem receber 59% da indenização
Valores dados para terrenos dos empresários excede em 1.700% os estimados para terras vizinhas; governo diz que reavaliará indenizações
JOÃO CARLOS MAGALHÃES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM MARABÁ
JOÃO PAULO GONDIM
DA AGÊNCIA FOLHA
O Estado do Pará planeja gastar R$ 60,1 milhões para desapropriar 26 propriedades de
uma área em Marabá (568 km
de Belém) onde será construída
uma siderúrgica da Vale. Estimativas do governo estadual
indicam que, deste custo, 59%
(R$ 35,4 milhões) se referem a
dois terrenos que ocupam apenas 87,2 hectares (7,6%) dos
1.135 desapropriados.
Eles pertencem a Winston
Diamantino, um dos maiores
empresários da cidade, e a um
de seus funcionários, Gilberto
Leite, que, como presidente da
Associação Comercial e Industrial do município, participou
das negociações para que a Vale
levasse a usina a Marabá.
Em 2006, o grupo empresarial de Diamantino doou R$ 38
mil a candidatos a deputado estadual. Desse total, R$ 18 mil
foram para a hoje deputada
Bernadete ten Caten (PT).
Os valores calculados para as
terras de Diamantino e Leite
(R$ 23,9 milhões e R$ 11,5 milhões, respectivamente) superam, em alguns casos, em
1.700% os estimados por terras
contíguas às deles, pertencentes a outros proprietários, segundo as 16 estimativas a que a
reportagem teve acesso.
Exemplo: a indenização de
um terreno chamado de lote 06
(85 hectares) está estipulada
em R$ 3,8 milhões. Proporcionalmente, isso representa mais
de 860% de diferença em relação aos R$ 23,9 milhões pelos
55,3 hectares de terra de Diamantino contíguos a esse lote.
Exemplo 2: Cada um dos 33,2
hectares do dito lote 02 valem,
segundo o governo paraense,
R$ 30,7 mil. Diferença de mais
de 1.000% em relação à área de
Leite, da qual é uma continuação, e de cerca de 1.300% em relação à de Diamantino.
A maior disparidade, porém,
se dá em relação ao pagamento
por terras sem benfeitorias. A
diferença entre o valor da "terra nua" no lote 06 e na área de
Leite é de 1.700% -R$ 19,8 mil
por hectare contra R$ 357,6
mil. Se comparada com à de
Diamantino (R$ 278,1 mil por
hectare de "terra nua"), a diferença é de mais de 1.300%.
No dia 6 de agosto, três semanas após o primeiro contato da
Folha questionando as desigualdades, o governo do Pará
disse que iria refazer os laudos.
A Procuradoria Geral do Estado, que negocia com os proprietários, nega irregularidades.
A reportagem ouviu cinco
dos que foram desapropriados
pelo decreto da governadora
Ana Júlia Carepa (PT). Nenhum disse que as terras de
Diamantino e Leite estão supervalorizadas. Um deles disse
que o governo avaliou corretamente só os terrenos dos dois.
Para ele, os preços elevados se
justificam pela localização das
áreas, próxima ao rio Tocantins
e à rodovia Transamazônica.
O Ministério Público Estadual pediu ao governo do Pará
documentos para esclarecer a
desigualdade. Surgiram também ações na Justiça por parte
dos que se dizem injustiçados.
Em uma das ações foi concedida liminar para paralisar o
processo de desapropriação,
mas ela acabou sendo derrubada pelo Tribunal de Justiça.
As ações também contestam
o interesse público da desapropriação, visto que quem se beneficiará diretamente com o
processo será a mineradora,
uma empresa privada.
A Vale afirmou que ainda não
foi definido se ela reembolsará
o governo pela quantia que vier
a ser paga aos desapropriados
ou se receberá os 1.135 hectares
como doação.
O imbróglio pode atrapalhar
a construção da siderúrgica, na
qual devem ser gastos aproximadamente R$ 6 bilhões. Reivindicação antiga do Pará, o
projeto só chegou ao Estado
com a ajuda do presidente Lula
e da ministra Dilma Rousseff
(Casa Civil).
A expectativa inicial é que a
solução para o problema estivesse encaminhada até o dia 25
deste mês, quando Dilma iria a
Marabá para a assinatura de
um termo de compromisso da
construção da usina.
Mas a disputa deve se alongar, já que, por enquanto, poucos proprietários aceitaram os
valores do governo. Diamantino é um dos que aceitaram.
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