São Paulo, domingo, 15 de outubro de 2006

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ELEIÇÕES 2006 / PRESIDÊNCIA

Urna premia ação assistencialista de Lula

Votação do presidente foi proporcionalmente maior onde programas sociais e incidência do salário mínimo são mais intensos

Política de transferência de renda ajuda a explicar baixo crescimento; governo tira dinheiro de quem produz para dar a quem não produz

FERNANDO CANZIAN
DA REPORTAGEM LOCAL

O resultado das urnas no 1º turno é um retrato do governo assistencialista e pró-pobre de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Quanto maior a concentração de programas sociais e assistenciais nos Estados, maior foi a votação do presidente. O mapa do Brasil com a incidência por Estado do atendimento do Bolsa Família, por exemplo, é um "decalque" da votação obtida por Lula na maioria das unidades do país.
O mesmo vale para o peso do salário mínimo por região e os votos válidos obtidos no 1º turno. Reajustado em quase 25% em termos reais (acima da inflação) no atual governo, o mínimo é o indexador de aposentadorias e benefícios assistenciais pagos pela Previdência.
Os efeitos dessa maior transferência de renda pública para os indivíduos mais pobres teve reflexos importantes na economia de cada região. A evolução das vendas nos últimos 12 meses, por exemplo, revela que onde o comércio cresceu mais, a votação de Lula também avançou mais na comparação com seu desempenho no 1º turno em 2002.
Na mesma comparação com 2002, o desempenho de Lula em 2006 nas regiões Norte e Nordeste foi muito superior em 1º de outubro último.
Nos Estados do Nordeste, entre 42,1% e 50% da população vive em famílias atendidas pelo Bolsa Família. Na região, 46% dos trabalhadores e beneficiários da Previdência recebem salário mínimo.
Lula teve de 56,1% a 80% dos votos válidos no Nordeste, seus recordes. Na região Norte, onde o Bolsa Família atinge entre 26,1% e 42% da população e o salário mínimo, 31% dos trabalhadores e beneficiários da Previdência, Lula teve entre 44,1% e 68% dos votos válidos.
Norte e Nordeste também foram as regiões onde o comércio teve um desempenho superior à média nacional. No Nordeste, cresce quatro vezes mais. Nas demais regiões (Centro-Oeste, Sudeste e Sul), a votação de Lula seguiu a mesma tendência. Nelas, o Bolsa Família atinge entre 10% e 26% dos habitantes e o salário mínimo entre 18% e 23%. Lula teve entre 20% e 44% dos votos válidos.
O desempenho de Geraldo Alckmin (PSDB) seguiu exatamente o mesmo padrão, mas de modo inverso. Onde há menos programas sociais e pessoas recebendo salário mínimo, o tucano teve mais votos. "Tirando o aspecto da corrupção, é impressionante como Lula cumpriu o que prometeu, que era governar para os mais pobres. E o dividendo eleitoral é claro", afirma Celso Toledo, economista-chefe da MCM Consultores.
Toledo afirma que, para transferir renda, qualquer governo precisa tirar dinheiro de quem produz para dar a quem não produz, o que explicaria a tendência de crescimento baixo dos últimos anos.
"Como a desigualdade no Brasil é grande, isso até faz sentido. O problema é que o setor produtivo já está absolutamente estrangulado, e o sacrifício em termos de crescimento acaba sendo bem maior", afirma.
O cientista político Leôncio Martins Rodrigues diz que o resultado da votação vinculado às transferências de renda revela que o eleitor brasileiro ainda não consegue ter "um comportamento político autônomo".
"Como essa grande população é paupérrima, ela continua propensa ao voto clientelístico e a manter sempre a expectativa de receber algo do Estado." Para o sociólogo Antônio Flávio Pierucci, os programas sociais são importantes, mas precisam ser relativizados. "Esse dinheiro vai direto para o bolso, mas toda a encenação do governo Lula é um longo minueto pró-pobres", afirma.


Colaborou MÁRIO KANNO , da Redação


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