São Paulo, domingo, 15 de outubro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

JANIO DE FREITAS

O iluminado e as obscuridades

Até agora, a PF não sugeriu o tipo de crime que haveria na expectativa de compra de um dossiê de informações

BOA NOTÍCIA para escapar um pouco ao bate-estaca de Lula x Alckmin e suas torcidas desorganizadas, só uma ao meu alcance: é pouco dizer que Oscar Niemeyer recupera-se muito bem da fratura e da cirurgia. A plenitude dos seus 98 anos está em vias de iluminar-se com novo casamento, silenciado até para os amigos próximos.
Mas há que voltar ao mundo dos comuns. Ou abaixo disso. A maior originalidade do "caso dossiê" está em ser um inquérito de Polícia Federal e Procuradoria da República que precisaria ser submetido a um inquérito de Polícia Federal e Procuradoria da República, para desvendar alguns procedimentos do primeiro.
Já no seu compasso inicial houve a dispensa do flagrante, sempre procurado pelas polícias, do pagamento e recebimento do dossiê em hotel paulistano. Por que? O flagrante foi substituído pela conexão entre PF de Cuiabá e um delegado da PF, em coincidente plantão, para fazer no hotel duas prisões sem ilícito definido. Até agora, a PF não sugeriu o crime que haveria na expectativa de compra de um dossiê de informações, mesmo que com propósitos eventualmente eleitorais. O mistério da origem do dinheiro, que até agora a PF também não conseguiu caracterizar como criminosa, só apareceu depois das duas prisões no hotel. Por que tal operação em lugar do flagrante, admitindo-se a hipótese de motivo para fazê-lo?
Antes de qualquer investigação da PF ou da Procuradoria da República, o procurador em Mato Grosso, Mário Lúcio Avelar, deu entrevistas com a insinuação inequívoca de que o dinheiro apreendido procedia do governo. Não indicou pista alguma nesse sentido. Que motivos o levaram à grave insinuação, assim como a outras entrevistas que deu?
Desde que fez as prisões no hotel paulistano, o delegado da PF Edmilson Pereira Bruno manteve-se próximo de repórteres, inclusive dentro da PF em dias de sua folga, com contribuições ao noticiário fermentativo. Não tardou a distribuir, para um grupo de repórteres, jogos de fotos das pilhas impressionantes de dinheiro apreendido. Mentiu para fazê-las, passando-se por delegado do inquérito. Mentiu aos superiores na PF, negando a autoria da distribuição. Identificado como único possível autor das fotos e da distribuição, mentiu ao dizer que o fizera para proteger-se "de uma armadilha", porque furtaram de sua mesa um dos três CDs com as fotos. Mas "O Globo", presente à distribuição, deixou discreto registro de que, já ao fazê-la, o delegado Edmilson Bruno "disse que iria reportar a sua chefia que o CD entregue aos jornalistas havia sido furtado: "Isso aqui (o CD) alguém roubou e deu para vocês. O que vai parecer? Que alguém roubou [da mesa dele] e vazou na imprensa'". Por que isso tudo?
Desde os primeiros depoimentos de Luis Antônio Vedoin, o empresário Abel Pereira é apontado como intermediário de altas liberações de verba da corrupção da Saúde, quando ministro, em 2002, Barjas Negri. O delegado Diógenes Curado, da PF em Cuiabá, proporciona notícias diárias de convocações de Aloizio Mercadante e Ricardo Berzoini para depoimentos. Até hoje não tomou depoimento de Abel Pereira, nem o procurador Mário Lúcio Avelar o fez. Por que não, se Abel Pereira tem até o agravante de outras ligações, inclusive financeiras, com negócios dos Vedoin?
Nada disso sugere ou nega obra do PSDB, nem exclui ou confirma outra ópera do PT. Serve, porém, como introdução a muitas estranhezas e obscuridades que PF e Procuradoria da República mais criam do que dissolvem e explicam.


Texto Anterior: Rio de Janeiro: Depois do PT, Cabral recebe apoio do PSDB
Próximo Texto: Eleições 2006: Empresas pró-Lula agora doam para Alckmin
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.