São Paulo, domingo, 15 de novembro de 1998

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JANIO DE FREITAS

Quem faz as contas

E por falar em dinheirama no exterior (ou você, por acaso, não estava pensando nisso?), a aplicação no mercado financeiro, também externo, das dezenas de bilhões de dólares da reserva brasileira constitui o mais rendoso e mais desconhecido negócio do Brasil. E, com certeza, um dos mais rendosos e mais desconhecidos do mundo.
As comissões pela aplicação dos dólares possuídos pelo Brasil (hoje US$ 42 bilhões, que eram US$ 75 bilhões até setembro) representam uma enormidade de dinheiro, sobre a qual não se dispõe das informações que é justo esperar de qualquer governo.
Tamanha massa de dinheiro excita a cobiça dos grandes bancos aplicadores e corretoras do mundo todo, para participar dos lucros com as operações no mercado financeiro. Não há, porém, nem a mais tênue clareza sobre a escolha dos bancos e corretoras internacionais agraciados com o privilégio de operar, mundo afora, as dezenas de bilhões.
Não consta que haja concorrência para a escolha desses operadores privilegiados.
Como é feita, então, a escolha?
Mais importante ainda, quem participa dessa escolha tão valiosa? Ou, mais claramente, quem a negocia? Não faltariam por parte dos corretores internacionais, para conseguir os milhões de lucro com a operação dos bilhões, propostas com vantagens especiais que são feitas até a investidores privados, desde que mais abonados do que a média. Que propostas são feitas, digamos, ao Brasil?
O destino das reservas é definido, claro, nas culminâncias do governo. Consta que esse destino, em termos geográficos, é a Europa, para evitar riscos provenientes de dívidas nos Estados Unidos. Mas a aplicação na Europa não exclui, necessariamente, bancos e corretoras americanas, também lá instaladas. Por fim, consta que o grosso dos dólares está em apenas cinco operadores -o que sugere, entre outras coisas, uma concentração arriscada.
Mesmo essas aparentes respostas são, na verdade, apenas perguntas. Nada é claro nas aplicações externas dos bilhões cujo sobe e desce está condenando o Brasil a mais anos perdidos. Ou vidas perdidas.
E por falar em dinheirama no exterior, há um modo simples de eliminar, com razoável rapidez, o clima de escândalo e suspeições que Fernando Henrique Cardoso diz, com o conhecido otimismo, haver chegado já aos limites. Basta-lhe fazer, agora, a proposta que Mário Covas fez logo em sua primeira reação, embora, por motivos compreensíveis no seu caso, ninguém se interessasse por aceitá-la.
É só oferecer uma procuração plena para verificação, em Cayman e seus condutos, do que sugerem o papelório e o palavrório dominantes. Um advogado de reconhecida idoneidade, escolhido em comum por Fernando Henrique e, por exemplo, pela OAB, por certo prestaria tal serviço ao país. Não tem que mexer com propriedade da fazenda ou com o real valor das quotas da agropecuária Córrego da Ponte Ltda. Nada disso. Só Cayman e adjacências.
O Brasil conta com esse gesto.



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