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DOMINGUEIRA
Tudo é perigoso
MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
Editor de Domingo
De volta ao Brasil, a mesma
dança. Fundo Monetário,
grampo telefônico, denúncias
sobre contas no exterior. Atavismo, signo trágico, destino
inelutável?
Certo é que vivemos num país
"double face", ora vestido com
a casaca da indignação moral,
ora com o chapéu malandro do
Zé Carioca. Um país que cria
normas para não cumpri-las ou
deixa de criá-las para institucionalizar a informalidade, a
zona cinzenta das transgressões e irregularidades que "todos" cometem.
Um país pendular e também
perigoso tanto quanto a Itália,
que acabou levando aos tribunais líderes da elite modernizadora de lá, o socialismo "europeu" da rica Lombardia, representado por gente como Craxi,
hoje com residência na Tunísia.
Num desses programas tipo
"Globo Repórter", exibido há
anos, sobre o consumo tresloucado de drogas em cidades do
interior paulista, o jornalista
chegava a uma praça e entrevistava, na penumbra, um grupinho de malandros.
"Vocês compram droga aqui,
abertamente?" E a resposta,
com o característico sotaque
caipira:
"Claro que nós compra, isso
aqui é Amsterdã, ô meu!"
A capital holandesa nada tem
a ver com a idiotia entorpecida
dos rapazes interioranos, mas
se tornou uma espécie de lenda
do liberalismo comportamental
ao trazer para a luz do dia atividades como a prostituição e o
consumo de "drogas leves". São
coisas que em outros lugares
acontecem à sombra, sob o signo da violência, da degradação
e da corrupção.
As estatísticas favorecem a
Holanda, embora sua política
seja considerada perigosa e
combatida por vizinhos, sob
pressão dos EUA, país que tem
um apreço especial pelo raciocínio bélico chama sua custosa
e ineficaz estratégia para o setor de "war on drugs".
Os americanos aprenderam
algumas coisas com os holandeses, mas têm uma sociedade
bastante diferente, que procuram impor como modelo universal. Diferentemente dos
EUA, no alegre calvinismo da
Holanda, em sua inteligente vida liberal, em sua formidável
tradição estética, fuma-se e traga-se.
Em Amsterdã as janelas ficam abertas, o bem-estar é invejável, os automóveis pedem
licença, as bicicletas reinam e a
cidade flutua, como um sereno
galeão.
Há, é verdade, uma vantagem
de escala e de "cultura" a favor
da Holanda, país pequeno, que
desconhece a existência de metrópoles, periferias, deslocamentos de massas e desigualdades agudas.
Sorte deles.
Com exceção da imprensa especializada em economia, pouco ou nada se fala do Brasil na
mídia européia. Mas uma coisa
continua chamando a atenção:
o único produto brasileiro facilmente encontrável, inclusive
em ambientes sofisticados, é a
música popular. Da trilha sonora da loja Gucci em Milão às
prateleiras das megas e alternativas lojas de CD, ela está lá,
ao lado do melhor.
Caetano Veloso tem lá suas
razões.
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