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JUDICIÁRIO
Dos 6,68 milhões de processos em andamento, 4,36 milhões são cobranças de tributos municipais e estaduais
Governo é autor de 65% das ações em SP
CLÁUDIA TREVISAN
da Reportagem Local
O governo e os municípios de
São Paulo são os principais responsáveis pelo elevado número de
processos que tramitam hoje na
Justiça Estadual. Dos 6,68 milhões
de casos, 4,36 milhões, ou 65,2%,
se referem à cobrança de tributos
estaduais e municipais, segundo
dados do próprio Judiciário.
A situação é semelhante em âmbito federal. Cerca de 60% dos recursos que chegam ao STF (Supremo Tribunal Federal) e ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) são
propostos por entidades governamentais: União, Estado de São
Paulo e INSS (Instituto Nacional
do Seguro Social).
O principal efeito da multiplicação dos processos é a lentidão do
Judiciário. Não há estatísticas precisas sobre o tempo médio de julgamento no Brasil. Mas não há dúvida de que é longo.
Em seu "Relatório sobre Desenvolvimento Mundial/97", o Banco
Mundial estima em 1.500 dias
-ou quatro anos- o período médio de demora dos processos no
Brasil. Na França, segundo o mesmo estudo, o prazo é de cem dias.
Má distribuição
A situação é agravada pela nem
sempre racional distribuição de tarefas entre as áreas do Judiciário.
Há comarcas do interior, principalmente as pequenas, nas quais a
relação entre o número de juízes e
de processos é equilibrada.
Nas cidades médias, a situação é
pior. Geralmente, elas ainda têm
estrutura judiciária de comarcas
pequenas, mas recebem um volume de processos muito maior.
O reduzido número de juízes é
outro complicador. Em todo o Estado, há 1.600 magistrados, dos
quais 1.274 em primeira instância,
em que começam os casos.
Existem outras 350 vagas não
preenchidas por absoluta falta de
pessoas aptas. Nos concursos para
juízes realizados em São Paulo entre 89 e 97, o índice de aprovação
ficou abaixo de 2%.
"Em geral, o nível cultural das
pessoas que saem das faculdades
de direito é muito baixo", afirma o
advogado e articulista da Folha
Walter Ceneviva.
No Brasil, em 95, havia um juiz
para cada grupo de 26.433 habitantes, segundo levantamento realizado por Maria Teresa Sadek e
Rogério Arantes, pesquisadores
do Idesp (Instituto de Estudos
Econômicos, Sociais e Políticos).
Na Alemanha, a relação é de um
juiz para 3.448 habitantes. Na Itália, existe um juiz para 7.692 pessoas, e, na França, 7.142.
Execuções
A má distribuição de tarefas fica
evidente no setor de execuções fiscais, que são as ações propostas
pelo Estado e pelos municípios para cobranças de tributos.
Na cidade de São Paulo, há sete
juízes e 2,5 milhões de processos
de execução fiscal -uma média de
357 mil casos para cada um.
Se os 6,68 milhões de processos
existentes hoje no Estado forem
divididos pelos 1.600 juízes, a média cai para 4.175.
Além da sobrecarga, os juízes das
execuções enfrentam a dificuldade
de solução dos processos.
Grande parte dos casos se arrasta
há anos. Até décadas. O acúmulo é
revelado nas estatísticas de movimentação de processos feitas pelo
Tribunal de Justiça.
O número de novas ações de execuções fiscais é sempre menor que
o de casos cíveis -os que tratam
de pendências como contratos de
aluguel e relações de família.
Em outubro, foram distribuídas
em São Paulo 141.835 ações cíveis e
69.059 execuções. Mesmo assim, o
total de execuções fiscais em andamento hoje é muito superior ao de
casos cíveis: 4,36 milhões contra
1,67 milhão.
Há três anos, havia 2,15 milhões
de execuções, quase metade do
número atual.
Uma das principais dificuldades
nesse tipo de processo é a localização de devedores. Quando são encontrados, nem sempre possuem
bens para garantir o pagamento da
dívida. E os bens localizados muitas vezes são insuficientes para
quitar o débito, o que exige a continuidade do processo.
O excesso de execuções fiscais já
levou o Contru (Departamento de
Controle do Uso de Imóveis) a
alertar o Judiciário sobre o prédio
onde funciona o setor, que não teria estrutura para suportar o peso
da grande quantidade de papel.
Outros juízes
Outras áreas do Judiciário também estão sobrecarregadas, ainda
que em menor grau.
Wiliam Lima Cabral, juiz-diretor do Fórum João Mendes, o
maior do Estado, estima que seus
colegas dão uma média de 150 sentenças por mês. "Em alguns países, esse é o número de sentenças
por ano", afirma.
Da mesma forma que a Justiça
Estadual, a Justiça do Trabalho e a
Justiça Federal recebem um número de processos superior à sua
capacidade de julgá-los.
O presidente da Associação dos
Magistrados da Justiça do Trabalho da 2ª Região (São Paulo e Baixada Santista), Pedro Garcia, calcula que cada Junta de Conciliação
e Julgamento de São Paulo recebe,
em média, 3.500 novos processo
por ano.
Só em 1996, foram propostos
cerca de 2 milhões de ações trabalhistas em todo o país.
No caso da Justiça do Trabalho,
Garcia acredita que a solução não
está no aumento da estrutura, mas
na radical mudança da legislação e
da organização sindical.
Garcia defende autonomia e pluralidade sindical ao lado de maior
incentivo à negociação entre as
partes. Em sua opinião, a legislação atual privilegia o conflito individual em detrimento das soluções
coletivas, o que eleva o leque de
disputas que chegam à Justiça.
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