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GOVERNO PETISTA
Ata de reunião de servidores revela pressão sobre o ministro
Sindicalistas tentam lotear superintendências do Incra
DO DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
À surdina, bem longe dos holofotes, o sindicalismo petista e os
movimentos sociais promovem
um cerco ao Ministério do Desenvolvimento Agrário. Vigiam de
perto o loteamento. Não de terras,
mas de cargos públicos. A Folha
obteve documentos que expõem
o tipo de pressão a que está submetido o ministro Miguel Rossetto, gestor da reforma agrária.
Uma pressão que combina a práxis de esquerda (aprovação de
candidatos a cargos públicos em
assembléias) a métodos da direita
(encaminhamento de listas com
os nomes dos apadrinhados).
O tom ideológico que ronda os
gabinetes do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária) contrasta com a moderação exibida em outras repartições do governo -o Ministério
da Fazenda, por exemplo.
Os papéis manuseados pela reportagem foram produzidos pela
CNASI (Confederação Nacional
das Associações dos Servidores
do Incra), entidade afinada com a
CUT e simpática ao MST. Um dos
textos chama-se "Memória de
Reunião". Refere-se a encontro de
dirigentes da organização sindical
com o novo presidente do Incra,
Marcelo Resende de Sousa. Deu-se no dia 3 de fevereiro. O texto,
distribuído em rede interna de
computadores, tem formato semelhante ao de uma ata.
A CNASI indicou candidatos a
postos na sede do Incra, em Brasília, e nas 29 superintendências do
órgão. Na conversa com Resende
de Sousa, anota a ata, a direção da
confederação "fez a defesa das indicações", resultantes de "assembléias realizadas".
O presidente do Incra declarou-se favorável ao "aproveitamento
de quadros da instituição". Ponderou, porém, que há muitos outros nomes no páreo. Foram indicados "pelos movimentos sociais,
organizações representativas dos
trabalhadores rurais e representações políticas".
A fartura de apadrinhamentos,
esclareceu Resende de Sousa, remete "o processo de escolha para
outras instâncias de análise e decisão". Referia-se, embora não
mencionado na ata, ao gabinete
do ministro Miguel Rossetto, ligado à mesma corrente partidária
da senadora alagoana Heloísa Helena (a minoritária Democracia
Socialista), e à sala do chefe do
Gabinete Civil, José Dirceu (da
hegemônica Articulação).
Indicações
Tratados a pão e água sob FHC,
o sindicalismo agrário e movimentos como o MST supõem
que, sob Lula, alcançarão a redenção. A prodigalidade nas indicações retarda o preenchimento do
organograma da pasta do Desenvolvimento Agrário.
Até a semana passada, as superintendências estaduais do Incra
permaneciam em mãos de sobreviventes do governo passado. Na
sexta-feira, foram todos exonerados. Indício de que o loteamento
vai, finalmente, começar. Entre os
segmentos contemplados estarão
o PT, a Pastoral da Terra, da Igreja
Católica, o MST e a Contag.
Em carta circular aos seus filiados, datada de 28 de janeiro, a
confederação dos funcionários do
Incra resume a filosofia que inspira a tática de ocupação. O texto
anota que, mais do que cargos, é
preciso conquistar "espaços" na
máquina pública. Deve-se fazê-lo
"de forma inteligente".
O objetivo seria o de auxiliar a
gestão Lula no "Congresso Nacional e demais setores conservadores da sociedade", de onde virão
"grandes resistências" às "grandes mudanças". Ressalta-se a importância de "construir com o governo um Estado justo". "Uma
missão que transcende o nosso
papel de simples servidores, para
desaguar num processo de lutas
de classes [...]."
Na mesma circular, a confederação informa aos filiados sobre a
indicação de um de seus diretores, Raimundo João Amorim Pereira, para a Superintendência
Nacional de Gestão Administrativa do Incra. Indicação que resultou de "reflexões feitas pelas nossas bases e entidades dos trabalhadores rurais com as quais
mantemos relações de parceria, a
exemplo do MST [...]."
"Nos Estados, a disputa é muito
grande", diz Raimundão, como é
conhecido pelos companheiros.
"São partidos políticos, entidades
de trabalhadores, um balaio. É
um processo político. Não sei
qual será a decisão do presidente
do Incra. Ele está conduzindo a
questão com o ministro Rossetto." O processo atual sepulta uma
prática iniciada sob FHC, que
condicionava as nomeações para
as superintendências do Incra a
uma espécie de concurso de títulos. Selecionavam-se os nomes
supostamente mais qualificados,
pinçados de listas tríplices.
O passo seguinte às nomeações
feitas sob Lula será a abertura de
um debate sobre a revisão de atos
baixados no governo passado.
São, na linguagem dos movimentos sociais, dispositivos que "criminalizam os trabalhadores rurais". Entre eles a medida provisória que proibiu o Incra de vistoriar terras invadidas. O tema é explosivo.
Os documentos da CNASI exortam os servidores do Incra a não
deixarem "esvaecer suas esperanças creditadas ao governo Lula
[...]." "Vamos ajudar a construir o
governo que elegemos, fundado
nas nossas convicções."
Procurados pela reportagem, o
ministro do Desenvolvimento
Agrário e o presidente do Incra
preferiram guardar silêncio sobre
o processo de nomeações.
(JOSIAS DE SOUZA)
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