São Paulo, terça-feira, 16 de março de 2010

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JANIO DE FREITAS

De volta à passeata


Sem o know-how da criação das passeatas na ditadura, Cabral convoca protesto com os modos típicos dos políticos


O GOVERNO federal mexeu-se para que meios de comunicação do Rio não incentivem a participação no protesto público convocado para amanhã pelo governador Sérgio Cabral. E nem mesmo o apoiem em suas indignadas reações à aprovação, pela Câmara dos Deputados, do projeto que reduz a quase zero os "royalties" do Estado do Rio e do Espírito Santo sobre a exploração de petróleo, e os distribui desigualmente entre os demais Estados.
Já submetido, no final de semana, a forte dieta jornalística, ontem Sérgio Cabral pôde experimentar críticas de pessoas e de onde, até aqui, não recebera senão apoio, explícito ou não. Sabe, porém, tratar-se de afastamento apenas circunstancial, sem implicações no seu propósito de reeleger-se.
A insuficiência de comunicação prejudica os protestos planejados por Cabral, é claro. Mas, ao que se pode perceber, a tendência majoritária é a de sentimento de usurpação e traição praticadas pela maioria da Câmara contra o Rio, mesmo que não haja conhecimento nem sequer mínimo de como é feito o ataque à cidade e ao Estado.
O mau slogan da reação ao projeto aprovado na Câmara estimula aquele sentimento: "Contra a covardia, em defesa do Rio". Ainda que entender, aí, o sentido de covardia não seja simples: covardia dos que temem reagir? Covardia do governo Lula, mas qual? Ir daí à atitude de bancadas e partidos que se uniram na Câmara contra o Rio e o Espírito Santo, Estados produtores de petróleo, requer um empurrão informativo que a grande maioria não recebe.
Sem o know-how, ao que parece, da criação das velhas e eloquentes passeatas na ditadura, Sérgio Cabral vai em frente com os modos típicos dos políticos e seus comícios. Ponto facultativo a partir das 15h, para o comparecimento "espontâneo" de funcionários; liberação dos operários do PAC, mobilização de comunidades controladas por políticos, condução para o centro da cidade, e por aí.
A ação do governo federal sobrepôs-se à passeata feita na manhã de domingo em Ipanema, para a qual o noticiário preferiu negar seus acessos em geral tão fáceis, ainda mais quando se trata de Ipanema. O que é uma boa indicação de que Sérgio Cabral não pode falhar amanhã, porque, aí sim, seu projeto reeleitoral sofrerá os efeitos da passagem de defensor da cidade e do Estado para a de "incompetência" para tratar do problema, como dele disseram ontem os seus novos e transitórios críticos.

"Curtural"
O "direito de retaliação" que o Brasil recebeu da Organização Mundial de Comércio, contra os Estados Unidos e seus subsídios prejudiciais ao algodão brasileiro, resulta em retaliação ao consumidor daqui. É aplicado sob a forma de sobretaxação a produtos dos Estados Unidos importados pelo Brasil, no qual, é óbvio, passam a custar mais.
A lista desses produtos elaborada pelo governo Lula vale como um esclarecimento final da sua concepção de cultura: o governo quer sobretaxar também livros, quaisquer livros, e filmes, quaisquer filmes. Show é que é cultura, financiado pela Petrobras e pela Eletrobrás e complementado por dinheiro subtraído do Imposto de Renda.


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