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Anistia não protege torturador, diz Tarso
Ministro defende punição para responsáveis por tortura na ditadura; presidente do Clube Militar afirma que ele quer "tumultuar"
Tarso diz que lei é política e
tortura não é crime político;
para a OAB, "anistia não
envolveria crimes de sangue
cometidos pelo Estado"
DA SUCURSAL DO RIO
O ministro da Justiça, Tarso
Genro, defendeu ontem o julgamento e a punição dos responsáveis pelos crimes de tortura durante o regime militar
(1964-85). Em sua opinião, a
Lei da Anistia, de 1979, não protege os torturadores.
O ministro afirmou também
que o "sigilo eterno" de documentos secretos oficiais "não
serve ao Estado democrático de
Direito". A medida restritiva ao
acesso público à informação,
criada no governo tucano de
Fernando Henrique Cardoso,
em 2002, foi mantida pela administração petista de Luiz
Inácio Lula da Silva.
Ela permite que documentos, inclusive os do regime militar, permaneçam para sempre
inacessíveis aos cidadãos.
As declarações de Tarso se
opõem à posição das Forças Armadas e de muitos setores do
governo. Ano passado, o ministro da Defesa, Nelson Jobim,
disse que a Lei da Anistia trouxe "conciliação e pacificação".
O Ministério da Defesa informou que Jobim está em viagem
no exterior e que ninguém poderia falar pela pasta.
A interpretação política hegemônica, porém controversa,
sustenta que a anistia beneficiou os dois lados: funcionários
do regime e oposicionistas.
Passado apagado
O presidente do Clube Militar, general da reserva Gilberto
Figueiredo, respondeu a Tarso:
"Se for pensar assim, tem gente
que ocupa cargos de ministro
que fez a mesma coisa: torturou, só que pelo outro lado.
Roubou, assaltou banco".
Mais: "A Lei da Anistia foi para apagar esse passado. No Brasil, esses casos [de tortura] foram poucos e localizados. Acho
que Tarso Genro está querendo
tumultuar um pouco, como está tumultuando lá no problema
da [reserva indígena em Roraima] Raposa/Serra do Sol".
Tarso discursou no terreno
onde funcionou a sede da UNE
(União Nacional dos Estudantes) até 1964, na praia do Flamengo, zona sul do Rio.
"Torturadores e genocidas
desse país (...) nem sequer foram julgados pelos crimes que
cometeram nos porões da ditadura. (...) Teve pessoas de boa-fé defendendo o regime", disse.
"Elas dizem: "A anistia foi feita para todos, inclusive os torturadores". Eu respondo: se ela
foi feita para os torturadores,
eles têm que ser julgados, que
receber uma pena e depois receber anistia."
Em entrevista, Tarso afirmou: "Para tratar dessa questão [punição criminal], não
precisaria de mudança na lei. A
Lei da Anistia é uma lei política.
Ela incide sobre crimes políticos. A tortura não pode ser considerada um crime político".
"Se um agente público invade
uma residência na época da ditadura, cumprindo ordem ilegal do administrador autoritário de plantão, e prende pessoas, isso é um crime político
originário do Estado de fato vigente naquele momento."
"Se esse mesmo agente público prende essa pessoa e a leva para um porão e a tortura,
este crime de tortura não é um
crime político, porque nem a
legalidade da ditadura permitia
o crime de tortura. Portanto,
crimes como esse não poderiam estar abrigados [pela Lei
da Anistia]. Agora, isso tem que
ser uma interpretação do Poder Judiciário. Não é necessário modificar a lei para que esses crimes sejam punidos."
O ministro assinou ontem
portaria criando o Memorial da
Anistia Política no Brasil. Ele
disse ser ainda hoje "militante
socialista e revolucionário".
Criticou a cobertura jornalística sobre o trabalho da Comissão de Anistia, que já aprovou
reparações no montante -de
acordo com seu presidente- de
R$ 2,4 bilhões: "Em cima de determinados temas, [existe]
uma velada censura a respeito
do trânsito de opiniões".
Em dezembro, o ministro
dos Direitos Humanos, Paulo
Vanucchi, disse considerar imprescritível o crime de tortura.
Porém, não fez a defesa aberta
da punição como Tarso.
No evento de ontem, o presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Cezar Britto, disse que "a posição histórica da entidade é que a anistia
não abrangeria os crimes de
sangue cometidos pelo Estado". "Embora [a opinião] tenha
sido vencida em vários questionamentos judiciais", disse.
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