São Paulo, quarta-feira, 16 de junho de 2004

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ELIO GASPARI

Um governo paralisado pela fofoca

Palácio sem intrigas não é coisa deste mundo, mas Lula inovou: preside o primeiro governo da intriga, pela intriga, para a intriga.
Parece exagero, mas essa afirmação pode ser testada. Basta que qualquer interessado procure responder à seguinte pergunta -qual a política pública que aproxima (ou distancia) os seguintes personagens:
- José Dirceu, chefe do Gabinete Civil.
- Luiz Gushiken, chefe do aparelho de propaganda.
- José Genoino, presidente do PT.
- João Paulo Cunha, presidente da Câmara.
- Aloizio Mercadante, líder do governo no Senado.
Desde a posse de Lula, esses cinco mandarins já passaram por toda sorte de combinações, aliando-se ou tentando destruir-se. Nenhuma política pública os separa nem os une. Nem um poste da avenida Atlântica, uma escola no sertão cearense. Nada, é a intriga pela intriga. José Dirceu quer ficar mais forte? Para quê? Para ficar mais forte. O deputado João Paulo Cunha quer ficar mais dois anos na presidência da Câmara. Para quê? Para ficar mais dois anos na presidência da Câmara.
O chefe da Coordenação Política do governo, Aldo Rebelo, viu-se no meio de uma crise depois de articular a vitória da aprovação do salário mínimo na Câmara dos Deputados. Coisa assim: depois da derrota de Napoleão em Waterloo, uma facção do partido conservador inglês pediu que o duque de Wellington fosse mandado para a ilha de Santa Helena. Conhecem-se casos de cobrança do fracasso, esse foi o primeiro de cobrança do sucesso. Logo com Rebelo, um político tão cuidadoso e educado que dá a impressão de ser capaz de adormecer durante seus próprios discursos.
A opção preferencial do comando petista pela fofoca tem suas raízes nos conciliábulos da política sindical e/ou das agremiações estudantis, onde as brigas não têm custo. O sindicalista sempre pode responsabilizar os patrões pelos seus fracassos, e os estudantes podem acusar o imperialismo agonizante. No governo as coisas têm custo, e o de Lula está paralisado pela intrigalhada. A falta de recursos é pretexto, bode. Se alguém suprimir do noticiário dos jornais as notícias relacionadas com as intrigas (inclusive este artigo), sobra o quê? Aumento da gasolina, desemprego e palavrório.
O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e sua ekipekonômica apresentam-se como campeões de prestígio a juros de 16% e contração do Produto Interno Bruto com pífias promessas de crescimento insuficiente. O que o Brasil precisa é de juros de 10% e crescimento de 6%. Se o preço desses indicadores fosse um ministro da Fazenda desprestigiado, tudo bem. Afinal, o prestígio da ekipekonômica tucana rendeu-lhe bons empregos na banca, enquanto a choldra ficou com o desemprego.
Os patrocinadores da intrigalhada em que se transformou o governo de Lula deveriam ser mais humildes e refletir quão ridículos são os papéis que desempenham. Intrigava-se na corte de Napoleão quando ele era um prisioneiro em Santa Helena com a mesma voracidade com que se fofocava quando o imperador reinava nas Tulherias. Isso sucede, entre outras coisas, porque fazer intriga é um grande passatempo, melhor que palavras cruzadas.
Se para cada intriga em que os grão-petistas se metem eles forem capazes de enunciar uma política pública que os separa ou os aproxima, o governo de Lula mudará de cara. Para que isso aconteça, o companheiro precisa se lembrar dos versos de Vinicius de Moraes e Carlos Lyra:
"Vou pedir ao meu babalorixá
Pra fazer uma oração pra Xangô
Pra pôr pra trabalhar,
Gente que nunca trabalhou".


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