São Paulo, Sexta-feira, 16 de Julho de 1999
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GOVERNO
Visão de curto prazo prevaleceu, diz ministro do Desenvolvimento
Lafer atribui sua saída a tucanos e empresários

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
da Sucursal de Brasília

Celso Lafer atribui sua saída do Ministério do Desenvolvimento, sete meses após tê-lo assumido, a uma visão de curto prazo do empresariado, de que faz parte, e do PSDB, o seu partido político.
"O empresariado queria que eu resolvesse os problemas de curto prazo e capital de giro, sem perceber que eu trabalhava para lhes dar condições de investimento e o futuro", disse à Folha ontem, em seu gabinete, enquanto assessores empacotavam pertences.
Quanto ao PSDB, "alguns de seus políticos também estavam no curto prazo, sem perceberem que eu trabalhava como ministro do presidente, cujo objetivo não é a popularidade imediata, mas sim a retomada de sua credibilidade", afirmou Lafer.
Como é seu hábito, o ministro usou referências literárias para ilustrar argumentos. Desta vez, Machado de Assis serviu para reforçar sua teoria de que a principal fonte de seus problemas no cargo foi de caráter simbólico: "Até o merecimento merece um pouco de rufo e de cartazes".
Na opinião de Lafer, os dois grandes desafios que ele não venceu foram os da "sincronização dos tempos e dos públicos".
Ou seja: a conciliação das expectativas dos políticos, dos agentes produtivos e da opinião pública, que trabalham com "tempos" muito diversos entre si.
O tempo político é mais rápido do que o econômico, e o da opinião pública, em busca de resultados visíveis, ainda mais rápido.
Parte da sua incapacidade para vencer esses desafios, na avaliação de Lafer, é a complexidade do Ministério do Desenvolvimento. "Eu lidava com açúcar, álcool, café, regime automotivo, reestruturação produtiva, Mercosul, OMC, reforma tributária", disse.
Em comparação, o público identifica com muito mais facilidade o que fazem ministros de outras áreas, como saúde e educação. "Até agricultura tem um foco aglutinador, que são as safras."
Lafer admite que parte da responsabilidade pelo insucesso diante de expectativas diversas de públicos diversos é de sua própria personalidade. "Recebi críticas por ser tímido, intelectual, diplomata, não bater bumbo."
Por não ter recebido do empresariado "o apoio inequívoco de que necessitava" para se defender das críticas, Lafer, segundo sua avaliação, se enfraqueceu muito.
"Meus conterrâneos e meus correligionários se dedicavam à tarefa de procurar substitutos."
Do ponto de vista técnico e político, o ministro afirma sua convicção de que estava "no caminho certo" e diz esperar que seu sucessor dê sequência a ele.
"Procurei, com a convicção de que só o mercado resolve o problema, elaborar e implementar políticas públicas para lidar com as falhas do mercado sem incidir em falhas de governo", disse.
Sua lista de realizações inclui medidas para ampliar o acesso de micro, pequenas e médias empresas aos recursos do BNDES, reforço às linhas de crédito à exportação do BNDES, fortalecimento do programa de apoio à produção local de autopeças, lançamento do programa de apoio ao investimento em petróleo e gás, medidas para acelerar o desenvolvimento da Amazônia Ocidental, criação de linha de crédito para hotelaria.
Entre as iniciativas que não chegaram a decolar, a instalação de foros de competitividade para identificar os elos e os gargalos das diversas cadeias produtivas.
Lafer, 57, diz que vai descansar algum tempo, após um ano e meio sem férias, e depois reassumir seu posto de professor titular da Faculdade de Direito da USP.


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