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MASSACRE NO PARÁ
Presidente da Câmara solicitará ao Ministério da Justiça proteção para jornalista ameaçada de morte
Temer pedirá proteção para testemunha
MÁRIO MAGALHÃES
da Sucursal do Rio
O presidente
da Câmara, Michel Temer
(PMDB-SP), pedirá nesta semana ao Ministério
da Justiça proteção para que a
jornalista Marisa Romão possa depor como testemunha no julgamento do massacre de Eldorado
do Carajás (PA).
A interferência de Temer foi solicitada pelos deputados Luiz
Eduardo Greenhalgh (PT-SP) e
Paulo Rocha (PT-PA).
Em dezembro de 1997, Romão
foi embora de Marabá (PA), local
onde está prevista a realização do
julgamento, depois de registrar na
Polícia Civil ameaças de morte recebidas por telefone. Nos últimos
dias na cidade, teve proteção da
Polícia Federal.
Marisa Romão é uma das poucas
testemunhas do confronto entre
policiais militares e trabalhadores
rurais que não pertence a nenhuma das duas partes.
O incidente ocorreu em 17 de
abril de 1996, quando 19 sem-terra
foram mortos numa operação da
Polícia Militar para desobstruir a
rodovia PA-150, na altura de Eldorado do Carajás (PA), 754 km a sudoeste da capital, Belém.
A jornalista estava no local cobrindo manifestação do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra) para a TV Liberal, afiliada da TV Globo no Pará.
Em março de 98, pediu garantia
de vida à Secretaria Nacional dos
Direitos Humanos. De dezembro
de 97 a março deste ano, morou na
casa do governador do Distrito Federal, Cristovam Buarque (PT).
O julgamento não tem data marcada. O juiz responsável pelo caso,
Otávio Marcelino Maciel, vai esperar que o Superior Tribunal de Justiça se pronuncie sobre pedido do
Ministério Público para transferir
o julgamento de Marabá (a 100 km
de Eldorado) para Belém.
Serão julgados PMs (acusados de
homicídio duplamente qualificado) e sem-terra (lesões corporais).
"Eu não tenho posição nenhuma
a favor ou contra qualquer lado da
história", disse ela à Folha. "Como
jornalista, tenho a obrigação ética
de ser imparcial. Mantive a imparcialidade em todos os depoimentos." Ela comandava a equipe da
TV Liberal que gravou imagens do
massacre exibidas em todo o mundo. Seu testemunho, em tese, pode
ajudar e prejudicar tanto os PMs
como os sem-terra.
A jornalista conta que, antes do
início do tiroteio, ouviu um conselho do major José Maria Pereira de
Oliveira, que comandou o batalhão de Parauapebas (PA) -o coronel Mário Colares Pantoja, do
batalhão de Marabá, dirigiu a operação. "Oliveira me disse: "Só te
dou um conselho. Sai daqui que eu
não te dou garantia de vida"', teria
dito o oficial, segundo relato dela.
Oliveira negou ter feito essa afirmação. Se verdadeira, ela indicaria
que as mortes foram consequência
de um confronto planejado.
Por outro lado, a jornalista disse
que não viu nenhum sem-terra
morto antes de os manifestantes
partirem em direção a policiais, jogando paus e pedras.
Os PMs disseram ter atirado para
se defender. Os sem-terra dizem
que agrediram para buscar o corpo
do agricultor Amâncio dos Santos
Rodrigues, que teria sido atingido.
Ao abandonar Marabá, onde viveu 15 anos, a mineira Marisa Romão deixou o emprego de jornalista e uma casa de chá, da qual era
sócia. "A pessoa que fazia as ameaças falava em colegas de farda",
contou a testemunha.
Dias depois, a casa de chá foi assaltada por cinco homens. Logo viria a fechar. "A voz anônima ao telefone era masculina", conta a jornalista. "Dizia: "Se você denunciar,
você está ferrada. Eles acham que
você falou demais'."
Mesmo com proteção, Marisa
Romão não sabe se irá ao julgamento, seja em Belém ou Marabá.
"Já perdi muito, estou tentando
refazer a minha vida, fora do que
eu mais gosto de fazer, que é jornalismo." Com medo, parentes têm
pedido que ela não compareça ao
tribunal. Na cidade onde vive, Romão, temerosa, evita sair à noite.
"Estou há um ano exilada no
meu próprio país, tudo é muito difícil. Não há lei de proteção a testemunhas, nem orçamento para dar
a elas condições de vida."
A Folha, embora saiba, decide
não publicar em que lugar Romão
hoje mora e onde trabalha. Segundo o "Novo Manual da Redação",
"em regra, a Folha publica tudo o
que sabe. Mas pode decidir omitir
informação cuja divulgação coloque em risco a segurança pública,
de pessoa ou de empresa".
Em Marabá, o coronel Faustino
Neto, comandante do 4º Batalhão
da PM, disse que a corporação pode garantir a segurança do julgamento, inclusive das testemunhas.
Alegando medo de perseguição
de fazendeiros, militantes do MST
da região usam codinomes, como
"Miguel", agricultor que presenciou o massacre de Eldorado, vai
depor no julgamento, mas não disse seu nome verdadeiro à Folha.
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