São Paulo, quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

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"Invasão consentida" dribla despejo de sem-terra no PA

Justiça de Marabá tenta acordo entre invasores e proprietários antes de decidir

Medida prévia à concessão de reintegração de posse é para evitar conflitos; plano de direitos humanos prevê a adoção de regra semelhante


JOÃO CARLOS MAGALHÃES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELÉM

Enquanto ruralistas e governo federal discutem a legalidade do ponto do Plano Nacional de Direitos Humanos que prevê a negociação entre sem-terra e proprietários rurais antes do despejo de invasores, uma versão da ideia já é aplicada no sudeste do Pará, região de maior conflito agrário do país. É a "invasão consentida".
A medida proposta no criticado plano prevê que, por meio de lei, a mediação entre as partes sirva como "medida preliminar" à concessão de liminares. Não é muito diferente do é feito pela Vara Agrária de Marabá, maior cidade da região.
Uma vez ocorrida a invasão, a Justiça de Marabá tem chamado invasores e donos de áreas invadidas para tentar um acordo, antes de decidir sobre liminar de reintegração de posse.
Só em dezembro do ano passado, numa visita do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), a vara conseguiu 11 "acordos de paz" em fazendas onde estavam 1.760 famílias. Outras seis audiências estão marcadas.
Geralmente, os proprietários aceitam o não cumprimento ou o indeferimento de mandados em troca de um período de convivência pacífica ou da saída temporária dos sem-terra.
Durante essa "trégua", o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) faz vistorias para decidir se a fazenda deve ser desapropriada para a reforma agrária.
"Os acordos são eficazes, na maioria da vezes", disse Claudia Regina Favacho, juíza da Vara Agrária. "Como existe um compromisso dos dois lados, acaba esse jogo de gato e rato, em que a polícia tira os trabalhadores e logo depois eles voltam para o mesmo lugar."
A iniciativa se fortaleceu nos últimos seis meses. Para o advogado José Batista, da CPT (Comissão Pastoral da Terra), é uma resposta à ação da Agropecuária Santa Bárbara Xinguara, ligada ao banqueiro Daniel Dantas, na região. Em pouco mais de quatro anos, a empresa comprou 500 mil hectares de terra. Os sem-terra invadiram 10 das 45 fazendas do grupo.
Para a Santa Bárbara, o recrudescimento na região se deve à negativa do governo de Ana Júlia Carepa (PT) em expulsar os sem-terra de suas terras.
A Faepa (Federação da Agricultura e Pecuária do Pará) vê nos acordos um sintoma do "desespero" dos fazendeiros com invasões que podem durar anos. "É como você deixar o Marcola [integrante da organização criminosa PCC] entrar na sua casa e ter de negociar para que ele saia", disse Carlos Xavier, presidente da entidade.


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