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Para historiador, militância enfraqueceu os estudantes
Pesquisador da UFSCar tenta explicar declínio do movimento estudantil no país
Desconhecimento do que se passa nas universidades dura até hoje e é resultado do aparelhamento político das entidades, defende ele
MAURICIO PULS
DA REDAÇÃO
Em 1968, o Brasil tinha quase
300 mil alunos no ensino superior, mas o movimento estudantil promovia manifestações
do porte da passeata dos cem
mil, no Rio. Em 2008 o país tem
quase 5 milhões de universitários, mas os protestos de rua
praticamente desapareceram.
O que explica esse paradoxo?
Na opinião do historiador
Renato Cancian, da UFSCar
(Universidade Federal de São
Carlos), o movimento estudantil sofreu uma inflexão nos anos
70, quando passou a ser liderado por militantes das organizações de esquerda que priorizavam as reivindicações políticas
em detrimento das demandas
educacionais. Essa subordinação à agenda política conduziu
aos protestos de 1977 em defesa
das liberdades democráticas,
mas provocou um longo refluxo, que persiste até hoje, em razão do distanciamento da
maioria dos alunos.
Autor de um livro sobre a
"Comissão Justiça e Paz de São
Paulo" (2005), Cancian começou a delinear sua tese de doutorado quando, ao estudar a invasão da PUC de São Paulo em
1977, notou um corte entre líderes e massa: "As lideranças
do movimento estudantil tinham todas um vínculo político. Já quem apenas participava
como massa estudantil não tinha nenhum vínculo".
Essa subordinação da militância estudantil à militância
política teve conseqüências a
longo prazo, que persistem:
"Militar no movimento estudantil na condição de militante
político tem um peso grande. O
auge nos anos 70 foi dado por
reivindicações políticas: as liberdades democráticas. Isso foi
levado e conduzido por lideranças envolvidas politicamente.
Fala-se muito que as organizações de esquerda cooptaram as
lideranças. Não foi o que aconteceu: a biografia dos militantes estudantis indica que a militância política vem primeiro".
Nos anos 60, ao contrário, a
politização do movimento não
ocorreu desvinculada das reivindicações educacionais -em
especial das críticas da UNE à
reforma universitária prevista
no acordo entre o MEC e a
Usaid (United States Agency
for International Development). "O que a gente percebe é
uma dinâmica diferente. Na década de 60 o movimento começa com uma reivindicação educacional, que depois transborda para uma reforma universitária, que é uma grande questão
e que mobiliza todos os estudantes. Aí você tem a radicalização. Na década de 70 ocorre
totalmente diferente: o movimento já nasce com um eixo de
uma reivindicação política: as
liberdades democráticas".
Ocorre então uma subordinação completa da militância
estudantil à militância política:
"Na década de 60 isso não
acontecia. Já na década de 70,
as lideranças tachavam esse
pessoal que se preocupava com
questões educacionais de ignorantes políticos. O que acontece com o movimento estudantil
hoje? O aparelhamento dessas
organizações continuou. Aí o
movimento perde importância
relativa. Hoje as lideranças da
UNE não sabem lidar com
questões educacionais: estão
tão voltadas para a política que
esquecem delas".
"Essa partidarização continua até hoje. Só que isso tem
uma conseqüência: você deixa
o estudantado de lado e vai mobilizar de acordo com o interesse desses militantes políticos.
Eles nem sabem o que está
acontecendo com as universidades", explica Cancian.
Essa partidarização ainda
pesa muito: "Quais são as propostas do movimento estudantil hoje? Às lideranças, perguntei qual era o objetivo de militar
no movimento. A resposta de
todas: ampliar influência,
cooptar militantes e construir
um partido, uma organização
nacional. É certo que havia pessoas contrárias. Mas quem quisesse entrar precisava ter um
posicionamento político".
Cancian ressalta que, sem essa militância, o movimento não
teria alcançado a importância
que teve: "Na década de 70 isso
é claro: quem se envolvia eram
justamente os militantes".
Essa subordinação do movimento estudantil à política: a
mobilização nos anos 70 foi
muito inferior à dos anos 60:
"Em 1977, você tinha um milhão de estudantes, mas o movimento só conseguiu mobilizar, em maio, 50 mil. E depois nunca mais conseguiu mobilizar tantas pessoas".
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