|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
REGIME MILITAR
Acusado de tortura, policial civil diz que é confundido com homônimo; ex-presos políticos dizem reconhecê-lo
"Não sou o Ubirajara", diz delegado Calandra
LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL
Acusado de tortura por ex-presos políticos, o delegado de polícia civil Aparecido Laertes Calandra afirmou ontem que não é o
capitão Ubirajara, nome de guerra utilizado durante o período em
que comandou interrogatórios do
DOI-Codi paulista, uma das centrais de repressão do regime militar, no início dos anos 70.
"Não sou o capitão Ubirajara,
nem sou capitão, sou da Polícia
Civil e não tenho nada com essas
histórias", disse o delegado à reportagem da Folha, ontem, no
corredor do 15º andar do Dipol
(Departamento de Inteligência da
Polícia Civil) de São Paulo, onde
trabalha há dez anos.
Dizendo-se proibido de dar entrevistas, Calandra conversou
com a Folha por cerca de dez minutos e, no final, não autorizou a
publicação do diálogo. A reportagem respondeu que não havia feito nem iria fazer nenhum acordo.
"Não tenho nada de que me defender. O governador Geraldo
Alckmin, que é meu chefe máximo, já falou tudo. Afinal, posso ter
o mesmo nome, sou Calandra,
mas não é a mesma pessoa. É um
homônimo, não sou eu", afirmou
o delegado, que trabalha há 37
anos na polícia.
Uma foto de Calandra, no entanto, datada de 2001 e exibida pela TV Globo depois que a Folha noticiou o caso, na última segunda-feira, foi reconhecida por alguns ex-presos políticos, entre os
quais Maria Amélia de Almeida
Teles, testemunha das sessões de
tortura a que Carlos Nicolau Danielli, ex-dirigente do PC do B, foi
submetido durante três dias para
depois aparecer morto.
"Ele [Calandra] comandava as
sessões de tortura, comandava os
interrogatórios", afirmou Teles.
Ao ser questionado sobre o testemunho da ex-presa política, Calandra elevou o tom da voz: "Essa mulher é terrorista. Eu investiguei
essa mulher, e ela é terrorista. Você sabia que ela foi processada por
terrorismo? Sei que foi".
A "investigação", segundo o delegado, foi feita após a Folha publicar reportagem sobre o fato de ele, acusado de tortura, ocupar
um cargo estratégico na Polícia
Civil paulista e ter atribuição para
cuidar de escuta telefônica. "Antes eu não a conhecia [Maria
Amélia]. Fui investigar depois."
Herzog
O codinome capitão Ubirajara é
associado também ao episódio
que resultou na morte do jornalista Vladimir Herzog nas dependências do DOI. O IPM (Inquérito Policial Militar) que concluiu
que Herzog se havia enforcado na
grade da cela não ouviu Calandra,
apontado nos laudos como o autor do pedido de perícia.
"Não conheci Herzog, não tenho nada com essa história", afirmou o delegado.
Segundo o Movimento Tortura
Nunca Mais, o nome de Calandra
é associado ainda à morte de Hiroaki Torigoi, ex-dirigente da
Molipo (Movimento de Libertação Popular). Segundo versão da
época, ele teria morrido em um tiroteio com agentes de segurança.
Para se justificar de todas as
acusações, Calandra insiste em
dois argumentos: disse que, à
época dos fatos, trabalhava no interior e sempre exerceu funções
administrativas na polícia.
"Na época que eles mencionam,
eu estava no Derinter (Departamento de Polícia Judiciária do Interior), estava em Ribeirão Preto, no interior. E eu sempre atuei na
parte administrativa, na área de
inteligência policial", disse.
A sigla Derinter, citada pelo delegado, surgiu apenas em 1999.
No início dos anos 70, o que existia era o Derin (Departamento de
Polícia Judiciária do Interior).
Texto Anterior: Sobreviventes têm sequelas e querem ser indenizados Próximo Texto: Identidade de delegado só foi conhecida em 83 Índice
|