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CELSO PINTO
A lógica para não intervir no câmbio
A recente valorização do
real em relação ao dólar
criou ansiedade e sugestões qualificadas de intervenção do governo para manter a cotação mais
desvalorizada. Há quatro formas
de fazê-lo: o Tesouro comprar
mais dólares no mercado privado, reduzir a dívida pública indexada ao dólar, controlar a entrada de capitais de curto prazo e
cortar os juros.
Existem fortes indicações, contudo, de que o governo não vai fazer nada a curto prazo. Os juros
dependem de melhores sinais na
inflação. As outras três medidas
supõem que o governo estaria disposto a brigar por um nível de
câmbio real. Nem o Banco Central nem a Fazenda acham que isso é desejável ou viável.
A visão que se tem na Fazenda é
que a recente apreciação do real
está ligada a um ciclo de liquidez
estimulado por ganhos de arbitragem de curto prazo. A expectativa do governo é que, gradualmente, a qualidade da captação
melhore e aumentem os prazos.
Essa mudança, contudo, não é
esperada em semanas e, sim, em
meses. A aposta é que só quando
os primeiros resultados das votações das reformas estruturais
aparecerem, no segundo semestre, é que a percepção dos investidores externos mudará de forma
mais significativa. Antes disso,
não dá para falar em "enxurrada" de dólares.
Além disso, tanto o BC quanto a
Fazenda estão convencidos de
que o governo não consegue fixar
uma taxa de câmbio real (descontada a inflação), só uma taxa nominal e, mesmo assim, temporária. O diretor do BC Ilan Goldfajn
lembrou, numa palestra recente,
que manter o real supervalorizado, como se fez entre 94 e 98, acaba em crise cambial. Tentar mantê-lo subvalorizado acabaria em
inflação. Com um agravante: a
inflação acaba com o câmbio subvalorizado ainda mais rápido do
que a crise destrói o câmbio supervalorizado. Goldfajn deixou
claro outro ponto: mesmo com a
apreciação recente, o real continua, historicamente, muito subvalorizado.
Uma fonte da Fazenda vai mais
longe. Quando o BC tenta adivinhar o nível "correto" do câmbio,
pode cometer graves erros. Em
2001, o BC achou que a desvalorização do real era temporária e
vendeu muitos títulos indexados
ao câmbio como proteção ("hedge"). Errou na previsão: a tendência de desvalorização se acentuou
em 2002 e a dívida indexada ao
dólar subiu demais e gerou prejuízos fiscais.
Importa a visão de longo prazo.
A aposta, segundo a fonte, é que a
tendência, desde 1997, de queda
no fluxo de capitais para os países
emergentes não será revertida.
Portanto, o déficit externo em
conta corrente terá que ser mantido entre 1% e 1,5% do PIB, o máximo compatível com a expectativa de ingresso de capitais mais estáveis.
Para isso, é fundamental ter um
câmbio competitivo, mas, acima
de tudo, uma economia competitiva. É preciso criar "anticorpos
domésticos" contra choques externos, e isso se obtém pelo aumento da poupança, do investimento e da confiança externa.
Aumentar a capacidade de produção é uma forma de reduzir o
impacto de choques externos,
porque permite ao país ampliar a
produção exportável sem ter que
segurar a demanda interna.
Isso exige uma presença menor
do Estado na disputa pela poupança interna, reduzindo o déficit público via cortes de gastos
com menor impacto sobre investimentos produtivos, como os da
Previdência. O que abriria espaço
para um corte dos juros. A retomada da confiança e do crescimento permitiria melhorar a percepção externa de risco. Países
classificados pelas agências de risco como "nível de investimento"
têm uma volatilidade externa
muito menor. Caminhar nessa
direção, diz a fonte, é uma opção
muito melhor do que impor controles sobre capitais de curto prazo.
É um tipo de visão parecida
com a do coração da equipe econômica anterior. A conclusão,
contudo, não deve ser a de que em
nenhuma circunstância o governo mudará políticas que podem
ter impacto sobre o câmbio, como
reduzir a parcela da dívida pública indexada ao dólar. A conclusão correta talvez seja a de que
mudar, agora, seria precipitado.
Gasto com ciclo
Introduzir um superávit primário contracíclico a partir de 2005,
como quer o governo, tem duas
implicações orçamentárias relevantes. A idéia é, ao menos na
proposta original, que o governo
passe a fixar um nível de gastos e
deixe a receita flutuar conforme o
ciclo: se o PIB for maior, o excesso
será automaticamente poupado;
se for menor, o gasto superará a
receita e haverá um déficit primário maior. A outra implicação é
que não poderia haver tantas vinculações entre receita e gasto
obrigatório, pois inviabilizaria o
princípio.
E-mail: CelPinto@uol.com.br
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