São Paulo, domingo, 17 de abril de 2005

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CONTAS PÚBLICAS

Gastos obrigatórios, como os com social, foram os que mais subiram

Custo da máquina aumenta, mas não bate recorde de 2001

MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Os gastos com a manutenção da máquina pública -como material de consumo, serviços de consultoria, diárias e passagens, sem relação direta com benefícios à população- aumentaram 18% acima da inflação entre o primeiro e o segundo ano do governo Luiz Inácio Lula da Silva.
Ainda assim, não alcançaram os valores registrados em 2001, penúltimo ano da gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Na compra de material de consumo, por exemplo, foram gastos em 2004 R$ 5,2 bilhões do dinheiro dos impostos, contra R$ 5,7 bilhões registrados em 2001 com esse tipo de despesa, em valores corrigidos pelo IGP-M. Em passagens e diárias, foram gastos R$ 996 milhões em 2004, contra R$ 1,177 bilhão em 2001.
Os números aparecem em estudo da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara, que corrigiu as principais despesas do governo nos últimos quatro anos pela inflação e comparou-as também como proporção do PIB (Produto Interno Bruto). O estudo pretendeu investigar detalhes da suposta "gastança" promovida pelo governo Lula.
O debate é bem mais complexo do que parece, indica o estudo: o único dos grandes grupos de despesas públicas que cresceu em termos reais nos últimos quatro anos -as despesas correntes- inclui gastos obrigatórios com saúde e educação, além de benefícios previdenciários, assistenciais e de transferência de renda.
As despesas correntes alcançarão o equivalente a 17,1% do PIB em 2005 e, por isso, são alvo de redução de gastos estabelecida no projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias divulgado sexta-feira.
Entre as despesas não impostas por lei ou pela Constituição desse mesmo grupo, caíram aquelas de caráter administrativo, como as diárias e passagens. Cresceram as despesas consideradas operacionais, voltadas a benefícios diretos para a população, ainda de acordo com primeira tentativa de qualificar o aumento dos gastos de custeio do governo. Isso pode complicar as chances de cortes.
Com o estudo da Consultoria de Orçamento em mãos, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, fez duas observações:
1) sobre o aumento dos gastos com diárias, passagens, material de consumo e serviços de consultoria entre 2003 e 2004, o ministro nega que seja uma tendência a ser repetida em 2005. "O crescimento real dessas despesas tem de ser igual a zero", afirmou Bernardo, antecipando o aperto nas despesas correntes para o último ano de mandato de Lula, tornado público na sexta-feira;
2) com a ressalva de que não será uma discussão "simples", o ministro disse que o governo não está fechado ao debate de propostas como a desvinculação do piso das aposentadorias e pensões da Previdência do valor do salário mínimo ou mesmo a redução do valor dos benefícios a idosos e deficientes físicos. São despesas que pesam nas contas públicas. "Do ponto de vista político, não há clima nenhum para a discussão, tampouco há um ponto de vista fechado pelo governo, mas temos de discutir", adiantou.

Menos investimento
Corrigidas pela inflação ou comparadas como proporção do PIB, as despesas dos demais grupos -pessoal, juros e investimentos- caem entre 2001 e 2004, período considerado na análise da Comissão de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara.
Indicador mais visível do desempenho do governo e principal alvo dos cortes nos últimos anos, os investimentos despencaram. No período pesquisado, eles caíram a menos da metade, de R$ 22,3 bilhões, em 2001, para R$ 10,8 bilhões, em 2004. O pior momento para os investimentos ocorreu no ano da posse de Lula.
No que diz respeito aos gastos com pessoal -cuja expansão também é alvo de críticas ao governo Lula-, o estudo mostra que não houve aumento real nos pagamentos da folha de salários e aposentadorias da União. Em proporção do PIB, essas despesas teriam caído no início do governo Lula e se estabilizado depois.
E não há expectativa de aumento dos gastos de pessoal em proporção do PIB para este ano, apesar do impacto de aumentos salariais concedidos a algumas categorias do funcionalismo público e da realização de concursos para a contratação de mais servidores, ainda segundo estudo da Consultoria de Orçamento.
"Houve um esforço grande para recompor os salários de algumas carreiras do funcionalismo e elevar as contratações, mas consideramos que está sob controle", avaliou Paulo Bernardo.
De acordo com nota técnica da liderança do PSDB, "não existe um efetivo controle das despesas com pessoal e encargos sociais, conseqüência de uma política sem critérios, de aumentos diferenciados por categorias de profissionais".
O mesmo estudo, feito sem a correção das despesas pela inflação, diz que "o aumento das despesas administrativas evidencia que a gastança tem aumentado e imperado na administração pública, reflexo do inchaço da máquina da administração federal".
Confrontados com os resultados do estudo da Consultoria de Orçamento, os tucanos sugeriram que o custo das passagens aéreas caiu nos últimos anos e que parte das despesas com passagens e diárias, sob Lula, não apareceria claramente no Siafi (sistema de acompanhamento de gastos federais) em decorrência do uso crescente de cartões de crédito.
A crítica ao aumento das despesas públicas não é feita só pela oposição, mas também por um dos comandantes da política econômica, o secretário do Tesouro, Joaquim Levy.

Material de consumo
Nas contas do governo, a compra de material de consumo comprometeu, no primeiro trimestre do ano, mais dinheiro arrecadado com impostos do que os investimentos federais. Do início do ano até 1º de abril, foram gastos R$ 300 milhões em material de consumo contra R$ 70,9 milhões em investimentos autorizados para o ano e pagos no mesmo período.
O Ministério da Saúde responde por mais da metade dos gastos com material de consumo do Executivo. Motivo: a compra de medicamentos é o que mais pesa nesse tipo de despesa. Em 2004, dos R$ 5,1 bilhões gastos com material de consumo, R$ 1,1 bilhão foi para a compra de remédios.


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