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Guerra entre funcionários agravou a crise
Além da disputa entre servidores pelo controle da burocracia do Congresso, eleição de 2010 também amplificou as denúncias
Conflitos entre PMDB, PT e PSDB também coincidiram com as investigações do Ministério Público sobre a farra aérea dos políticos
FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A atual onda de escândalos
no Congresso não é novidade
no Legislativo. Desde o retorno
do país à democracia representativa formal, em 1985, senadores e deputados já passaram
por duas crises semelhantes.
Em 1993, o escândalo dos
anões do Orçamento deixou
um saldo de oito cassados e
quatro renúncias para escapar
da punição. Em 2005, no mensalão, só três deputados perderam o mandato -José Dirceu
(PT-SP), Roberto Jefferson
(PTB-RJ) e Pedro Corrêa (PP-PE)- e quatro renunciaram.
Os desvios atuais no Congresso guardam semelhança
com os episódios dos anões do
Orçamento e do mensalão:
muitos deputados e senadores
estão envolvidos. A rigor, pela
letra fria da Constituição e dos
regimentos das duas Casas, um
grande número de congressistas teria de perder o mandato.
Mas não há exemplo na história de cassação generalizada,
pois os próprios congressistas
são os responsáveis pelas votações nas quais alguém perde o
mandato. No lote recente de escândalos, os políticos estão demarcando território e tentando
encontrar saídas para salvar o
máximo possível de cabeças.
O presidente do Senado, José
Sarney (PMDB-AP), disse nesta semana suspeitar de sabotagem dentro do Congresso para
que tantos casos apareçam. É
uma referência a um elemento
não existente em crises passadas: a influência dos funcionários de alto escalão, hoje em
guerra pelo domínio da burocracia interna do Legislativo.
Os orçamentos da Câmara e
do Senado somados são de R$
6,3 bilhões -valor maior que a
receita de oito Estados brasileiros. Os diretores das duas Casas
ordenam mais pagamentos que
vários governadores estaduais.
Como no Senado houve troca
de diretor-geral, com a saída de
Agaciel Maia, grupos interessados em manter seu poder de influência passaram a agir: funcionários de alto escalão foram
fontes para dezenas de reportagens dos últimos quatro meses.
O fato de a mudança na alta burocracia ter ocorrido só no Senado explica a menor temperatura dos escândalos na Câmara.
Origens da crise
É possível identificar a origem da crise em fatores sistêmicos, alguns históricos, e outros sazonais. São eles:
1) eleição de 2010: no Senado,
54 dos 81 senadores terão de
disputar a reeleição ou partir
para novos projetos. No PMDB,
16 dos 19 estão em fim de mandato; no PSDB, 8 dos 13. Fica fácil entender porque alguns senadores têm se esforçado tanto
para marcar posição, como o líder tucano, Arthur Virgílio
(AM). Em 2006 ele foi candidato a governador do Amazonas e
só teve 5,5% dos votos. No ano
que vem, terá fortes adversários para renovar seu mandato;
2) excesso de partidos: dos 27
partidos brasileiros, 19 estão
representados na Câmara e 12
no Senado. A variedade de siglas impede a construção de
maiorias sólidas no Congresso.
As negociações no varejo produzem interesses contrariados,
um foco latente de crises;
3) farra aérea: uma coincidência funesta para os congressistas. O Ministério Público estava há algum tempo investigando o uso de passagens aéreas por congressistas. Os dados surgiram neste ano;
4) presidências do Congresso: a cada dois anos são eleitos
os presidentes da Câmara e do
Senado. Um problema fixo no
calendário foi potencializado
neste ano pela disputa entre as
alas do PMDB da Câmara e do
Senado, antagônicas. A eleição
de Sarney foi uma derrota também para o PT e para o PSDB,
que se uniram contra ele;
5) burocracia ineficiente:
controladores de grandes orçamentos, os diretores da Câmara e do Senado são despachantes de luxo dos congressistas.
Não há gerenciamento transparente: a busca pela eficiência
é trocada pela camaradagem.
Atos secretos são tolerados, horas extras são pagas nas férias e
outros desvios são cometidos.
Os servidores de alto escalão
têm o poder de influir nas licitações. No Senado, Agaciel
Maia ficou 14 anos no cargo.
Criou vários relacionamentos.
Tudo se perdeu com sua demissão. Foi um dos pivôs da crise,
que depois criou vida própria.
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