São Paulo, quarta-feira, 17 de agosto de 2005

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Offshore lavou dinheiro do tráfico

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

As duas uruguaias que controlam a Guaranhuns Empreendimentos, empresa que recebeu R$ 6 milhões do publicitário Marcos Valério de Souza que teriam sido repassados ao PL, são acusadas pelo DEA (departamento de combate ao narcotráfico dos EUA) e pela Justiça argentina de ter lavado dinheiro para o principal cartel de traficantes do México, o Cartel de Juárez.
A empresa que detém 99% do capital da Guaranhuns, a Esfort Trading S/A, foi criada em 2001 no Uruguai por Marta Otero Bergonzoni Dovat e Judith Viera Garola, segundo documentos obtidos pela Folha.
O empresário José Carlos Batista, que detém 1% das cotas da Guaranhuns, diz que não sabia do passado das uruguaias. Segundo ele, a Guaranhuns passou a ter uma offshore no Uruguai para pagar menos impostos.
As duas uruguaias tem um currículo comprometedor. Elas já apareceram como diretoras de quatro empresas, de acordo com a Justiça argentina, usadas para lavar pelo menos US$ 13 milhões (cerca de R$ 30,3 milhões) do traficante mexicano Amado Carrillo Fuentes, morto em 1997.
As empresas dirigidas pela dupla, entre as quais a Tamilur S/A, Idafal S/A, Sasur S/A e Financiera Estarey, compraram fazendas e casas de praia no Chile, na Argentina e no Uruguai. A cidade de Mar del Prata era um dos locais preferidos do traficante.
O Brasil seria um dos alvos seguintes de Carrilo Fuentes, mas a polícia argentina desbaratou a lavagem de dinheiro em 2000.

O senhor dos céus
Carrillo Fuentes era o principal dirigente do Cartel de Juárez, que tinha como base essa cidade na fronteira entre o México e os EUA. Nas contas de uma comissão do Senado dos Estados Unidos de 2001, esse cartel juntou US$ 2 bilhões (R$ 4,6 bilhões) entre os anos 80 e 90.
Em julho de 1997, foi anunciada a morte de Carrillo Fuentes. O traficante teria morrido no México enquanto se recuperava de uma cirurgia plástica. Há dúvidas, porém, se a informação era verdadeira ou cortina de fumaça para o mexicano escapar das autoridades dos EUA. Carrillo Fuentes era conhecido como "lord of the skies" (senhor dos céus) porque usava aviões de pequeno porte para enviar cocaína para os EUA.
A lavagem dos dólares do Cartel de Juárez começou a ser desvendada em 2000, quando um contador do traficante delatou o esquema que havia sido montado no Chile, Uruguai e na Argentina.
Em maio de 2000, a polícia argentina prendeu Nicolás di Tullio, empresário do ramo imobiliário que fazia os negócios para o cartel. Documentos encontrados pelo DEA no México mostraram que o traficante havia colocado dinheiro na campanha presidencial do peronista Eduardo Duhalde em 1999 -o que foi negado pelo então candidato.

Lavanderia
Marta Otero e Judith fazem parte de uma instituição uruguaia -as pessoas que emprestam seus nomes para negócios nem sempre lícitos. O Uruguai permite que as empresas escondam seus verdadeiros donos desde 1955. Escritórios de advocacia criam as chamadas empresas de prateleira -se algum doleiro, traficante ou político precisar fazer remessas para fora de seu país sem registrar o envio no Banco Central pode comprar uma dessas empresas.
Três advogados especialistas em lavagem de dinheiro ouvidos pela Folha acreditam que a Esfort tenha sido usada por doleiros não muito cuidadosos -nem se deram ao trabalho de verificar se as titulares da empresa tinham algo comprometedor no passado.
Técnicos do Senado que trabalham na CPI dos Correios descobriram outras operações da Esfort que não têm relação com o suposto repasse de R$ 6 milhões ao PL.
São depósitos de US$ 1,1 milhão (R$ 2,56 milhões) feitos pela Esfort nos anos de 2002 e 2003 na agência do Banrisul (Banco do Rio Grande do Sul) que funciona nas Ilhas Cayman, um dos paraísos fiscais no Caribe.
O banco informou por meio de nota que nunca fez remessas da Esfort do Brasil para as Ilhas Cayman e que segue a legislação dos países onde opera.
A Folha fez uma pergunta simples à assessoria de imprensa do Banrisul: a remessa para a conta da Esfort no Banrisul de Cayman não pode ter partido de Nova York? A assessoria informou que tudo que tinha para dizer sobre a Esfort estava na nota divulgada.


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