São Paulo, quinta-feira, 18 de março de 2010

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Licitação do PAC no RJ tem sinal de acerto entre rivais

Três empresas usaram o mesmo documento em concorrência para obra de R$ 493 mi

Complexo do Alemão ficou com a Odebrecht, Andrade Gutierrez ganhou a disputa em Manguinhos e a Queiroz Galvão venceu na Rocinha


ITALO NOGUEIRA
DA SUCURSAL DO RIO

Documento feito a pedido da construtora Norberto Odebrecht para habilitar-se à licitação do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) nas favelas do Complexo do Alemão, no Rio, também foi usado por suas concorrentes para participar da mesma disputa.
A Odebrecht, líder do Consórcio Rio Melhor, venceu a disputa da obra, avaliada em R$ 493 milhões. Os consórcios liderados por Andrade Gutierrez e Queiroz Galvão ganharam, respectivamente, as concorrências para as obras do PAC em Manguinhos (avaliada em R$ 232 milhões) e na Rocinha (R$ 175,6 milhões), objeto da mesma licitação.
A Folha revelou nesta semana que cruzamento de documentos apreendidos em várias operações da Polícia Federal mostram que empreiteiras formam consórcios "paralelos" antes da disputa de licitações com a finalidade de superfaturar obras públicas.
Duas construtoras (Odebrecht e Andrade Gutierrez) líderes de consórcios concorrentes negaram a troca de documentos entre elas. A Secretaria de Obras do Rio e a Queiroz Galvão não quiseram se pronunciar sobre o caso.
A licitação ocorreu em 2008. O edital exigia que os consórcios apresentassem termo de compromisso de fornecimento de material com uma empresa com experiência na instalação de teleféricos urbanos. Todos apresentaram a companhia francesa Pomagalski, que executou obra semelhante em Medellín, na Colômbia.
A documentação que comprovava a experiência da empresa no serviço estava em inglês, o que exige a tradução juramentada. Este último documento revelou o compartilhamento entre os concorrentes.
A Folha apurou que a tradução juramentada do documento da empresa do Metrô de Medelín foi pedida à empresa BTS Traduções por uma funcionária da Odebrecht.
A tradução I-67411/07 (número que serve como "identidade" de traduções juramentadas), assinada pelo tradutor Manoel Antônio Schimidt, aparece na habilitação dos três consórcios concorrentes.
O reconhecimento de firma de Schimidt foi feito no mesmo dia (7 de janeiro de 2008) e os selos das três cópias do documento têm números sequenciais, o que indica que foram enviadas juntas ao cliente da BTS, a Odebrecht.
Há outra tradução juramentada, assinada por Mariana Erika Heynemann, que aparece da mesma forma: sob o mesmo número na papelada dos três consórcios concorrentes.
A licitação das obras do PAC no Complexo do Alemão ocorreu juntamente com as das obras em Manguinhos e na Rocinha, mas uma empresa não poderia acumular, ao mesmo tempo, duas obras.
Apenas três consórcios foram habilitados. A Construcap, que foi desclassificada, acusou em 2008, por meio de recurso à Secretaria de Obras do Rio, existência de direcionamento na licitação do PAC.
Segundo a Construcap, o edital fazia exigências desnecessárias, o que limitava o número de participantes na concorrência. Um dos itens pedia comprovação de experiência em "fornecimento e assentamento de tubo flexível estruturado de PVC para drenagem de águas pluviais, com diâmetro mínimo de 400 milímetros".

Complexidade
A Secretaria de Obras afirmou à época que a complexidade das obras em favelas aumentava a exigência na disputa.
A diferença nos preços propostos pelos consórcios não superou 0,23%. Os preços de obras de urbanização nas favelas ficaram 4,8% mais caros (R$ 41 milhões acima do previsto).
A Secretaria de Obras autorizou propostas de até 5% acima do preço definido no edital -que tinha sido publicado dias antes. Mais uma vez, a secretaria fundamentou sua decisão tomando por base a complexidade das obras.


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