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PRIVATIZAÇÃO
Banco recebeu fiança de R$ 1,9 bi para disputar leilão das empresas de telefonia, realizado no ano passado
BB ajudou Opportunity sem pedir garantias
ELVIRA LOBATO
FERNANDA DA ESCÓSSIA
da Sucursal do Rio
Documentos obtidos pela Folha
mostram que o Banco do Brasil assumiu posição de alto risco no ano
passado, ao dar fiança de R$ 1,9 bilhão aos consórcios liderados pelo
banco Opportunity que disputaram o leilão da Telebrás sem exigir
contragarantias dos acionistas.
As fianças foram autorizadas pela diretoria na antevéspera do leilão (27 de julho) em favor dos consórcios Solpart, Telpart e Longdis,
liderados pelo Opportunity.
No mesmo dia, a diretoria do
banco deu fiança de R$ 450 milhões à Macal Investimentos, do
consórcio Telemar (adversário do
Opportunity), e exigiu contragarantia em ações e promissórias.
A concessão das fianças aos consórcios montados pelo Opportunity está sendo investigada pelo
Ministério Público Federal, no Rio,
no inquérito aberto para apurar
suspeita de improbidade administrativa no leilão da Telebrás -o
maior negócio do programa de
privatização do governo brasileiro, que amealhou R$ 22 bilhões.
Objetivo
As fianças tinham por objetivo
garantir o pagamento da parcela
inicial de 40% do preço das teles
que os consórcios viessem a adquirir no leilão.
Os consórcios honraram seus
compromissos, sem necessidade
de execução da fiança, mas o Ministério Público Federal está questionando o banco sobre a dispensa
das contragarantias.
Dois superintendentes e quatro
gerentes do BB, todos integrantes
do comitê de crédito no Rio, já
prestaram depoimento. A direção
também já fez sua defesa por escrito aos procuradores.
Os documentos fecham o quebra-cabeças em torno do envolvimento do Banco do Brasil, do Ministério das Comunicações e do
BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) na privatização das teles.
No final do ano passado, as suspeitas de favorecimento ao grupo
Opportunity causaram as demissões de cinco executivos do governo, entre eles o então ministro das
Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros, o presidente do
BNDES, André Lara Rezende, e o
diretor do Banco do Brasil Ricardo
Sérgio de Oliveira.
O grampo
Os documentos obtidos agora
pela Folha esclarecem o diálogo
gravado por grampo telefônico entre Mendonça de Barros e Ricardo
Sérgio de Oliveira.
Na antevéspera do leilão, pouco
depois da reunião que aprovou as
fianças, Barros telefonou para o diretor do Banco do Brasil para informá-lo de que o Opportunity iria
disputar a compra da Tele Norte
Leste (empresa de telefonia fixa
que vai do Rio de Janeiro ao Amazonas) e precisava de fiança.
"Está tudo acertado", diz o ministro, no telefonema grampeado.
"Mas o Opportunity está com um
probleminha de fiança. Não dá para o Banco do Brasil dar?"
"Acabei de dar", respondeu Ricardo Sérgio.
"Não é para a Embratel, é para a
Telemar", disse o ministro. Aqui,
Mendonça de Barros se atrapalhou: ele se referia, na verdade, à
necessidade de fiança para os consórcios que disputavam a Embratel e a Tele Norte Leste.
Ricardo Sérgio continuou, sem
corrigir o ministro: "Dei para a
Embratel e R$ 874 milhões para a
Telemar (...). Nós estamos no limite da nossa irresponsabilidade.
(...)". Na verdade, a fiança de R$
874 milhões foi para a Solpart, do
Opportunity.
"É isso aí, estamos juntos", disse
então Barros.
"Na hora que der m...", declarou
o diretor, referindo-se ao alto valor
da fiança.
"Estamos juntos desde o início",
encerrou o ministro.
A operação
Os contratos assinados com os
consórcios do Opportunity mostram que o Banco do Brasil concedeu as cartas de fiança aceitando
em troca, na inexistência de contragarantias, somente o aval de
empresas que, na ocasião, existiam
apenas no papel.
A Solpart Participações, que obteve fiança de R$ 874,2 milhões,
havia sido registrada sete dias antes na Junta Comercial do Rio. Sua
fiadora perante o Banco do Brasil
era uma outra empresa recém-criada pelo Opportunity: a Techold Participações.
Ambas são chamadas, no jargão
dos advogados, de empresas de
propósito específico: são registradas para um determinado objetivo
(no caso, a disputa do leilão da Telebrás) e morrem se ele não for alcançado.
A Solpart foi criada para disputar
os leilões da Telesp fixa e da Tele
Norte Leste, mas acabou comprando, por R$ 2,07 bilhões, a Tele
Centro Sul, que cobre o Paraná,
Santa Catarina e a região Centro-Oeste.
A Techold foi criada para acomodar as participações de fundos
de investimento e de fundos de
pensão de estatais -Previ (Banco
do Brasil), Telos (Embratel), Sistel
(Telebrás) e Funcef (Caixa Econômica Federal)- que integravam o
consórcio.
Os fundos de pensão são legalmente impedidos de dar contragarantias, fianças e avais em empréstimos, para não colocarem em risco o patrimônio das fundações.
Engenharia
A mesma engenharia foi usada
na concessão dos avais aos consórcios Telpart e Longdis. A Telpart
-que comprou a Telemig Celular
e a Tele Norte Celular- obteve
fiança de R$ 271,83 milhões e apresentou como avalista outra empresa criada para o leilão: Opportunity Mem.
A Longdis -que disputou e perdeu o leilão da Embratel- obteve
fiança do BB de R$ 720,9 milhões,
apresentando como avalista uma
empresa chamada Selectpart.
A Fiago Participações e a Companhia de Seguros Aliança do Brasil, que faziam parte do consórcio
Telemar, receberam, cada uma,
fiança de R$ 450 milhões.
O Ministério Público não questionou esses dois casos, por entender que as empresas estavam dispensadas da contragarantia.
A primeira, por pertencer, à época, à Funcef, e a segunda, por ser
coligada do próprio Banco do Brasil, que tem 40% de seu capital.
Os procuradores responsáveis
pelo inquérito no Ministério Público Federal não quiseram falar
sobre a documentação obtida pela
Folha sobre o caso.
O inquérito civil público que
apura o caso está em fase final de
apuração.
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