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São Paulo, domingo, 18 de maio de 2003

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AMAZÔNIA

Casal de policiais federais atua na fronteira com a Colômbia para investigar suposto recrutamento de índios pelas Farc

PF apura sumiço de jovens índios na fronteira

KÁTIA BRASIL
DA AGÊNCIA FOLHA, EM MELO FRANCO (AM)

Um casal de policiais federais que atua na fronteira com a Colômbia, na tensa região denominada de Cabeça do Cachorro, no Amazonas, investiga o desaparecimento de índios tucanos brasileiros, com idades de 11 a 19 anos.
Os índios sumiram de três aldeias fronteiriças -Melo Franco, Santa Cruz e São Miguel.
A PF trabalha com a hipótese de que esses índios tenham sido recrutados pelas Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) -no Brasil ou na Colômbia- para atuar do outro lado da fronteira. Outra possibilidade é que eles tenham fugido justamente para não ser recrutados.
Segundo indígenas ouvidos pela Agência Folha, garotos dessa faixa etária e da mesma etnia, mas nascidos nas aldeias colombianas de Los Angeles e Acaricuara, a apenas 25 km do Brasil, estão sendo recrutados pelas Farc por um salário de 600 mil pesos colombianos (cerca de R$ 600).
A investigação sobre os sumiços no lado brasileiro começou há um mês, quando o mineiro Geraldo de Castro Neto, 31, e a paulista Estela Cristina Assumpção, 26, chegaram a Melo Franco para trabalhar no recém-criado posto da PF em Melo Franco, localidade pertencente à cidade de São Gabriel da Cachoeira (AM).
Formados em engenharia, Castro Neto e Estela se conheceram há três anos na academia da PF, em Brasília. Lotados no Amazonas, participaram, separadamente, de investigações sobre o tráfico de mulheres e narcotráfico.
Foram mandados agora para Melo Franco, onde o Brasil é dividido da Colômbia apenas por marcos de 1,5 m feitos em concreto por uma comissão de demarcação em 1975. O posto foi aberto pela operação Cobra (junção das sílabas iniciais de Colômbia e Brasil) da PF para proteger os índios, combater o narcotráfico e evitar a entrada das Farc no Brasil.
Nas aldeias, os policiais colhem depoimentos, fotografam os índios um a um e tentam montar uma árvore genealógica para saber quantos jovens sumiram.
Dos registros iniciais, eles sabem que, em Melo Franco, vivem 22 tucanos, e o adulto mais jovem tem 35 anos. Em Santa Cruz, a 10 km de Melo Franco, estão 62 índios, sendo 35 crianças na faixa de 6 meses a 10 anos de idade. O restante são adultos, sendo o mais jovem de 23 anos. Os dados de São Miguel não foram concluídos, mas há ausência de jovens.
Uma dificuldade na investigação é que os índios negam a existência do problema.
O capitão (como são chamados os caciques nessa região) de Melo Franco, Cassimiro Fernandes, 48, diz que os jovens índios foram estudar em outras localidades, mas não identifica os nomes deles.
"Os jovens estão estudando em Santa Cruz, estamos sozinhos [sem jovens]", afirmou à Agência Folha, que esteve na região.
Em Santa Cruz, por onde a reportagem passou, não havia jovens estudantes tucanos.
"Só depois da investigação vamos acreditar que os jovens índios estão estudando ou se foram levados pela guerrilha. Portanto, eu torço para que seja verdade [que os índios estão estudando] e que a gente [PF] tenha chegado antes das Farc", afirmou Castro Neto, que chefia o posto de fiscalização da PF em Melo Franco.
Já Estela acredita que os índios trabalham para as Farc, pela falta de opções na região. "Eu acho que existe o recrutamento e eles [os tucanos] fazem uma tentativa de [nos] enganar."
Mas o capitão Fernandes demonstra temor pelas Farc. "Os guerrilheiros nunca apareceram aqui, só em Acaricuara [na Colômbia]. Eles sempre vão lá, e ficamos com medo. Os aviões [de guerrilheiros ou narcotraficantes] passam muito aqui [na aldeia de Melo Franco], e as mulheres têm muito medo dos aviões", disse.
No último dia 28, um dia antes de o ministro Márcio Thomaz Bastos (Justiça) tentar ir a Melo Franco inaugurar oficialmente o posto, uma aeronave não identificada fez sobrevôos rasantes em cima da aldeia de tucanos.


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