São Paulo, quinta-feira, 18 de maio de 2006

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MÁFIA DOS SANGUESSUGAS

Na Câmara, Maria da Penha afirma que quase metade do Congresso se relacionava com a Planam

Agora, assessora acusa 283 parlamentares

RANIER BRAGON
ADRIANO CEOLIN
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A ex-servidora do Ministério da Saúde Maria da Penha Lino disse ontem, em depoimento à Corregedoria da Câmara dos Deputados, que 283 parlamentares -ou 47% do total do Congresso- possuíam algum tipo de relacionamento com a Planam, empresa acusada de organizar o esquema de venda de ambulâncias superfaturadas a prefeituras.
Segundo relato de presentes ao depoimento, tomado a portas fechadas, Maria da Penha, presa na Operação Sanguessuga, da Polícia Federal, afirmou que todos os parlamentares (a maioria deputados) que se relacionavam com a empresa participavam de algum tipo de "acerto" -mas a ex-servidora não especificou os valores nem as formas de pagamento de propinas, além de ressalvar que não sabe quais recebiam dinheiro da empresa.
"Ela disse que todas as emendas liberadas para unidades móveis de saúde eram negociadas com parlamentares (...) e que o parlamentar contatado pela empresa só liberava a emenda mediante negociação", afirmou na saída o advogado de Maria da Penha, Eduardo Mahon, que ressaltou ser "irresponsabilidade" dizer que todos os deputados participariam de negociações "espúrias".
Segundo a investigação da PF, o esquema dos "sanguessugas" consistia no desvio de verbas do Orçamento da União para que prefeituras adquirissem ambulâncias superfaturadas da Planam. As verbas eram reservadas no Orçamento por meio de emendas de congressistas. O esquema teria movimentado R$ 110 milhões desde 2001.
Perícia da PF nos computadores da Planam revelou que a empresa monitorava a tramitação de emendas de parlamentares.
O número de envolvidos não pára de mudar. A lista começou com 63 nomes de parlamentares, que tiveram ou assessores presos ou seus nomes citados na operação da PF. Os casos foram avaliados pela Mesa da Câmara, que decidiu seguir a investigação, inicialmente, apenas contra 16. Ao depor na PF, Maria da Penha disse que um "terço da Câmara" (170 deputados) faria parte do esquema, mas só apontou 81 nomes. Ontem, baseada nos arquivos da Planam, aumentou o número para 283 parlamentares.
O procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, ainda não decidiu se pedirá ou não ao STF a abertura de inquérito criminal contra parlamentares. No STF, os advogados da Planam tentaram, sem sucesso, tirar a investigação da Justiça comum. Não haveria ainda decisão da Justiça do Mato Grosso sobre se Maria da Penha será beneficiada pela delação premiada, que pode reduzir ou mesmo extinguir sua possível pena.

16 investigados
A Corregedoria da Câmara investiga 16 deputados suspeitos, mas o número deve aumentar nas próximas semanas devido aos documentos da Planam. "Alguns podem sair, mas acredito que outras pessoas serão incluídas, com certeza", afirmou o corregedor, Ciro Nogueira (PP-PI).
Os papéis apontam ainda a existência de pagamentos feitos pela empresa a 13 deputados federais -entre eles dois integrantes da Mesa da Câmara: o 2º secretário, Nilton Capixaba (PTB-RO), e o 4º secretário, João Caldas (PL-AL).
"Não posso avaliar se tem consistência [a lista de 283 nomes]. Tudo o que ela disse será apurado com muita cautela", afirmou o deputado Robson Tuma (PFL-SP), relator da investigação.
Um dos integrantes da Corregedoria, o deputado Givaldo Carimbão (PSB-AL), procurou desqualificar o depoimento: "Cada hora ela cita um número; uma hora é 70, outra hora é 170. Como o Ministério Público não aceitou essa lista, tem algo errado. Acho que ela está é querendo redução de pena", afirmou. A Corregedoria vai requerer a lista que teria sido entregue ao Supremo.
Na saída do depoimento, tomado na superintendência da PF de Brasília, Maria da Penha disse aos repórteres que o "país precisa ser passado a limpo" e que em nenhum momento acusou a deputada Denise Frossard (PPS-RJ), que já teve o seu caso arquivado pela Câmara por falta de provas.
Ela criticou o delegado Tardelli Boaventura, que chefia a investigação, dizendo que ele, ao vazar o seu depoimento à imprensa, será responsável por tudo o que acontecer com ela daqui para a frente. O delegado nega o vazamento.
Maria da Penha também disse no depoimento que recebia da Planam complemento de salário quando era funcionária do gabinete do deputado José Divino (PRB-RJ), responsável por sua indicação ao ministério. O deputado lhe pagaria R$ 600 mensais, e a Planam, R$ 3.400.
A Corregedoria também ouviu ontem, entre outros, Darci Vedoin, sócio da Planam, e seus filhos Luiz Antonio Vedoin e Alessandra Vedoin (que chorou no depoimento), também presos. Eles negaram pagamento de propina a deputados.


Colaborou FÁBIO ZANINI, da Sucursal de Brasília


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