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GOVERNO E OPOSIÇÃO
Presidente critica as altas aposentadorias e a possibilidade de os servidores se aposentarem com 53 anos
Lula reage a FHC e ataca privilégio de servidor
WILSON SILVEIRA
ENVIADO ESPECIAL A PELOTAS
Vaiado por manifestantes contrários à reforma da Previdência,
o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva defendeu sua proposta e rebateu, em tom de desabafo, as críticas que recebeu de intelectuais,
dos servidores e principalmente
do ex-presidente Fernando
Henrique Cardoso ao seu governo. Sobre as vaias na 11ª Feira Nacional do Doce, em Pelotas (RS),
disse não se incomodar, por estar
"vacinado".
Ao se defender das críticas de
FHC, feitas em uma entrevista ao
site do PSDB e publicadas ontem
nos jornais, Lula disse que recebeu o país "quebrado" e que seus
críticos duvidavam de que seu governo fosse capaz de "levar o Brasil a sair do buraco". Acrescentou
que seu governo vai reativar a
economia "com muito cuidado,
com passos certos".
"Os que agora com muita facilidade criticam a política econômica não tiveram coragem de criticá-la em dezembro, porque em
dezembro tinham dúvidas [sobre] se nós seríamos capazes de tirar o Brasil do buraco em que nós
o pegamos", disse.
"O Brasil estava quebrado, e alguém vai ter que salvar este país",
disse ele, afirmando que, quando
tomou posse, o risco-país era de
quase 2.400 pontos e o Brasil não
tinha nenhum dólar para financiar exportações.
"Nem no tempo de Funaro [Dilson Funaro, ministro da Fazenda
de José Sarney que decretou a moratória da dívida externa em
1987], o país teve cortados seus
créditos para exportação. Quando assumimos, não havia um dólar sequer para financiar a exportação. Havia quem dissesse que o
Lula não podia governar porque
ele não fala inglês. Bastaram cinco
meses para provar que não é preciso falar inglês, mas sim caráter,
ética e projetos", disse.
Em outra crítica dirigida a FHC,
afirmou que qualquer outro presidente podia errar, mas ele não.
"Qualquer outro que errasse, não
desse certo, ia morar uns meses
na França, e eu tenho que ficar em
São Bernardo, a 600 metros do
Sindicato dos Metalúrgicos." Ao
deixar o governo, FHC passou
uma temporada em Paris.
Lula voltou a pedir paciência.
"Acontece que, na vida, tem gente
que tem pressa. Vocês todos já viram um jogo de futebol. Tem jogador que tem pressa, pega a bola,
não olha para o lado, dá uma "bicuda" e não marca o gol. Tem outro que olha para o lado, vê um
companheiro livre, passa a bola e
marca o gol. Nós não temos tempo de dar "bicuda". Nós queremos
é marcar todos os gols que achamos que temos o direito de marcar neste país."
E chegou a deixar constrangida
a primeira-dama, Marisa, que estava no palanque. "A coisa que eu
mais queria na minha vida, quando casei com a minha galega [Marisa], era um filho. Ela engravidou
logo no primeiro dia de casamento, porque pernambucano não
deixa por menos. Pois bem, eu tive que esperar nove meses para
nascer a criança e mais quase um
ano para ela falar "papai"."
Intelectual
Lula defendeu a reforma da Previdência, principal alvo dos manifestantes, voltou a comparar as
reações contrárias às reformas à
Revolta da Vacina contra Oswaldo Cruz e a vacinação da febre
amarela, no início do século passado, e citou os intelectuais como
exemplo. Na semana passada, um
grupo de intelectuais criticou o
governo, e os servidores, contrários à reforma da Previdência, fizeram um protesto em Brasília.
"Não quero prejudicar o intelectual, quero aproveitar ao máximo o potencial da sua inteligência
para que fique trabalhando até os
60 ou 70 anos, e não que se aposente com 53. Se um cortador de
cana tem que trabalhar 60 anos
para se aposentar, por que um
professor universitário se aposenta com 53?", perguntou.
A proposta de reforma da Previdência enviada pelo governo ao
Congresso prevê que quem se
aposentar com menos de 60 anos,
no caso dos homens, ou 55, no caso das mulheres, terá uma redução de 5% no valor da aposentadoria para cada ano antecipado,
até uma redução máxima de 35%,
caso o servidor se aposente sete
anos antes do previsto.
Lula também criticou as altas
aposentadorias. "Não posso aceitar que alguém neste país se aposente com R$ 17 mil por mês se 40
milhões de pessoas não têm oportunidade de trabalhar", acrescentou e foi vaiado. O grupo que estava mais próximo a Lula tratou de
aplaudir para abafar as vaias.
Protesto
Manifestantes ligados a mais de
20 entidades de servidores públicos e a alguns grêmios estudantis
acusaram o presidente de traição
durante ato público realizado em
frente ao pavilhão da Fenadoce
antes de Lula chegar.
Os manifestantes, que protestavam contra a reforma da Previdência, se dividiram em três grupos porque ninguém sabia qual
entrada seria utilizada pelo presidente. As restrições impostas pela
segurança presidencial provocaram um grande tumulto na entrada da Fenadoce.
No discurso, Lula disse que não
se incomoda com vaias porque
está "vacinado".
"Sabe quando eu tomei a maior
vaia da minha vida? Quando fui
fundar a CUT [Central Única dos
Trabalhadores]. Depois, quando
fui fundar o PT. Comecei fazendo
política no palanque do PMDB.
No dia em que ousei falar que ia
fundar um partido, tomei uma
vaia que nunca mais eu acordei.
Então, estou vacinado", disse.
Em frente ao palanque havia
cerca de 300 pessoas aplaudindo e
gritando "olê, olê, olê, olá, Lula,
Lula" para tentar abafar as vaias e
palavras de ordem que cerca de
cem manifestantes gritavam. Os
dois grupos estavam separados
por grades de proteção de ferro,
que faziam um corredor para Lula
passar depois da cerimônia.
Ao terminar o discurso, Lula
desceu do palanque e ouviu um
coro ruidoso, bem à sua frente:
"Um, dois, três, quatro, cinco mil,
ou pára essa reforma ou paramos
o Brasil". Sem se intimidar, avançou em direção ao público, cumprimentando manifestantes favoráveis e alguns contrários.
Lula começou o discurso tirando o microfone do púlpito para se
aproximar do público, dizendo
que queria ter uma conversa "tête-à-tête" [face a face] com os
companheiros". A uma certa altura, disse que, quando olhava para
a platéia, era como se estivesse
vendo seus próprios filhos.
Reforma política
Apesar do aumento da base governista, que desde a posse até
maio aumentou de 228 deputados
e 31 senadores para 370 deputados e 53 senadores, Lula defendeu
a reforma política para inibir o
troca-troca partidário. "Vamos
fazer a reforma política para acabar com político que troca de partido com a mesma facilidade com
que troca de camisa", disse.
Colaborou a Redação
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