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São Paulo, quinta-feira, 18 de setembro de 2003

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JANIO DE FREITAS

Tensão e apatia

Os oito assassinatos no sul do Pará, mais um em Pernambuco e as ocupações brutas de duas agências bancárias em Buritis, perto de Brasília, são um prenúncio a mais de que o quase imobilismo do governo, em contraste com o agravamento dos conflitos rurais já indicado pelas crescentes invasões, está levando longe demais o risco de um repentino episódio explosivo. Como a matança de Eldorado do Carajás, outra das expulsões resultantes em confrontos violentos ou demais barbaridades do gênero.
O imobilismo só não é completo porque uma fração do governo, o Ministério da Justiça, foi ativado pelo ministro Márcio Thomaz Bastos para investigar os assassinatos, por pistoleiros no sul do Pará, de sete agricultores e um suposto fazendeiro, todos com tiros na nuca. Só nessa região, no governo Lula já foram assassinadas 30 pessoas, média de uma a cada oito dias. Os padres que por lá vivem estão todos sob ameaça de morte. De Norte a Sul, espalham-se focos de tensão crescente.
Ou melhor, o presidente do PT, José Genoino, que em resposta ao agravamento da situação o governo elabora uma campanha cujo lema é "Paz no campo, contra a violência e a impunidade". Nesse caso, deve-se esperar que lados conflituosos mudem seus propósitos ao ver os jingles bem pagos pelo governo na TV. José Genoino, porém, consegue ser ainda mais cômico, com o imediato diagnóstico de que "as mortes no Pará não se relacionam a movimentos sociais". Decorreram, pode-se então imaginar, de divergências entre os mandantes dos pistoleiros e os assassinados em torno da nova contestação a Einstein.
Também depois das mortes no Pará, o ministro José Dirceu sustentou que a dificuldade está na falta de dinheiro para a reforma agrária. É assim e não é. Falta dinheiro para a reforma, mas não porque haja falta de dinheiro. O governo prometeu espontaneamente ao FMI fazer um saldo astronômico, no confronto entre suas receitas e despesas. Saldo maior para pagar juros, esses juros que o próprio governo mantém em nível de recorde mundial, para felicidade e fortuna da ciranda financeira. Logo, dinheiro há, para a destinação que o governo prefere e pratica. E não é a reforma agrária, nem como beneficiária de uns trocados.
Nem só de falta de dinheiro se faz o imobilismo. Faz-se também da falta de iniciativas que, por sua vez, sugere falta de interesse em buscá-las. Para citar uma providência necessária e, no entanto, inexistentes, é injustificável que não haja comissões mistas em cada um dos pólos de maior tensão e risco, para atenuar, intermediar, ajudar no possível com a presença do Estado, como prevenção e, quem sabe, como solução.
O PT gostava tanto da expressão "falta de vontade política" que, pelo visto, não a quis esquecida. Apenas mudou o modo de empregá-la.


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