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ESCÂNDALO DO MENSALÃO/ A HORA DO "MENSALINHO"
Dono de restaurante que acusa Severino diz que vai esperar a "poeira assentar" para filiar-se e que está envaidecido com elogios à mulher
Buani revela pretensão de se candidatar
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O refrão vigoroso da "Canção
do Toreador", um trecho da ópera Carmem, de Bizet, toca quase
sem parar na campainha do celular de Sebastião Augusto Buani,
54. O dono de restaurante virou
celebridade ao denunciar o pagamento de suposta propina ao deputado federal Severino Cavalcanti (PP-PE) e se diz "assediado"
por pelo menos três partidos políticos, o PSB, o PDT e o PMDB.
"Assim que a poeira do "mensalinho" assentar, vou me filiar a um
partido. A filiação tem de ser agora [o prazo legal termina no dia 30
deste mês], mas a decisão de me
candidatar não é para esses dias.
Não vou me candidatar para ser
mais um", adianta Buani sobre os
planos para a fama inesperada,
mas, segundo ele, bem-vinda.
Se depender do palpite de seu
maior amigo no Congresso, o deputado Alberto Fraga (PFL-DF),
Buani continuará empresário.
Fraga é mais conhecido por liderar o lobby contra a proibição de
venda de armas no país. Na biografia do empresário, aparece como padrinho de sua primeira filiação partidária, ao PTB. Sem militância política, Buani chegou a
integrar a executiva do partido no
Distrito Federal, comandada por
Fraga até o início deste ano.
Tornaram-se amigos na parceria em que Buani entrava com a
cozinha e ingredientes do restaurante do décimo andar da Câmara e, Fraga, com os eleitores. O resultado, um sopão, era distribuído na periferia de Brasília.
"Particularmente, acho que não
tem nada a ver [virar político], ele
tem de ficar no ramo empresarial;
transformar em herói quem denuncia corrupção é uma cultura
que precisa ser revista", analisa o
deputado Fraga.
Em pelo menos um palpite a
Buani, Fraga acertou. Dias antes
de as revistas semanais publicarem a história no "mensalinho", o
empresário o procurou, nervoso,
em busca de um conselho.
"Falei que isso ia acabar mal",
lembra o deputado, amigo também de Severino Cavalcanti. "Ele
disse que isso iria explodir a Câmara", recorda-se Buani.
Duas semanas depois de a notícia do suposto pagamento de propina vir a público, o saldo do prejuízo é o seguinte: o mandato do
presidente da Câmara está por
um fio, e o principal restaurante
de Sebastião Buani fechou as portas na quinta-feira. O contrato de
exploração do restaurante do décimo andar do anexo quatro terminou sem chance de prorrogação por causa de uma dívida de
R$ 131 mil em aluguéis atrasados.
Decepção
Do posto de observação peculiar que manteve por anos no comando do restaurante da Câmara, Buani guarda uma imagem,
segundo ele, "decepcionante" dos
colegas de Severino. "Não quero
que se ofendam comigo, mas uns
10% mandam, os demais vão lá e
apertam botão. Eu tenho certeza
de que a maioria falaria que eu
não deveria falar [sobre os negócios com Severino]", calcula.
Além do restaurante, Buani
conviveu com políticos em partidas de futebol que organizava nas
noites de terça-feira, depois das
votações. "Na bancada da pelada,
ele é quase um deputado", diz o
companheiro de campo, o petista
Zico Bronzeado (PT-AC). Para
outro companheiro das partidas
no Iate Clube, o ministro Agnelo
Queiroz (Esporte), Buani passava
quase despercebido.
Notoriedade
Parte da celebridade de Buani
deve-se à beleza da mulher que o
acompanhou nas aparições públicas em que o empresário, invariavelmente, chorou. Mais de 20
anos mais jovem que o marido,
Diana Buani, 31, mal pronunciou
uma palavra e virou a musa do
"mensalinho".
"Estou com receio de abrir a boca e distorcerem o que eu digo",
disse, preocupada com os boatos
de que posaria para revistas masculinas. "É mentira", garante a estudante de direito, que ajuda o
marido empresário na rede de
restaurantes, todos instalados em
órgãos públicos.
Nem com ciúmes nem chateado
com o título dado à mulher, Buani
se diz envaidecido: "Ela fica sem
saber, é muito tímida, mas eu respondo: ela está adorando, ser escolhida musa é maravilhoso, eu
curto muito que ela esteja sendo
elogiada".
O quarto casamento do empresário começou de forma pouco
romântica. Buani conta que estava separado da terceira mulher,
"carente, malzinho", quando notou uma freqüentadora assídua
do restaurante que mantém no
Senado. "Fui dar em cima da irmã
dela", conta o empresário.
Era a irmã de Diana, que cortou
logo o assédio do empresário: "Eu
estou comprometida, mas tenho
uma irmã em casa que está descomprometida", teria dito a moça. "E ela é parecida com você?",
investiu. "Muito", foi a resposta.
"Daí eu falei: estou pronto para o
que der e vier, com casa, comida e
roupa lavada. E deu certo", relatou Buani.
Versões
Sebastião Buani deixou a musa
do "mensalinho" nervosa na tarde da terça-feira passada, quando
pôs as mãos no cheque de
R$ 7.500 sacado pela principal secretária de Severino Cavalcanti,
Gabriela Kênia Martins. "Nossa,
eu fugi. Olhava para ele [o cheque] e dizia: "meu Deus do céu,
não vou ser crucificado'", contou,
gesticulando muito só de lembrar. Buani não atendeu aos chamados de Diana e passou um recado hermético. O advogado chegou a acionar a Polícia Federal.
Foram horas de agonia no saguão
do prédio onde o casal mora.
"Se eu chego debaixo do bloco
daquele jeito, vocês estavam feitos, eu não me continha, ia chegar
dando cambalhota, gritando,
com aquele cheque na mão", disse o empresário.
No dia seguinte, Buani ainda fez
suspense antes de exibir o tal cheque em entrevista na Polícia Federal. Pediu doações a empresários
para tentar salvar o restaurante da
Câmara, pivô dos negócios com
Severino Cavalcanti, e até puxou
uma oração -apenas para seguir
a linha de defesa desenhada por
seus dois advogados, "evangélicos radicais", de acordo com Buani. Ele mesmo nunca freqüentou
esse tipo de culto e se diz espírita
Kardecista.
Na oração, o empresário chamou a si mesmo de "guerreiro". É
como se vê, diz: filho de pai e mãe
analfabetos, que começou a trabalhar como engraxate aos sete
anos de idade para ajudar em casa
e também foi bóia-fria perto de
Casabranca, cidade do interior de
São Paulo, onde nasceu.
Essa imagem de "guerreiro" é
contestada por outro importante
personagem da história do "mensalinho", o ex-gerente dos restaurantes de Buani, Izeilton Carvalho, o homem que denunciou o
pagamento de propina - "por
causa de grana", segundo o empresário; porque Buani não o faria, insiste o ex-gerente. Brigaram.
"Ele me traiu", diz o empresário. "Nunca mais nos falamos e ele
foi forçado a falar para não ter o
sigilo bancário quebrado", diz
Carvalho.
Detalhes da história do "mensalinho" mudaram nas duas últimas
semanas, e ainda segue incerto o
valor total dos pagamentos que
teriam sido feitos pelo dono de
restaurante ao então primeiro-secretário da Câmara. Uma coisa
não mudou: Buani insiste que não
pagou propina ao deputado, teria
sido vítima de extorsão. O empresário também mantinha, na sexta-feira, o diagnóstico que fizera
reservadamente dez dias antes sobre o destino de Severino Cavalcanti: "Não tem como segurar o
mandato dele".
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