São Paulo, segunda-feira, 18 de novembro de 2002

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ENTREVISTA DA 2ª

Preocupação do banco é com possível instabilidade econômica

HSBC afirma que manterá os investimentos no Brasil

Luciana Cavalcanti/Folha Imagem
Keith Whitson, principal executivo do HSBC, para quem banco mantém aposta na América Latina


ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL

Parte do sucesso mundial do HSBC é explicada pela capacidade do banco de resistir a dificuldades, segundo sir Keith Whitson, principal executivo (CEO) da instituição no mundo.
Isso explicaria, por exemplo, a atitude do banco que, ao contrário de outras instituições, continua apostando na América Latina em plena crise.
Em entrevista exclusiva à Folha, feita em um jatinho fretado durante um vôo entre São Paulo e Brasília, Whitson, 59, provou que, assim como o banco que lidera e onde trabalha desde os 18 anos, ele também não se abate facilmente. Na metade do trajeto, uma forte turbulência, seguida de uma descompressão da cabine, que exigiu o uso de máscaras de oxigênio, assustou bastante.
Superado o susto, Michael Geoghegan, presidente do HSBC no Brasil, chegou a sugerir que a entrevista fosse suspensa. Whitson fez questão de prosseguir.
Bem-humorado, Whitson -que foi nomeado sir, título de nobreza britânico, em junho passado- afirmou que o que mais preocupa o HSBC em relação ao Brasil é a possibilidade de instabilidade econômica. Mas afirmou que, apesar da crise recente, "o Brasil é um caso completamente diferente da Argentina".
Whitson e Geoghegan, que acompanhava a entrevista, demonstraram grande curiosidade em relação aos possíveis nomes dos ocupantes dos cargos de ministro da Fazenda e de presidente do Banco Central no governo Lula.
Os dois e Hélio Duarte, diretor-executivo de relações institucionais do HSBC, seguiam para Brasília, onde teriam audiência com o ministro Pedro Malan (Fazenda).
Antes da rápida visita -um dia e meio- ao Brasil, Whitson havia passado pela Argentina e depois seguiria para o México, onde o HSBC está comprando o grupo financeiro Bital.
A seguir os principais trechos da entrevista.

Folha - Os mercados estão em crise, os lucros são menores e os preços das ações vêm caindo. Quais são as perspectivas para o setor bancário nesse contexto?
Keith Whitson -
Nós vínhamos dizendo ao longo dos últimos dois anos que víamos pela frente tempos de desafio e que isso afetaria o sistema bancário. Nós começamos a falar sobre isso quando anunciamos os resultados do banco em 2000. Naquela época, as pessoas se surpreenderam com nossas preocupações, mas, no fim das contas, ficou provado que estávamos certos. Nós adotamos, então, uma posição mais conservadora. Embora o preço das nossas ações tenha se depreciado, sofremos menos que nossos concorrentes. E nossos resultados têm sido relativamente bons se considerarmos o contexto de circunstâncias difíceis.

Folha - Muitas instituições internacionais têm saído ou diminuído sua exposição na América Latina, recentemente, devido à crise que afeta a região. A estratégia do HSBC parece ser diferente. Vocês continuam na Argentina e estão inclusive comprando um banco no México...
Whitson -
Certo. Nós só começamos a olhar para a América Latina seriamente há sete anos. Acabamos comprando o Bamerindus, no Brasil. Fizemos aquisições na Argentina. Olhamos para o México durante anos. Algumas negociações não progrediram lá e agora, finalmente, temos outra oportunidade com o banco Bital. Essa negociação ainda não terminou, mas esperamos que esteja concluída até o fim deste ano. Com isso, teremos uma das maiores, se não a maior, posição nas Américas. É claro que enfrentamos dificuldades na Argentina, que foram bastante decepcionantes para nós. Tivemos de provisionar uma grande quantidade de dinheiro para manter nossas operações lá.

Folha - No Brasil, apesar da abertura do mercado financeiro, os bancos nacionais continuam sendo os mais fortes. Vocês pensam em aumentar a participação no mercado brasileiro?
Whitson -
Acho honestamente que não podemos olhar apenas para a quantidade de ativos de uma instituição. Realmente nos importamos é com a qualidade do nosso banco em um país e com a forma como ele complementa o nosso grupo. Procuramos comprar bancos que nos permitam oferecer aos clientes uma qualidade de serviços superior à dos nossos concorrentes, que sejam financeiramente fortes, que tenham liquidez. Portanto nós preferimos ser menores, mas muito bons em termos de qualidade. Isso é melhor do que ser uma instituição grande e não muito boa. Por isso estamos bastante contentes em ver como o HSBC está crescendo no Brasil, estamos começando a ver um crescimento na nossa base de clientes.

Folha - Mesmo sem fazer mais nenhuma aquisição importante?
Whitson -
Nós certamente olhamos para oportunidades de compra o tempo todo, não só no Brasil mas em todos os países. Acabamos de comprar um grande banco na Turquia, estamos comprando o Bital, no México, investimos bastante na China. Compramos uma pequena participação no Banco de Shangai e também uma empresa de seguros lá.

Folha - A América Latina, como um todo, parece estar vivendo uma mudança de rumo político. Como o HSBC vê isso?
Whitson -
Nós nos sentimos bastante encorajados pelo que vimos, particularmente no México, onde a transição foi muito boa. O que temos visto no Brasil do ponto de vista político tem sido, até agora, bastante positivo também. Não somos políticos, somos banqueiros. Mas é verdade que a política afeta nosso negócio. Temos visto o presidente Cardoso [Fernando Henrique" e seus ministros apoiando e colaborando com o futuro governo. Isso nos parece muito bom. Um lugar onde a transição política teve resultados bastante decepcionantes foi a Argentina. Mas há sinais de que o país está começando a "dobrar a esquina". Alguns indicadores econômicos começam a ficar mais positivos. Mas é um processo difícil.

Folha - O senhor acaba de vir da Argentina. Como avalia as chances de um acordo do país com o Fundo Monetário Internacional?
Whitson -
É difícil para mim comentar as negociações da Argentina com o FMI, que estão acontecendo a portas fechadas. Mas espero que, até o fim deste ano, tenhamos algum tipo de anúncio, seja o de uma prorrogação do acordo com o Fundo ou, alternativamente, que eles tomem outras iniciativas na Argentina.

Folha - A crise no Brasil assusta?
Whitson -
Sempre disse que considero o Brasil um caso completamente diferente do da Argentina. Acho que o governo aqui, principalmente o time financeiro, é extremamente competente. Isso certamente nos traz muita confiança. O país adotou o câmbio flutuante, a inflação tem sido mantida sob controle. Infelizmente, alguns observadores costumam ver a América Latina como uma coisa só. Há também especuladores que montam posições de curto prazo e apostam contra o país.

Folha - Algo preocupa vocês em relação ao Brasil?
Whitson -
Nossa principal preocupação é com uma possível instabilidade econômica. Se você vai fazer um investimento para o futuro, você vai investir se souber que as condições para produção, inflação e taxa de câmbio vão estar estáveis. Se você está confiante em relação à estabilidade, vai querer investir pensando no longo prazo. Portanto nosso maior desejo é que o novo governo continue seguindo as políticas conservadoras e sustentáveis que têm sido praticadas.

Folha - Por que a oferta de crédito na América Latina não aumentou muito depois da chegada dos bancos estrangeiros?
Whitson -
De forma geral, a influência dos bancos estrangeiros acaba produzindo uma competição muito maior. Geralmente, os preços caem, os serviços melhoram. E acho que, se você olhar para o Brasil nos últimos anos, todos os bancos domésticos melhoraram suas operações de forma significativa.



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