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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ FUNDOS DE PENSÃO
Economista fundou a Guaranhuns, que repassou R$ 6,5 mi ao PL de Valdemar Costa Neto, e é suspeito de ser doleiro de políticos
Mesmo convocado, Funaro não depõe na CPI
MARIO CESAR CARVALHO
JANAÍNA LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL
Aos 31 anos, o economista Lúcio
Bolonha Funaro acumula uma
fortuna de R$ 12 milhões, segundo o próprio, vive num apartamento de R$ 2,5 milhões na zona
sul de São Paulo e circula num
Touareg, o jipão da Volkswagen
vendido no Brasil por cerca de
R$ 320 mil. Já decidira comprar
um jatinho Citation, avaliado em
cerca de R$ 15 milhões, mas a CPI
dos Correios arruinou os seus planos ao elegê-lo como alvo privilegiado de suas investigações.
No mercado financeiro, o próprio Funaro ajudou a difundir a
idéia de que é imbatível quando se
trata de ganhar dinheiro na Bolsa.
A CPI dos Correios, no entanto,
começou a minar essa lenda ao
investigar os fundos de pensão.
Funaro acumulou muito dinheiro, de acordo com a CPI, não
por ser um gênio financeiro, mas
por fazer parte de um esquema
político em que ele sempre ganha
nas aplicações e os fundos de pensão sempre perdem. A Polícia Federal aponta outra de suas fontes
de renda: diz que é doleiro.
Funaro entrou para o noticiário
por ter fundado em 1999 uma empresa, a Guaranhuns Empreendimentos. Foi por meio da Guaranhuns, segundo a CPI, que Marcos Valério repassou R$ 6,5 milhões para o deputado federal
Valdemar Costa Neto (PL), que
renunciou em 1º de agosto para
evitar a cassação.
A amigos, Funaro contou outra
versão sobre os R$ 6,5 milhões.
Diz que havia emprestado essa
soma para Costa Neto usar na
campanha e o então deputado o
pagou com um cheque de uma
das empresas de Marcos Valério.
Aos mesmos amigos, o economista diz que ainda controla a
Guaranhuns -formalmente, ele
repassou a empresa em 2001 a José Carlos Batista, um operador do
mercado financeiro que circula
com um Gol ou de metrô e vive
num apartamento de classe média em Santo André (SP).
A honra do silêncio
O que é certo é que a renúncia
não afetou a amizade de Funaro e
Costa Neto. Eles continuam se encontrando, e Funaro não poupa
elogios ao silêncio de Costa Neto.
Diz que "é homem macho", que
nunca "entregou ninguém".
Esse código de honra é um componente essencial nos negócios de
Funaro. Ali, vale a palavra, mesmo porque muitos dos acordos
não poderiam ser escritos -o
contrato é "no fio do bigode", como ele diz. Segundo investigação
da CPI dos Correios, foi por meio
desse tipo de acordo, por exemplo, que Funaro teria ganhado
cerca de R$ 6 milhões em operações com a Prece, fundo de pensão dos funcionários da companhia de água e esgoto do governo
do Rio de Janeiro.
A Prece foi a fundação que teve
mais prejuízos entre 2000 e 2005,
segundo ranking elaborado pelo
deputado ACM Neto (PFL-BA).
Só em operações na BM&F (Bolsa
de Mercadorias & Futuros), a
fundação perdeu R$ 309 milhões
-o prejuízo total de 14 fundos
analisados foi de R$ 729 milhões.
O período em que as perdas estão concentradas (2003 e 2004)
coincide com os dois primeiros
anos de Rosinha Matheus
(PMDB) à frente do governo do
Rio. As conexões de Funaro com
o Rio estendem-se também a Anthony Garotinho (PMDB): ele é
apontado como um dos operadores do caixa dois do ex-governador -o que ambos negam.
Funaro não nega, no entanto,
que é dele o apartamento em que
o deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) mora, de graça,
no hotel Blue Tree em Brasília.
Cunha é o líder da bancada peemedebista que Garotinho controla, com 20 parlamentares.
Tucanos e Edir Macedo
Sobrinho do empresário Dilson
Funaro, o ministro da Fazenda
que lançou o Plano Cruzado em
1986, no governo do presidente
José Sarney (1985-1990), Funaro
diz que nunca se valeu do sobrenome para abrir portas no mundo político ou no mercado financeiro. Conta, com um sorriso no
rosto, que começou a comprar e
vender dólares quando tinha 15
anos em Vargem Grande do Sul, a
cidade de 37 mil habitantes onde
nasceu, a 246 km de São Paulo.
Aos 18, segundo ele, já ganhara a
confiança dos moradores mais ricos da cidade para aplicar os recursos que lhe eram confiados na
Bolsa de Valores. Foi quando quebrou pela primeira vez, segundo
conta. Funaro relata que foi chamado ao Banco Central em São
Paulo para explicar as operações
que fizera, mas, quando viram a
sua idade, nem quiseram ouvi-lo.
Entre os tucanos, Funaro diz
que seu maior amigo é Ricardo
Sérgio de Oliveira, que foi diretor
da área internacional do Banco do
Brasil no governo Fernando Henrique Cardoso e é apontado como
caixa de campanha do PSDB. Ressalta que é companheiro de partidas de tênis desde que se conheceram, em 2003, quando o PT já havia assumido a Presidência, e
nunca emprestou seu nome para
operações realizadas por Oliveira
com fundos de pensão.
Funaro brinca que se fosse verdade que seus contatos políticos
vão do PL ao PSDB, com escala na
facção do PMDB controlada por
Garotinho, ele poderia se candidatar a deputado que seria eleito.
Delegados da Polícia Federal
que investigam Funaro dizem que
o arco político que ele percorre
tem uma única razão -o fato de
ser doleiro e os políticos precisarem de seus serviços para administrar o caixa dois.
Funaro diz que já cogitou lançar-se candidato a deputado federal. O pai da idéia de sua abortada
carreira política, segundo ele, foi o
bispo Edir Macedo, da Igreja Universal. Desistiu da idéia porque o
modo de vida dos evangélicos lhe
parecia excessivamente ortodoxo.
Havia também razões religiosas.
Funaro é seguidor da Opus Dei, a
corrente católica conhecida por
seu conservadorismo.
Um dos mistérios da CPI é a razão pela qual Funaro já foi convocado, mas até agora não depôs.
Ele próprio tem a sua versão sobre
a "moleza" da CPI. Diz ser "destemperado" e, se provocado, poderia enlamear políticos de A a Z.
Ilustra o seu descontrole com
uma história sobre Flávio Maluf.
Diz que o filho de Paulo Maluf fez
negócios com ele e deixou como
caução um cheque de R$ 600 mil.
Às vésperas da data em que o cheque deveria ser depositado, Flávio
teria lhe pedido para trocar o cheque por dez cheques, assinados
por outras pessoas. Funaro diz
que aceitou. Ao depositar a série,
descobriu que nenhum deles tinha fundo. "Fui até a Eucatex e dei
uma porrada no Flávio", conta.
Adilson Laranjeira, assessor de
Paulo Maluf, confirma que Flávio
fez negócios com Funaro. Já a briga entre os dois, segundo Laranjeira, é lenda: "O Flávio nunca viu
esse rapaz. Esse Funaro está com
problemas com a CPI e quer arrastar outras pessoas com ele".
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