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ELIO GASPARI
O brasileiro, esse problema
Lula disse o seguinte:
"Esta é a hora de cada
brasileiro e brasileira pensar
menos em si mesmo e mais no
país. (...) Louvável tem sido a
conduta política dos governadores e governadoras, prefeitos e
prefeitas, de todos os partidos,
que vêm colocando seus compromissos com a nação acima
de seus interesses particulares".
Será que ele realmente acredita que os governadores e prefeitos (de cujo apoio precisa) formam uma louvável elite de altruístas num país de brasileiras
e brasileiros egoístas?
Boa parte dos 53 milhões de
eleitores de Lula prefeririam ouvi-lo dizendo assim:
"Esta é a hora de governadores e prefeitos pensarem menos
em si e nos seus partidos e mais
no país. Louvável tem sido a
conduta de cada brasileira e
brasileiro que aguenta o desemprego, os juros altos, a violência
e a estagnação, colocando a esperança acima dos sofrimentos".
Lula ainda não tem dois meses de governo e já faz concessões a uma retórica depreciativa
do povo, típica do andar de cima. Oito anos de demofobia tucana tornaram esse número até
cansativo. O Brasil não difere da
França, dos Estados Unidos ou
do Iraque porque os brasileiros e
brasileiras pensam mais em si
do que no país. Se Pindorama
padece de um mal, este foi o de
ter sido governado por pessoas
que têm uma má opinião de seu
povo.
Atribui-se a San Tiago Dantas
a observação de que a Índia tem
uma grande elite e um mau povo (para ficar no adjetivo mais
educado), enquanto o Brasil
tem um grande povo e uma má
elite. Num dos discursos que
pronunciaria no dia de sua posse, em 1985, Tancredo Neves fez
um precioso resumo da grandeza do povo brasileiro, contrapondo-a ao nanismo de uma
elite de segunda.
Infelizmente, Lula deu-se a
crer que o brasileiro pensa mais
em si do que no país. Não há
uma medida capaz de aferir o
grau de egoísmo das pessoas,
muito menos dos povos, mas se
pode suspeitar que o problema
esteja mais na cabeça do presidente do que no coração das
gentes. Por exemplo: aquele pedaço desse povo que vai para a
porta de suas casas e palácios
para abraçá-lo. Pouco ou nada
lhe pedem. Já não se pode dizer
o mesmo dos maganos que recebe no Planalto.
Um povo que suporta uma
carga tributária de 36% do PIB
e vai completar duas décadas de
virtual estagnação econômica
merece mais carinho. Não é justo que o presidente da República lhe jogue frases de efeito,
aproveitando a ocasião para falar bem de si próprio ("Sou um
homem acostumado a falar com
franqueza e de coração aberto")
e mal de seu antecessor ("fonte
de nossas dores de cabeça").
A tosca frase de Lula ecoa algo
dito há tempos, com estilo e graça, pelo presidente John Kennedy em seu discurso de posse:
"Não pergunte o que seu país
pode fazer por você, mas o que
você pode fazer pelo seu país".
Não quer dizer nada, mas soa
bem.
Se fosse para beber nessa fonte, os presidente brasileiros deveriam ser obrigados a ouvir outra construção:
"Não pergunte o que o povo
pode fazer por você, mas o que
você pode fazer pelo povo".
Se não puder fazer nada, pelo
menos não fale mal dele.
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