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CELSO PINTO
Uma conta de US$ 83 bilhões
A necessidade de recursos externos do Brasil, no ano passado, chegou a US$ 83,6 bilhões.
Esse é o volume de dólares que
seria necessário se o país quisesse ter fechado suas contas
sem perder reservas cambiais.
É muito dinheiro, por qualquer critério. Equivale a 10,4%
do PIB, que ficou em US$ 806
bilhões em 97 nas estimativas
do Banco Central. Embora
uma parte deste dinheiro seja
estável, como os financiamentos às importações, outra é
muito volátil, como as aplicações de curto prazo.
A necessidade total de recursos em 97, calculada pelo economista Octávio de Barros, da
Sobeet, é a soma do déficit em
conta corrente, das amortizações e da perda de reservas. Para 98, a conta será menor, mas
ainda assim muito expressiva,
em valores absolutos.
O déficit em conta corrente
mede o resultado líquido da
conta comercial (exportações
menos importações) e de serviços (juros, remessas de lucros,
fretes etc.). Em 97, o buraco
ficou em US$ 33,4 bilhões, pelos
números revisados do BC. Para
98, as autoridades têm mencionado um número em torno de
US$ 30 bilhões.
As amortizações em 97 chegaram a US$ 28,7 bilhões, segundo o BC. Para este ano, o
BC prevê amortizações de US$
18,4 bilhões. Até aí, as necessidades neste ano seriam US$
13,7 bilhões inferiores às de 97.
A diferença final está no movimento dos capitais de curto
prazo que saem, basicamente,
por meio do mercado de câmbio flutuante. O mercado estima que o flutuante perdeu US$
23,6 bilhões no ano passado.
Neste ano, até agora, já perdeu
US$ 2,5 bilhões.
É esse tipo de capital que fez
a diferença final nas contas do
ano passado, argumenta Barros. Para entender por que,
basta seguir as contas publicadas pelo BC na terça-feira.
Somando o déficit em conta
corrente e as amortizações, já
mencionados, as necessidades
de recursos em 97 chegaram a
US$ 62,2 bilhões. Essas necessidades foram mais do que cobertas pelo ingresso de diferentes tipos de capitais, num total
de US$ 76,2 bilhões.
Foram US$ 17,1 bilhões em
investimentos diretos, US$ 5,3
bilhões em investimentos em
portfólio, US$ 20,1 bilhões em
financiamentos a importações,
US$ 28,9 bilhões em empréstimos de longo prazo, US$ 2,1
bilhões em linhas de crédito de
curto prazo e US$ 2,7 bilhões
em "63 caipiras" (empréstimos de curto prazo à agricultura).
Apesar de todos esses dólares,
contudo, as reservas cambiais
caíram US$ 7,9 bilhões. A razão principal está na saída de
US$ 21,4 bilhões de capitais de
curto prazo -equivalente, basicamente, às perdas no flutuante, segundo Barros.
O câmbio flutuante engloba
várias contas, do cartão de crédito gasto no exterior ao turismo. O grosso de sua movimentação, contudo, é de aplicações
externas de curto prazo no
Brasil, utilizando as contas de
não-residentes (as famosas
CC-5) e de dinheiro de brasileiros que é remetido para o exterior.
O câmbio flutuante tem sido
fortemente negativo há muitos
anos. Antes da crise do ano
passado, no entanto, o Brasil
atraía tanto capital externo
que conseguia compensar a
perda de dólares no flutuante e
ainda aumentar as reservas.
No ano passado, contudo,
não foi assim. Só no último trimestre, depois da crise asiática
em outubro, saíram pelo flutuante US$ 10,9 bilhões, na estimativa de Barros. O que mostra o potencial de estrago de
uma crise externa.
Isso coloca em perspectiva a
discussão sobre a dívida de
curto prazo. O BC estima esta
dívida em US$ 35,4 bilhões no
ano passado, 18,4% da dívida
total de US$ 192 bilhões, o que
soa razoável. O comportamento dos capitais de curto prazo e
das remessas de brasileiros
quando houve a crise, contudo,
deixam claro que não basta
olhar a proporção da dívida de
curto prazo para imaginar
quanto o país pode perder rapidamente com uma crise externa.
O diretor do BC Francisco
Lopes, aliás, é o primeiro a reconhecer este fato. Há vários
anos ele admite que, no limite,
o potencial de perda de dólares
é o total dos ativos financeiros
do país: R$ 386 bilhões no final
de novembro. Quando bate o
pânico, acabam saindo todos
os tipos de capitais, a começar
o dos brasileiros.
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