São Paulo, domingo, 19 de maio de 2002

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JANIO DE FREITAS

Uma visão de momento

O assunto é José Serra. Só pode ser Serra. As conversas, há mais de uma semana, parecem todas começar ou acabar em Serra.
A questão sempre presente, sem por isso excluir várias outras, é a da permanência ou substituição da candidatura, seja por decisão do candidato ou do PSDB. Entre os peessedebistas, é certo que o número dos contrários ou descrentes na candidatura de Serra cresce a cada pesquisa. E a impressão mais recente é de que deu um salto, desde o último Datafolha na quarta-feira, correspondente à subida de Luiz Inácio Lula da Silva de 32% para 43% e à queda de Serra de 22% para 17%. Mas não há resposta para a pergunta óbvia: quem poderia ser o substituto?
A timidez, quase sussurro, com que se arriscam os nomes de Aécio Neves e Tasso Jereissati já reflete a falta de condições de ambos para a empreitada. O primeiro desfruta de simpatia pessoal entre políticos de Brasília, tem eleitorado em Minas e em certos meios socialites cariocas, mas daí em diante precisaria partir do zero. O governo de Minas, no entanto, está quase em suas mãos.
Jereissati tem recomendações de fazer política mais com a cabeça, o que faz com competência, do que com esforços físicos na intensidade própria de uma campanha presidencial. E, afora esses dois, acabou-se o grande PSDB, a maior concentração de arrogância vazia já constituída por aqui.
O problema de nomes presidenciáveis merece muito mais atenção do que a sugerida pelas dificuldades, até aqui, de Serra. O que acontece nos três partidos que controlam o Congresso e quase rivalizam com o FMI, na influência sobre o governo, faz uma forte denúncia da falência da política e da mediocridade dos políticos. O PSDB só teve e só tem um candidato possível. O PFL, abatida Roseana Sarney, não encontrou em seus vastos quadros um nome, um sequer, para arriscar-se na disputa. O PMDB, vetados Itamar Franco e Pedro Simon porque honestos demais para ampla maioria do comando partidário, não consegue chegar a um nome nem ao menos para vice, na chapa PSDB-PMDB.
O vice, por sinal, é evidência quase cômica da insuficiência imperante no círculo político que deveria fortalecer a candidatura de Serra. Primeiro, foi a longa e corrosiva insistência pública no pernambucano Jarbas Vasconcelos, que em momento algum mostrara entusiasmo pela idéia. Desde então, há mais de um mês arma-se o noticiário em torno de um certo Henrique Alves, que a cúpula peemedebista quer empurrar, Fernando Henrique Cardoso aconselha a ser adotado logo por Serra e vários jornalistas escrevemos que é um nome sujeito a mais um escândalo desgastante para o candidato.
O noticiário de ontem já apresentava Henrique Alves na situação prevista. Até no mesmo patamar de Ricardo Sérgio de Oliveira: US$ 15 milhões. Se fosse necessário escolher o vice a esta altura, vá lá o risco, mas o tempo sobra e nem conveniência há. A assessoria política de Serra era pior do que nula, recebeu reforços nos últimos dias e, pelo previsível, Serra continuará solitário nas ações propriamente políticas, tão importantes para qualquer candidato.
Outro reforço foi a inclusão do marqueteiro Nizan Guanaes, que já fazia assessoramento por trás da cortina. Nizan estreou duas teses para a definição da campanha: atacar Lula pesadamente e identificar Serra com o governo Fernando Henrique. Exceto por uns poucos momentos agressivos de Ciro Gomes e de Anthony Garotinho, a disputa se desenvolvia com padrão ético muito melhor que todas as anteriores. Serra, segundo o qual "baixaria não faz o meu [dele] gênero", já se voltou para Lula. Se ganhar alguma coisa, nem por isso terá salvo o próprio telhado de vidro.
O Datafolha de quarta-feira trouxe um dado eloquente: dois em cada três eleitores, ou dois terços do eleitorado, querem votar em candidato contrário a Fernando Henrique e, portanto, ao governo. Logo, quanto mais Serra seja identificado com Fernando Henrique e com o governo, mais pedregoso lhe fica o percurso. Até que se instaure um novo quadro de disputa, se houver, seu maior adversário não são os outros candidatos, é o governo que lhe impõe um teto no eleitorado: o insuficiente e precário terço do eleitorado que pretende votar em candidato pró-Fernando Henrique.
O ex-arrecadador de campanhas serristas Ricardo Sérgio & cia. têm dificultado a candidatura de José Serra. Mas não será exagerado dizer que apenas colaboram, com ingredientes mais ácidos, para um desarranjo mais amplo, que começava da falta de estrategistas e entra na fase de má estratégia.
Enquanto isso, Ciro Gomes passa a atrair atenções, influentes no meio empresarial, que se concentravam em Serra. Não fosse o senador Roberto Freire, Ciro Gomes, que está tecnicamente empatado com Serra e Garotinho no segundo lugar, já estaria isolado nessa posição há muito tempo. Há sinais de que começa a receber estímulos nessa direção, decorrentes da necessidade dos anti-Lula de que haja segundo turno.



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