São Paulo, sábado, 19 de maio de 2007

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Construtora fez até o edital de obra que ganhou, diz PF

Investigação mostra padrão de fraudes conduzidas pela Gautama com dinheiro público

Esquema revelado pela operação pagava propina para conduzir construções inexistentes, inacabadas ou superfaturadas


RANIER BRAGON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

As investigações da Operação Navalha revelam um padrão na suposta ação fraudulenta da construtora Gautama: o suborno de políticos e funcionários públicos para obter obras e receber verbas do Estado por serviços ora inexistentes ora inacabados ora superfaturados.
Em ao menos um caso, a empreiteira elaborou o edital da licitação que ela mesma venceria. Via de regra, a propina era paga em dinheiro vivo, mas servidores também teriam aceitado se corromper em troca de passeios de lancha e ingresso para camarote no Carnaval.
Quarenta e nove integrantes do governo federal, de governos estaduais, de prefeituras e da construtora são suspeitos de participar do esquema.
Segundo o resumo das investigações da Polícia Federal feito pela ministra do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Eliana Calmon, a Gautama, do empresário Zuleido Soares Veras, fraudava documentação e subornava técnicos e políticos como forma de escamotear irregularidades nas obras.
Um exemplo aconteceu, de acordo com a PF, na instalação de eletrificação rural (programa Luz para Todos) para 15.850 famílias da zona rural do Piauí, em meados de 2006.
Mediante o pagamento de propina a agentes públicos do Estado, a Gautama teria elaborado o edital de licitação que, no final, a beneficiaria como a vencedora da concorrência.
Os grampos telefônicos da PF revelariam que um engenheiro da empresa enviou o aviso da licitação para que o então presidente da Companhia Energética do Piauí, Jorge Targa Juni -preso na Operação Navalha-, publicasse o edital.
Zuleido teria se encontrado em Brasília com o diretor do programa Luz para Todos, do Ministério de Minas e Energia, José Ribamar Lobato Santana, "para obter o repasse de recursos do ministério para a Eletrobrás, que os repassaria, através de convênio, para a Companhia Energética do Piauí e, daí, para a Gautama, através de contratos firmados mediante fraude no processo de licitação".
O relato da investigação, feito pela ministra do STJ, não deixa claro qual seria a suposta participação do diretor do Luz para Todos, afirmando que "a organização teria pago vantagem indevida a autoridades do Ministério de Minas e Energia". Santana não foi preso. Segundo a assessoria, o ministério não foi informado sobre o envolvimento de Santana ou outros funcionários nas investigações.

Pontes
Outro caso de suposta fraude detectada nos grampos da PF diz respeito ao Maranhão, onde a quadrilha teria recebido pagamentos pela construção de pontes que, concluiu a investigação, são hoje "elevações perdidas no meio dos campos, em locais ermos", em suma, "obras abandonadas". Devido aos pagamentos irregulares, o então governador do Estado, José Reinaldo Tavares, teria sido presenteado com um Citröen C5 no valor de R$ 110 mil.
Em Camaçari (BA), a empresa de Zuleido Veras atuou em 2006 em obras de urbanização em troca de R$ 9,8 milhões. "Tanto o plano de trabalho como o projeto básico foram elaborados sem observância das exigências técnicas para obras daquela natureza e sem a mínima preocupação com a qualidade da obra que seria executada", registra a ministra do STJ.
A propina, diz a PF, foi paga ao prefeito, Luiz Carlos Caetano, e a servidores e se resumiu a passeios de lancha, passagens aéreas, hospedagem e ingresso para o camarote da Gautama no Carnaval de Salvador.
Também em 2006, João Alves Neto, filho do então governador de Sergipe, João Alves, teria recebido propina para influenciar na liberação de verbas para a duplicação do sistema de adutoras do rio São Francisco.
A construtora fez pelo menos duas obras para o Ministério da Justiça -a construção da sede da superintendência da PF em São Paulo e a reforma do Instituto Nacional de Criminalística em Brasília. Não há menção a fraudes nessas obras.


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