São Paulo, segunda-feira, 19 de junho de 2006

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Ciência e Tecnologia foi alvo de sanguessuga

Planam, empresa que comandou fraude na Saúde, intermediou liberação de verba para projeto de inclusão digital itinerante

Deputados usavam ofício padrão feito pela Planan para informar ministério sobre emendas destinadas à aquisição de ônibus

ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A Planam, empresa que comandou a máfia dos sanguessugas no Ministério da Saúde, atuou também para a liberação de recursos no MCT (Ministério da Ciência e Tecnologia).
O esquema de desvio de verbas públicas dos sanguessugas, que se tornou conhecido pelas fraudes na compra de ambulâncias e teria movimentado R$ 110 milhões desde 2001, teve também como alvo em 2005 o dinheiro destinado à aquisição de ônibus equipados com computadores para dar aulas de informática em prefeituras do país, projeto conhecido como inclusão digital itinerante.
Em meio a um conjunto de papéis obtidos pela Folha, há ofícios em nome de 20 deputados destinados ao então ministro da Ciência e Tecnologia, Eduardo Campos (PSB-PE), nos quais os parlamentares informam sobre a inclusão no Orçamento de emendas deles destinadas a iniciativas no segmento de inclusão de digital.
Em texto padrão, os documentos deixam espaço em branco para o parlamentar escrever o nome da entidade que deverá gerir o projeto. Os ofícios fazem parte da contabilidade da Planam. Os arquivos foram copiados da base de dados da Planam por Maria da Penha Lino, a ex-servidora do Ministério da Saúde responsável por agilizar os trâmites burocráticos necessários à liberação do dinheiro para a máfia dos sanguessugas.
Em depoimento ao Ministério Público e à Polícia Federal, Maria da Penha, que foi funcionária da Planam até março de 2005, acusou 81 parlamentares de envolvimento com o esquema. Os documentos obtidos pela Folha agora trazem quatro nomes que estão na lista dos sanguessugas e que também aparecem na nova fraude: os deputados Heleno Silva (PL-SE), João Correia (PMDB-AC), Júnior Betão (PL-AC) e Osmânio Pereira (PMDB-MG).

Brecha digital
Como foram entregues à reportagem em meio digital, os ofícios não apresentam as assinaturas dos parlamentares. Porém, os documentos têm data, foram elaborados em papel timbrado da Câmara e chegaram ao seu destino.
Com a intermediação da Planam, que é negada pelos deputados ao saberem que sua assinatura não consta dos documentos, metade dos parlamentares teve seus pedidos atendidos. Em 2005, 57% de R$ 9,95 milhões destinados diretamente pelo Ministério da Ciência Tecnologia à inclusão digital itinerante foram empenhados em favor de projetos intermediados pela Planam. Por meio da Finep (Fundação de Estudos e Projetos), órgão vinculado ao MCT, outros R$ 2,23 milhões foram usados para pagar projetos apresentados em ofícios feitos pela Planam.
Em maio, quando surgiram as primeiras pistas de que o esquema dos sanguessugas poderia ter atuado em outros setores, o MCT suspendeu todos os projetos de inclusão digital.
A Finep detectou "indícios de fraude na execução dos projetos", conforme nota de esclarecimento divulgada na época. Auditoria feita pelo órgão concluiu que "estritamente do ponto de vista processual dos projetos [...], não há evidências de normas vigentes".
O projeto de maior valor foi lastreado por emenda da deputada Edna Macedo (PTB-SP). É de R$ 1,6 milhão e destina-se a ônibus de inclusão digital para cidades de São Paulo. A assessoria da deputada disse que, por iniciativa de Edna, a emenda foi cancelada.
Um ofício de 3 de maio de 2005, atribuído ao deputado Júnior Betão (PL-AC), informa ao ministro Eduardo Campos o destino de duas emendas voltadas para iniciativas de inclusão digital: R$ 950 mil para municípios do Acre e R$ 150 mil para a cidade de Rio Branco (AC). Apesar de suspender o pagamento depois, o ministério empenhou verbas para a emenda de valor mais alto.
O deputado Paulo Baltazar (PSB-RJ) conseguiu a liberação de pagamento para uma emenda de R$ 1,08 milhão destinada a municípios do Rio de Janeiro.
Os documentos obtidos pela Folha incluem ofícios elaborados pela Planam em nome de dez prefeitos e destinados, entre janeiro e abril de 2005, a Eunício Oliveira, então ministro das Comunicações. Os ofícios apresentam projetos de inclusão digital, sempre em modelo padrão, por meio dos quais as prefeituras pedem, cada uma, R$ 250 mil para comprar e equipar seus ônibus.
Dos dez projetos intermediados pela Planam, o ministério empenhou verbas para pagar três deles, mas em valores inferiores e com destino a telecentros fixos. Sob a gestão do ministro Hélio Costa, Rolante (RS) recebeu R$ 55 mil. Houve empenho de verbas para Pancas (ES - R$ 80 mil) e Poconé (MT - R$ 55 mil).


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