São Paulo, Sábado, 19 de Junho de 1999
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GOVERNO
FHC deve definir novo diretor-geral da PF na segunda-feira
Campelo pede demissão três dias depois de assumir

17.jun.99France Presse
João Batista Campelo, diretor-geral da PF que pediu demissão ontem


da Sucursal de Brasília

O novo diretor-geral da Polícia Federal, João Batista Campelo, não resistiu às pressões políticas de aliados do governo e dos grupos de defesa dos direitos humanos e pediu demissão no início da tarde de ontem -antes de completar três dias no cargo. Poupado do trabalho de demitir Campelo, o presidente Fernando Henrique Cardoso prepara uma sucessão cautelosa e sem traumas.
FHC deverá definir o nome do substituto na segunda-feira, depois de ouvir o ministro da Justiça, Renan Calheiros. Campelo caiu depois que o ex-padre José Antônio Monteiro acusou o delegado de ter comandado sessão de tortura contra ele em 1970.
O nome mais forte para o comando da PF é o do seu atual superintendente no Distrito Federal, Paulo Gustavo de Magalhães Pinto. Tido como discreto, não tem ligações com grupos políticos e é apontado como solução técnica para o caso. Magalhães Pinto foi chefe da Divisão de Repressão a Entorpecentes.
Outro nome sob avaliação no Palácio do Planalto é o do delegado Zulmar Pimentel, lotado atualmente na Divisão de Crime Organizado e Inquéritos Especiais. Ele não conta com muitas simpatias dentro da corporação.
Pimentel é o preferido do chefe da Casa Militar, general Alberto Cardoso. Por isso, sua indicação pode ser interpretada como uma afronta a Calheiros. O general e o ministro disputam influência na nomeação do diretor da PF.
A tendência do governo é descartar nomes envolvidos na disputa que levou à indicação de Campelo. Além de Zulmar, foram cogitados à época os nomes dos delegados Marcelo Itagiba (atual assessor do ministro José Serra) e Wantuir Jacini, indicado por Calheiros.

""Cordiais saudações"
FHC aceitou imediatamente o esperado pedido de demissão de Campelo e pediu que o delegado permaneça no cargo até segunda-feira, quando pretende definir a sucessão na PF. O presidente se reunirá com o ministro da Justiça para tratar do assunto.
Superior hierárquico do diretor da PF, Calheiros soube da saída de Campelo pelo chefe da Casa Civil, Clóvis Carvalho, e depois pelo presidente, que telefonou para o ministro do Rio de Janeiro. A carta de demissão havia sido entregue ao general Alberto Cardoso às 14h30, cerca de uma hora antes do telefonema de FHC a Calheiros.
Em apenas quatro linhas dirigidas a FHC, Campelo agradeceu a confiança que recebeu do presidente. ""Peço-lhe minha exoneração do cargo compreendendo a grave situação política vivida no país neste momento", diz o texto. A carta termina com ""cordiais saudações". Mais tarde, na PF, Campelo divulgou uma nota oficial.
Calheiros, que ameaçou pedir demissão diante da escolha de Campelo, insiste numa solução técnica para a vaga. ""Defendo a escolha de uma pessoa honrada, acima de grupos, isento e que respeite a hierarquia", disse o ministro no final da tarde de ontem.
Na sua curta passagem pela PF, Campelo não chegou a despachar com Calheiros, que lhe deu uma posse protocolar na última terça-feira, já apostando na demissão do subordinado.
As denúncias sobre a participação do diretor da PF em sessões de tortura no início dos anos 70 inviabilizaram sua permanência no cargo. A demissão foi precipitada pela pressão de aliados políticos do governo. O PSDB chegou a pedir a FHC que o demitisse anteontem.
Tratava-se de um claro processo de ""fritura", mas Campelo ainda resistia a pedir demissão.
FHC não havia sido informado previamente sobre detalhes do passado de Campelo e vinha insistindo em que não podia prejulgá-lo nas acusações de tortura. No início da semana, o presidente encomendou uma investigação ao serviço de inteligência da Casa Militar. O trabalho não foi concluído.
O general Alberto Cardoso não encontrou provas contra Campelo. Nem era mais preciso. Faltavam condições políticas mínimas para que o delegado comandasse a PF.
O depoimento anteontem de Campelo na Comissão de Direitos Humanos na Câmara também não convenceu FHC e seus aliados. No depoimento, Campelo disse que usou "técnicas de interrogatório e de entrevista" contra o ex-padre Monteiro. Depois do depoimento, a Executiva Nacional do PSDB se reuniu e concluiu que, independentemente de se comprovar seu envolvimento com atos de tortura, Campelo ficou "sem condições políticas" de permanecer no cargo.
À saída, Campelo recebeu elogios de assessores de FHC e do líder do governo no Congresso, deputado Arthur Virgílio Neto (PSDB-AM). ""Ele foi muito correto na hora de sair. Foi muito elegante", resumiu o deputado, um dos raros políticos presentes à posse do chefe da PF. Na ocasião, fez a ressalva: ""Ajoelhou, tem de rezar".
Depois de mais uma semana de denúncias contra Campelo na imprensa, o governo havia concluído que a decisão de indicá-lo fora um equívoco. O erro foi atribuído à forma tumultuada pela qual o presidente escolheu o nome (por exclusão) na noite do último dia 9.
Na avaliação do Planalto, a escolha do sucessor de Campelo é ainda delicada e tem de ser feita com cuidado para evitar uma nova crise. O currículo do indicado tem de ser ""à prova de testes", dizem assessores do presidente.
Por isso, a vida dos candidatos ao cargo está sendo vasculhada no Planalto. Como a disputa pela direção da PF já causou muita confusão, os políticos da base governista prometem não se intrometer na sucessão de Campelo.

Roraima
O governador de Roraima, Neudo Campos (PPB), disse ontem que o cargo de secretário da Segurança Pública de Roraima continua à disposição de João Batista Campelo. Ele havia acabado de assumir como secretário da Segurança quando foi convidado a ser diretor-geral da PF.
Campos disse não acreditar que Campelo seja um torturador. Para ele, Campelo foi vítima de um "jogo político".


Colaborou a Agência Folha

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