São Paulo, terça-feira, 19 de julho de 2005

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TODA MÍDIA

Nelson de Sá

Paranóia

A entrevista que caiu do céu continuou em exibição, ontem nos telejornais da Rede Globo.
No "Bom Dia Brasil" e ao longo do dia, "o presidente diz que o PT fez o que é sempre feito pelos partidos no Brasil".
Se alguém avaliou que a entrevista ajudaria a blindar Lula, deve estar arrependido. A repercussão foi na linha de que a desculpa não anistia.
E a simultaneidade com Marcos Valério e Delúbio Soares, sempre na Globo, acabou por aproximar ainda mais o presidente de ambos. Na escalada do "Jornal Nacional":
- Depois da entrevista de Valério, depois da entrevista de Delúbio, depois da entrevista do presidente Lula, integrantes da CPI estranham as coincidências da nova versão.

 

O "JN" pode empostar certa estranheza, mas outras Globos cuidavam ontem de defender a entrevista.
Do blog destacado na home page da Globo Online, logo abaixo do "link" para o vídeo com a entrevista:
- Chega de paranóia: a mídia cumpre seu dever... A jornalista que entrevistou o presidente presta serviço para os principais canais da França e estava envolvida havia meses com um documentário sobre Lula.
Quando ela conseguiu afinal a entrevista:
- Vendo que tinha matéria quente nas mãos, decidiu vender a peso de ouro. Ligou para o impoluto Caco Barcellos oferecendo o material. Acabou vendendo a preço de mercado, bem alto, por sinal, para os padrões brasileiros.
Sobre a própria Globo, além de pagar alto:
- Quem é que, tendo acesso a uma entrevista como esta, do presidente em meio à crise, deixaria de publicá-la?
 

No exterior, a repercussão até ontem se restringia aos despachos de agências.
No título da Reuters, "Lula culpa chefes do PT por crise". Da Dow Jones, "Presidente do Brasil diz que partido cometeu erros". Da UPI, "Lula diz que PT deve explicar escândalo".
 

Em texto anterior à entrevista de Lula, o "Financial Times" publicou a reportagem "Admissão de financiamento ilegal atinge presidente".
Ecoou a entrevista de Delúbio Soares à "televisão Globo", ainda no sábado, e disse que, com ela, "o Partido dos Trabalhadores de Lula mergulhou mais fundo na crise".
Entre outros, repercutiram o texto a própria Globo, Folha Online, BBC Brasil e vários outros sites e blogs.
 

Para a reportagem do "FT", "a pressão da oposição e da mídia sobre Lula se intensificou".
Mas ontem, na cobertura local de TV, rádio e internet, o alvo preferencial foi o partido. O pior -a piada pronta- veio na voz da apresentadora Fátima Bernardes, na Globo:
- O ex-assessor do PT flagrado com R$ 200 mil e US$ 100 mil contou a versão dele. Disse que não levava dinheiro na cueca e sim na cintura.
E que era tudo para abrir uma "locadora de automóveis". E tem mais, na primeira manchete no "Jornal da Band":
- O homem preso com US$ 100 mil na cueca agora quer o dinheiro de volta.
 

Mais contra o PT, na primeira manchete do "JN":
- Um documento comprova triangulação. Valério contraiu empréstimo, contratos com os Correios foram usados como garantia e o PT recebeu dinheiro de Valério.

FRENESI

Ilustração do "FT"

O site do "Financial Times" adiantou ontem uma reportagem a ser publicada em sua edição de hoje, sob o título "Batalha de mídia para ganhar leitores mantém o ritmo no escândalo do Brasil". Aborda a cobertura brasileira do caso:
- Por semanas, os três principais jornais, "O Estado de S.Paulo", Folha de S.Paulo e "O Globo", têm dedicado até 12 de suas 16 páginas do primeiro caderno para reportar detalhadamente o escândalo. "Veja", a principal revista semanal, apareceu com uma sucessão de capas. Suas concorrentes "Época", "IstoÉ" e "Carta Capital" se esforçam para se manter na história. Os telejornais quase só focam isso.
 

Segundo o "FT", "críticos de mídia dizem que, ao não investigar apropriadamente as denúncias, os repórteres estão contribuindo para um frenesi e simplesmente amplificando as denúncias em vez de buscar examinar a sua seriedade". Avalia o jornal britânico:
- Tendo escapado das garras da censura mais de 20 anos atrás, a mídia brasileira ainda precisa encontrar um caminho para noticiar acusações de corrupção sem assumir que todos os que são acusados são necessariamente culpados.
 

Por outro outro lado, segundo "um apresentador de telejornal", "o PT simplesmente não sabe se relacionar com a mídia". Daí as "relações" ruins, segundo o "FT", "embora muitos jornalistas sejam simpáticos ao PT".

@ - nelsondesa@folhasp.com.br

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