São Paulo, quarta, 19 de agosto de 1998

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ELIO GASPARI
Malan não está disposto a ficar exposto


Lula e Ciro Gomes deveriam ir hoje ao ministro Ilmar Galvão, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, levando-lhe um caso de terrorismo eleitoreiro explícito, destinado a prejudicá-los, a empulhar a choldra e a confundir a condução dos negócios do Estado com a máquina de propaganda do tucanato.
Trata-se da declaração feita pelo ministro da Fazenda, Pedro Malan, na segunda-feira, em Porto Alegre. Referindo-se ao último desdobramento da encrenca financeira internacional, informou o seguinte:
"Não há razão para que a crise na Rússia tenha efeitos sobre o Brasil. Há muitos torcendo para que isso aconteça. Acham que podem ter algum benefício político-eleitoral sobre isso."
Quem está torcendo? "Prefiro que cada um faça a sua interpretação sobre quem são essas pessoas."
Então a coisa funciona assim: O doutor Malan sustenta uma política de câmbio sobrevalorizado, atrela o destino do dia seguinte ao fluxo de capitais externos e, quando emerge uma situação de risco inerente à estratégia que perfilha, acusa os adversários do governo de estarem torcendo por um desastre.
A declaração é terrorista porque pretende atribuir à oposição uma conduta nefasta. Destina-se a prejudicar os candidatos Luiz Inácio Lula da Silva e Ciro Gomes porque, sendo críticos de sua política, lança-lhes a carapuça de torcer para que ocorram malefícios econômicos e sociais, pensando em "algum benefício político-eleitoral".
Empulha a choldra porque procura atribuir eventuais desgraças de sua política às críticas que a ela são feitas. Confunde a administração do Estado com as astúcias típicas das campanhas eleitorais, porque mesmo que todos os oposicionistas saiam amanhã às ruas cantando a musiquinha da campanha de FFHH, a situação continuará exatamente do mesmo tamanho.
Foi a política temerária do governo que jogou os juros a 40% ao ano, desempregou 1,5 milhão de pessoas na Grande São Paulo e derrubou o crescimento do PIB para menos de 3%. Nem os raposões da Baixada Fluminense, que acordam e dormem pensando em golpes eleitoreiros, tiveram algo a ver com isso. Trata-se de uma produção de FFHH, Pedro Malan e Gustavo Franco, atual presidente do Banco Central.
Se tudo isso fosse pouco, a declaração do ministro da Fazenda é também primitiva. Na sexta-feira, em Nova York, a corretora Goldman Sachs perguntou a cem investidores quais países poderiam vir a ser prejudicados pela crise russa. Deu 56,5% para o Brasil e 20% para a Ucrânia e a Argentina.
Ao que se saiba, nem Lula se chama Goldman, muito menos Ciro é Sachs. A menos que o doutor Malan esteja informado de eventuais conciliábulos eleitoreiros da Goldman Sachs, o que a pesquisa da corretora revelou foi um sentimento que, certo ou errado, é politicamente neutro.
Pelas virtudes que a população vê no real, FFHH recuperou a possibilidade de ganhar a eleição no primeiro turno. É o jogo jogado. Ganhou, levou. O que não vale é embolsar a vitória atribuindo a possibilidade do fracasso aos adversários. Nisso, o ministro teria muito a aprender com Zagallo.
Em junho do ano passado, embevecido pelo desempenho anterior ao início da crise financeira, o doutor Malan orgulhava-se de captar rios de dinheiro e explicava: "Estamos fazendo uma aposta de que as mudanças estruturais pelas quais está passando a economia brasileira não só permitirão um aumento das exportações no futuro, como reduzirão as importações".
Em julho passado, Malan carregava um déficit comercial de US$ 2,4 bilhões. Esse resultado tem uma ponta de êxito, pois ficou abaixo da metade dos US$ 5,5 bilhões do desastre dos sete primeiro meses de 1997. Infelizmente, mesmo tendo conseguido a melhor marca do ano, as exportações de julho ficaram em US$ 5,25 bilhões, pouco acima do resultados do ano passado.
Foi Malan quem disse que estava fazendo "uma aposta". O que aposta, não se sabe. Pela sua estocada eleitoreira, parece querer o melhor negócio do mundo. Quando ganha, arrasta as fichas. Quando sente o calor da crise vindo pela porta da direita, pede uma boa média que não seja requentada, manda vir o guarda-chuva do seu Osório no 34-4333 e, como Noel, se despede do garçom:
- Vá dizer ao seu gerente
que pendure essa despesa
no cabide ali em frente.
O gerente se chama Luis Inácio Lula da Silva. Quanto ao cabide, é de Ciro Gomes.



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