|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CELSO PINTO
Perdas com o novo INSS
O projeto de reforma do INSS
enviado pelo governo à Câmara
pretende dar um caráter atuarial
à aposentadoria, ou seja, o aposentado receber em função do
que contribuiu. Com isso, equilibraria as contas a médio prazo.
Não faz uma coisa nem outra.
O juízo é do economista Francisco de Oliveira, coordenador do
Grupo de Seguridade Social do
Ipea, instituto de pesquisa ligado
ao governo. Oliveira é insuspeito
ao criticar, pois tem sido um dos
mais ardorosos defensores de
uma reforma. Foi, além disso, co-autor do projeto elaborado pelo
grupo coordenado por André Lara Resende, em 97 e 98, e que acabou engavetado.
Oliveira diz que o sistema está
quebrado. O valor presente da dívida previdenciária equivale a
três vezes o PIB e o perfil etário do
país a torna explosiva nos próximos anos.
É preciso mudar, especialmente
o INSS. O déficit do funcionalismo, de R$ 19,4 bilhões neste ano,
deve ser o dobro do déficit do
INSS, de R$ 9,5 bilhões. No entanto, enquanto o déficit do funcionalismo tende a se estabilizar,
por não contratação e contenção
salarial, o do INSS cresce sem limite.
A reforma do INSS do governo
está apoiada em quatro pontos.
Amplia a base de cálculo do benefício, ao fixar julho de 94 como
ponto de partida. Cria um "fator
previdenciário", com princípios
atuariais no cálculo do benefício
(tempo de contribuição, idade e
expectativa de vida). Premia
quem se aposenta mais tarde.
Trata igualmente homens e mulheres.
Todos esses são pontos positivos, para Oliveira. Outro aspecto
positivo é tentar resolver o problema pela despesa e não pelo
aumento na contribuição, como
aconteceu nas últimas décadas.
O sistema só não quebrou ainda porque, desde 1940, a contribuição do empregador subiu de
3% para 22% e a do empregado,
de 3% para uma média de 10%.
Além disso, a inflação alta ajudou a achatar o valor real dos benefícios. Hoje, com inflação baixa
e uma carga fiscal alta, os dois expedientes não funcionam mais.
O problema é que a fórmula do
"fator previdenciário", embora
embuta elementos atuariais, não
é atuarial e sim arbitrária. "Com
ovos e óleo é possível fazer uma
maionese ou uma mistura intragável", compara. "O governo não
fez uma maionese."
Ao calcular a expectativa de vida, o governo usa dados do IBGE
que, conforme a faixa etária, geram diferenças de 27% a 94% em
relação ao perfil da população de
fato beneficiada pelo INSS. O governo calcula em 31% a alíquota
de contribuição (11% do segurado e 20% das empresas), mas,
com isso, ignora a cobertura de
eventos imprevisíveis como morte, doença e invalidez.
A fórmula capitaliza, a partir
de julho de 94, a 2,8% ao mês as
contribuições de quem se aposenta até 50 anos, a 3,2% até 60 anos
e 3,4% acima disso. A taxa é boa,
admite Oliveira, mas, como parte
de critérios discutíveis, não
adianta.
Usando o perfil de aposentadoria atual, com o novo regime a
perda média dos homens será de
um terço do valor e a das mulheres superará 50% (porque o regime anterior as privilegiava). Para não perder nada com o novo
regime, um homem teria que se
aposentar com 58 anos e 36 anos
de trabalho. Uma mulher, com 62
anos e 30 anos de trabalho.
Como Oliveira acha que o ganho para postergar a aposentadoria é pequeno, na prática vai
haver uma perda abrupta para
quem se aposentar, sem um regime de transição para atenuá-la.
Ele acha que a fórmula foi uma
conta feita de trás para a frente:
desenhou-se o fator de forma a
chegar à economia desejada.
O pior é que, apesar de implicar
uma perda, o novo regime não
vai estabilizar o déficit tão cedo.
Sua projeção é que, pelo regime
anterior, o déficit do INSS seria
de 5% do PIB em 30 anos. Pelo
novo regime será de 2,3% do PIB,
um ganho expressivo, mas continuará crescente.
Ele reconhece que não é fácil
encontrar uma solução para o estoque de benefícios passados. Na
proposta do grupo de Resende, os
indivíduos podiam optar por
quanto contribuir para o INSS e
quanto para o sistema privado.
Bom para o contribuinte, mas
haveria uma perda de arrecadação, pois seria previsível uma saída expressiva do INSS.
Imaginou-se cobrir esse rombo,
em parte, pela ampliação no universo de contribuintes e, em parte, com recursos de privatização.
Restaria, contudo, uma conta
equivalente a uma vez e meia do
PIB a ser paga em 50 anos e isso
implicaria um aumento, a curto
prazo, na relação dívida líquida/
PIB.
A longo prazo, o sistema estaria
equilibrado, já que partia do
princípio de capitalização. Chico
Lopes, então diretor do Banco
Central, vetou a idéia, pelo impacto negativo de curto prazo sobre a relação dívida/PIB, embora
o FMI, pelo que se sabe, apoiasse
a reforma.
E-mail: CelPinto@uol.com.br
Texto Anterior: Orçamento: 3,7 mil aderem ao programa federal de demissão voluntária Próximo Texto: Questão social: FMI se exime de responsabilidade sobre corte de cestas para pobres Índice
|