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São Paulo, quinta-feira, 20 de fevereiro de 2003

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CELSO PINTO

A prioridade é a Previdência

A prioridade absoluta do governo é aprovar a reforma da Previdência. Forçar a aprovação rápida da autonomia do Banco Central poderia provocar um racha no PT, e isso poderia prejudicar a tramitação da reforma da Previdência. Por essa razão, é provável que a autonomia do BC fique mais para frente.
Há claras indicações de que, se isso acontecer, não haverá grandes problemas com o FMI. Embora o Fundo defenda a autonomia do BC, sabe que o ajuste da Previdência é muito mais relevante. O governo acha que há desinformação no PT sobre a questão da autonomia e espera reverter as resistências com seminários e discussões no Congresso.
O ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, tem dito que quer um acordo "minimalista" com o FMI, que mencione apenas metas quantitativas. É improvável que o Fundo aceite uma mudança no formato do acordo, que inclui uma descrição das intenções de política econômica do governo.
Um ponto, contudo, é negociável. No acordo do ano passado, a aprovação da mudança no PIS, incluída na MP 66, foi incluída como "meta estrutural". Se não fosse aprovada, o governo teria que se explicar. Quem sugeriu a inclusão como meta, no entanto, foi o próprio governo brasileiro, que previa uma aprovação tranquila. O Fundo, pelo que se sabe, poderia aceitar um acordo sem metas estruturais de política econômica, embora as intenções do governo devam constar da carta de intenções.
O desenho das reformas é irrelevante. No caso da Previdência, não importa se o novo regime será ou não unificado, e sim que seja equilibrado. Há concordância que deve-se lutar pela aprovação do projeto de lei complementar (PL-9) que iguala o regime dos novos servidores ao do INSS e cria a previdência complementar.
Na verdade, não existe um, mas vários problemas associados à Previdência, como mostrou um dia de debates entre alguns dos maiores especialistas no tema promovido pelo mercado financeiro, na sexta-feira, em São Paulo. Há um déficit elevado (5,5% do PIB) e crescente. O sistema é desigual no tratamento entre indivíduos e gerações. Deixa de fora 40 milhões de trabalhadores informais. Tem a carga mais alta da América Latina e a segunda da OCDE.
O ideal seria uma solução que resolvesse tudo e, de quebra, ajudasse a estimular a poupança financeira. Para o mercado, a resposta é ressuscitar propostas de capitalização: cada um passaria a ter sua previdência privada e receberia conforme a contribuição. A idéia foi examinada e afastada em 97 pelo custo da conta dos que já se aposentaram e do que já se recolheu no sistema atual, estimada de 1,5 a 2 vezes o tamanho do PIB.
Carlos da Costa, do Ibmec, refez as contas considerando o impacto do fator previdenciário e chegou a números mais palatáveis. Conforme o novo teto que se crie, a transição poderia custar 43% do PIB, ou uns 2,5% do PIB ao ano durante 20 anos iniciais. Não houve consenso. Vários economistas duvidaram da viabilidade fiscal dos custos da transição e se haveria aumento real da poupança privada, ou apenas mudança de composição. O ministro do Trabalho, Ricardo Berzoini, acha que a idéia tem pontos controversos e é difícil de vender politicamente.
Várias outras idéias foram apresentadas, mais em linha com as propostas do governo. O ex-ministro da Previdência José Cechin acha que a chave é defender o princípio de que a previdência é um seguro, não uma assistência. O fator previdenciário, já aplicado no INSS, é um tipo de capitalização, pois considera a média das contribuições, não o salário final e fatores atuariais para estimular quem se aposentar mais tarde. Se aplicado aos servidores, poderia equilibrar o sistema evitando o custo de transição, com a vantagem de depender de lei ordinária. Fábio Giambiagi, do BNDES, foi na mesma direção e acrescentou a importância de desvincular o reajuste da previdência do salário mínimo.
Cechin sugere separar da previdência a parte assistencial (que ele reuniria num benefício único), o que permitiria baixar a carga cobrada aos empregadores, desestimulando a informalidade. Mesmo princípio defendido por Raul Velloso e Marcelo Moraes. Velloso acha que o centro do problema está nos 250 mil servidores que viraram estatutários depois de 91 e se aposentaram sem ter contribuído com os 11% recolhidos pelos outros servidores. A forma de financiar a transição para um novo regime seria cobrar a mais desse contingente.
O jurista Ives Gandra Martins acha que há boas chances de o governo obter uma ação declaratória de constitucionalidade para cobrança de inativos, se sugerir alíquotas inferiores a 11%, o que descaracterizaria a idéia de "confisco" que levou à decisão contrária do Supremo. Três ministros do STF se inclinam a favor, segundo Martins, e três novos serão nomeados pelo atual governo em maio.
Como se vê, não há consenso nem soluções únicas simples que resolvam todos os problemas. Mas há margem para mudanças importantes.

E-mail: CelPinto@uol.com.br


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