São Paulo, sábado, 20 de março de 2004

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OPERAÇÃO PANDORA

Segundo a polícia, Mellão dizia ter influência em CPI para livrar investigados e extorquir políticos e doleiros

PF prende ex-presidente da Câmara de SP

Marlene Bergamo/Folha Imagem
Armando Mellão Neto chega ao IML para exame de corpo de delito


FABIO SCHIVARTCHE
PEDRO DIAS LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL

O ex-presidente da Câmara Municipal de São Paulo Armando Mellão Neto, 42, foi preso em flagrante ontem num flat no Itaim Bibi, bairro de elite de São Paulo, sob a acusação de extorquir dinheiro do ex-deputado estadual Reynaldo de Barros Filho (PP).
Mellão foi detido em uma operação da Polícia Federal ao negociar o recebimento de um envelope com R$ 581.400. O dinheiro foi entregue pelo advogado de Reynaldo Filho, Laércio Benko Lopes.
Pelas investigações da PF, que começaram há 40 dias, Mellão dizia falar em nome de congressistas da CPI do Banestado -que apura remessas ilegais de dinheiro ao exterior- e afirmava que podia barrar investigações em troca de dinheiro. No jargão policial, "vendia fumaça": negociava um poder que não tinha. Segundo a polícia, o esquema de Mellão funcionava havia um ano.

Pitta
Apenas no caso de Reynaldo Filho, a negociação total girava em torno de US$ 2,4 milhões. Outra vítima, segundo a Folha apurou, foi o ex-prefeito Celso Pitta (PSL-SP), que não teria pago. Procurada, sua assessoria não respondeu até o fechamento desta edição.
Os três parlamentares citados pelo ex-vereador como seus interlocutores na CPI -os deputados José Mentor (PT-SP) e Rodrigo Maia (PFL-RJ) e o senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT)- negam qualquer envolvimento.
Com prisão temporária decretada, Mellão nega a extorsão. "O que mais dói nisso é saber que foi uma armação", afirmou.
Instalada em junho do ano passado, a CPI do Banestado encontrou uma conta de Pitta em um banco norte-americano, aberta em 1994 com US$ 110 mil. O ex-prefeito sempre negou -e continua negando- ter a conta.

Padrinho político
No caso que se tornou público ontem, os figurantes giram em torno da era Maluf-Pitta à frente da Prefeitura de São Paulo (1993-2000). O pai de Reynaldo Filho, Reynaldo de Barros, foi um dos secretários mais influentes da gestão malufista. Mellão começou na política pelas mãos do ex-secretário, mas os dois estavam rompidos desde 98. Armando Mellão presidiu a Câmara Municipal no auge do escândalo da Máfia dos Fiscais (1999-2000), que terminou até com vereadores cassados.
O trabalho da PF que culminou na prisão de Mellão começou em janeiro, depois que o deputado Mentor foi procurado por advogados ligados a pessoas que estavam sendo extorquidas por Mellão. A pedido do petista, o Ministério da Justiça determinou a entrada da PF no caso. A investigação, denominada "caixa de Pandora", durou dois meses, gravou fitas de vídeo e grampeou ao menos 50 telefonemas.

Colaboração
Um dos protagonistas da investigação foi o advogado de Reynaldo Filho, Laércio Benko Lopes. Ele passou a colaborar com os policiais logo que os grampos da PF no celular de Mellão apontaram seu cliente como uma das vítimas.
Foi o advogado quem armou, em conjunto com a PF, a cena para a prisão de Mellão. Duas microcâmeras colocadas pelos policiais no quarto do flat -alugado por Lopes- gravaram toda a negociação, ontem de manhã.
Em um envelope em cima da mesa havia um cheque de Reynaldo Filho no valor de R$ 531.400, nominal a Mellão, e mais R$ 50 mil em dinheiro, divididos em cinco maços de notas de R$ 100.
Depois do acerto financeiro, Mellão ainda fez um pedido ao advogado: "Laércio, você ficaria muito enrolado se eu pedisse para você só ir comigo até o carro para levar o dinheiro agora?". A conversa está gravada em vídeo, em poder dos investigadores.
A PF não divulgou ainda as outras provas que diz ter das chantagens praticadas por Mellão. Suspeita-se que pelo menos outras 11 pessoas estivessem sendo vítimas dele. A polícia espera que nos próximos dias outros achacados por Mellão deponham no processo.

Abafar Waldomiro
O advogado Laércio Benko Lopes lembra-se dos métodos de chantagem utilizados -envelopes apócrifos com falsas denúncias, como contas inexistentes no exterior- e um dos argumentos utilizados por Mellão para convencê-lo a pagar a propina.
"Ele dizia que a prisão de Reynaldo Filho seria boa para abafar o caso Waldomiro Diniz na imprensa", conta Lopes.


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