São Paulo, sexta, 20 de março de 1998

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CONGRESSO
Deputado federal é flagrado votando no lugar de amigo ausente
Câmara abre processo de cassação contra "pianista"

Reprodução/Folha Imagem
O deputado José Borba no momento em que votava pelo seu colega


LUIZA DAMÉ
DENISE MADUEÑO
da Sucursal de Brasília

A Câmara dos Deputados abriu ontem processo de cassação dos mandatos dos deputados José Borba (PTB) e Valdomiro Meger (PFL), ambos do Paraná, por falta de decoro parlamentar. Borba foi flagrado votando por Meger na sessão de votação da reforma da Previdência, anteontem à noite.
Em nota oficial, Borba assumiu a culpa dizendo que praticou "o ato espontaneamente". A Folha apurou que Borba atendeu pedido de Meger para votar por ele.
O presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), disse que pediu a cassação deles porque não haveria forma de Borba votar por Meger sem conhecer sua senha.
A prática de "pianismo" (quando um parlamentar vota por outro ausente) ficou provada em três das seis votações ocorridas na sessão.
Meger já estava em Maringá (PR) quando a Câmara votava a reforma. Candidatos à reeleição, os deputados ficarão impossibilitados de concorrer por oito anos caso percam o mandato.
O líder do PTB, Paulo Heslander (MG), afirmou que vai apoiar a cassação do deputado. "Lamento muito. Ele é um ótimo deputado e companheiro. Aparentemente, as provas são irreversíveis", disse.
Borba surpreendeu Heslander ao chegar a seu apartamento ontem às 8h, ainda usando pijama, para consultá-lo sobre a seriedade de seu ato.
Denúncia
As executivas do PFL e do PTB vão se reunir na próxima semana para examinar a expulsão dos deputados. "Em qualquer dos casos, o processo deverá ser breve, mas não sumário", afirmou Heslander.
A fraude foi comprovada pelo cruzamento da ordem do registro dos votos dos parlamentares com imagens da TV Câmara. O flagrante foi possível porque Temer recebeu a denúncia de um parlamentar durante a sessão.
Segundo deputados que estavam presentes, a denúncia teria sido feita pelo deputado Odílio Balbinotti (PSDB-PR). "A obrigação de cada parlamentar é fiscalizar a votação", disse, sem negar ou confirmar a autoria da denúncia.
Os mesmos parlamentares disseram que Balbinotti queria atingir o deputado Ricardo Barros (PPB-PR), que seria o "pianista"."Balbinotti tentou me incriminar", disse Barros, reconhecendo ser o alvo da acusação.
Balbinotti, Borba, Meger e Barros disputam votos em Maringá.
As gravações da TV Câmara mostram Borba votando em postos avulsos, enquanto no painel o voto é computado para Meger.
Nos dois primeiros momentos, Borba registra os votos em locais distintos. Por volta de 18h30, ele aparece votando no posto avulso 4, entre os deputados Antonio Joaquim (PSDB-MT) e Fernando Diniz (PMDB-MG).
Ele observa o líder do governo, Luís Eduardo Magalhães (PFL-BA), votar e olha o movimento ao redor do posto.
Em outra imagem, Borba aparece se dirigindo ao posto 2. Antes de votar, o deputado esbarra no líder do PFL, Inocêncio Oliveira (PE). Borba registra o voto entre os deputados João Mendes (PPB-RJ) e Arnon Bezerra (PSDB-CE).
No último flagrante, Borba nem sequer se preocupou em mudar de posto ou bancada. Ele registra dois votos seguidos no posto 4. A fita mostra que ele saiu tranquilamente e foi conversar com o deputado Marcos Lima (PMDB-MG).
O nome de Meger aparece em outros dois registros no painel eletrônico que não foram acompanhados pelas câmeras. Um na lista de presença (de 14h até 17h32) e outro na votação da reforma.
Nos dois casos não se pôde provar quem votou -se Meger, Borba ou uma terceira pessoa.
A decisão de pedir a cassação foi tomada pela Mesa da Câmara em reunião pela manhã. A fita com os flagrantes foi exibida na reunião.
O relator do processo de cassação na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), etapa preliminar, será escolhido na terça-feira.
Temer anunciou a decisão na sessão de ontem. "É um fato lamentável para todos nós. Em uma corporação de 513 deputados pode haver um ou outro que cometa um delito, mas isso não pode macular a imagem da Casa", disse.



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