São Paulo, domingo, 20 de outubro de 2002

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SEGUNDO TURNO

Beneficiários de programas da administração petista, incluindo crianças de 7 anos, têm recebido correspondência

PT pede voto a cadastrados da Prefeitura de SP

GABRIELA ATHIAS
DA REPORTAGEM LOCAL

O PT está pedindo voto, por meio de cartas, a pessoas cadastradas em programas sociais, habitacionais e educacionais da Prefeitura de São Paulo, administrada pela petista Marta Suplicy. Até criança de 7 anos recebeu esse tipo de correspondência.
O coordenador de comunicação do PT no Estado, Marcos Silva, nega que o partido tenha utilizado o cadastro da prefeitura para endereçar as cartas. Diz que os beneficiados pelos programas de Marta também fazem parte de cadastros de movimentos sociais ligados ao PT. No entanto ele não diz que organização tem uma lista em que os titulares são crianças.
A Folha apurou que o Diretório Nacional do PT pagou, em setembro, aos Correios, R$ 272,6 mil, referentes ao contrato de nš 7220104900, para remeter as cartas de pedido de voto. Entretanto esse contrato pode incluir outros tipos de correspondência.
A Secretaria da Educação, por meio da assessoria de imprensa, informa que os dados das crianças são tratados de forma reservada, pois os pais desses menores, ao fornecê-los às escolas, não assinaram nenhum tipo de documento, autorizando a divulgação.
Perueiros -do programa de transporte escolar da prefeitura- e diretores de escola também têm acesso aos dados. Já o cadastro dos beneficiários dos programas sociais (Renda Mínima, Bolsa-Trabalho e Começar de Novo) ficam na Prodam, a Companhia de Processamento de Dados da prefeitura. Quem acessa os dados tem a senha registrada no sistema.
As cartas enviadas pela prefeita -cuja produção e postagem foram pagas pelo diretório nacional do PT- usam três tipos de mote para pedir voto: educação, habitação e complementação de renda.

Os programas
O Vai-e-Volta é o programa de educação. Oferece transporte escolar a 72 mil estudantes que moram a mais de dois quilômetros da escola. Também distribuiu uniformes a 800 mil estudantes e material escolar a 925 mil.
As cartas a mutuários referem-se à anistia da dívida de 47 mil pessoas com a Cohab (Companhia Metropolitana de Habitação de São Paulo) e a obtenção de 51 mil escrituras definitivas.
Os programas sociais de complementação de renda beneficiam jovens, desempregados e famílias pobres com filhos na escola.
O Renda Mínima paga, em média R$ 120, a 178 mil famílias que tem filhos menores de 14 anos na escola. Os valores pagos variam de R$ 20 a R$ 220. O cálculo é feito de forma a assegurar a cada membro da família uma renda mensal próxima de meio salário mínimo.
Os R$ 146 do Bolsa-Trabalho vão para 34 mil jovens de 16 a 20 anos que frequentam cursos de capacitação para entrar no mercado de trabalho. O Começar de Novo é voltado para desempregados com mais de 40 anos. Enquanto frequentam cursos de capacitação, recebem R$ 189 mensais. Beneficia 36 mil pessoas.
Os programas -especialmente os de complementação de renda e o Vai-e-Volta- são usados com frequência nos programas eleitorais do presidenciável Luiz Inácio Lula da Silva e de José Genoino ao governo do Estado de São Paulo.
"A Marta fez uma coisa fantástica em São Paulo. A Marta acabou de dar em São Paulo 1 milhão de uniformes para meninos e meninas", disse Lula em seu programa da última quarta-feira. Já Marta apareceu duas vezes esta semana no programa de Genoino falando do tema. Até se "assustou" com o beijo "espontâneo" de uma criancinha vestida com o uniforme recebido no Vai-e-Volta.
A Folha contatou um grupo de pessoas do mesmo bairro (Jardim São Luiz, zona sul da capital) que receberam todos os tipos de carta.
As destinatárias das cartas sobre o Vai-e-Volta têm filhos matriculados na rede municipal. É o caso da dona-de-casa Rosana Custódio. A mãe dela, Anice Custódio, recebeu a carta que tem como mote os programas sociais. Em novembro do ano passado, ela se inscreveu no programa Começar de Novo, mas ainda não foi chamada. Quando recebeu a carta, Anice, analfabeta, chegou a pensar que tivesse sido contemplada.
A menina de 7 anos que teve a carta endereçada em seu nome está na pré-escola também mora no Jardim São Luiz. Outro vizinho, Benício Rodrigues dos Santos, recebeu a carta que cita como exemplo de eficiência da gestão municipal a a anistia concedida pela Cohab. A presidente da associação dos moradores, Maria Cícero Mineiro da Silva, disse que ele foi beneficiado pelo programa. Na casa para a qual a carta foi endereçada (da Cohab) moram hoje a ex-mulher e os filhos de Santos.
O nome de Marta Suplicy está impresso como remetente de todas as cartas. Nelas há a fotografia de Lula, Genoino e do candidato eleito ao Senado, Aloizio Mercadante e da prefeita.
As cartas recebidas pelos moradores do São Luiz foram parar nas mãos do corregedor eleitoral de São Paulo, desembargador Álvaro Lazzarini. É que as lideranças desse bairro são ligadas ao PSDB e denunciaram o que consideram o "uso eleitoreiro" de programas sociais. O advogado Ricardo Penteado, da coligação "São Paulo em boas mãos" (PSDB-PFL-PSD), protocolou um pedido de Investigação Judicial Eleitoral no TRE.
Para o advogado Torquato Jardim, a prefeitura não está cometendo crime eleitoral, já que os custos de produção e postagem foram arcados pelo PT: "Se não há lei vedando a utilização das informações, não há problema".


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