São Paulo, domingo, 20 de outubro de 2002

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GOVERNADOR

Voto família

Filhos dos candidatos a governador de São Paulo passariam despercebidos entre os milhões de jovens de classe média

MARILIZ PEREIRA JORGE
DA REVISTA DA FOLHA

Não fossem os sobrenomes, os filhos dos dois candidatos que disputam o governo de São Paulo poderiam passar despercebidos entre os milhões de jovens brasileiros no fim ou recém-saídos da adolescência. Com idades entre 17 e 22 anos, os herdeiros de Geraldo Alckmin (PSDB) e José Genoino (PT), três de cada lado, levam uma vida típica de classe média: cortam o cabelo no salão do bairro desde criança, andam de carro popular (os que têm), economizam dinheiro para baladas, vão ao cinema nos fins de semana e sonham com viagens.
Os mais velhos trabalham para ter o próprio dinheiro, caso de Sophia e Geraldo Alckmin Neto e de Miruna Genoino. Os mais novos recebem mesadas e aí o petista é mais mão-aberta que o tucano: Ronan e Mariana Genoino ganham, respectivamente, R$ 350 e R$ 120 por mês; Thomaz Alckmin, R$ 100. "Meus irmãos me dão uma força quando preciso de um extra no orçamento", explica o caçula do governador.
Thomaz e Geraldo só ganharam quartos individuais no ano passado, quando a família se mudou para o Palácio dos Bandeirantes, mas continuam dividindo o guarda-roupa e até o vidro de perfume, o clássico Azarro. Nem o pai escapa dos empréstimos. "Desde que comecei a trabalhar no banco, uso terno, camisa, gravata e até meias dele", conta Geraldo.
Na família Alckmin, o perfil de consumidor de elite se resume a Sophia, que veste roupas de grife, frequenta restaurantes da moda e faz viagens internacionais frequentes. Tudo, ela gosta de ressaltar, bancado com o salário que recebe na Daslu, onde trabalha há três anos. Ela não revela, mas calcula-se que uma vendedora receba ali cerca de R$ 8.000. "Trabalho para viajar. Já conheço Roma, Paris, Turquia e Grécia", diz.
Sorte dela. O máximo a que seus irmãos "despossuídos" conheceram foi Paraguai e Argentina, numa viagem familiar "esticada" de Foz do Iguaçu. "Todo mundo acha que filho de governador tem dinheiro, mas a gente nunca foi rico. Você acha que tenho uma moto velha porque quero? Quem gosta de moto velha é colecionador", brinca Thomaz.
No clã Genoino, a mais velha, Miruna, também trabalha, mas o salário de professora de escola infantil não permite tantos vôos. Ela passa férias na casa de uma tia em Ubatuba, já fez um mês de intercâmbio na Inglaterra e se prepara para passar um ano na Espanha, seu "presente de formatura". Ronan, por enquanto, só foi à Disney por 15 dias; Mariana, nem isso.
No fim de semana, o programa é cinema. Tanto Thomaz Alckmin como os Genoino frequentam o mesmo, no shopping Villa Lobos. "Dos que gosto, é o mais perto de casa. E tem uma livraria que meu pai adora", diz Miruna.
A vida da família petista está concentrada no entorno do Butantã, onde moram em um sobrado de três quartos. Eles fazem compras no Carrefour e no sacolão Oba, frequentam a piscina da USP e cortam o cabelo "com a Fátima", no salão Maestrus (R$ 20 o feminino, R$ 10 o masculino).
A rotina dos Alckmin mudou desde 2001, quando se mudaram do três dormitórios que ocupavam no Morumbi para o Palácio dos Bandeirantes. "O apartamento em que a gente morava é do tamanho da sala daqui", compara Thomaz, na ala residencial do palácio. Hoje, o convívio é mais rarefeito. "Eu, no meu quarto, falava com meu pai na sala, ou com minha irmã no quarto dela. Agora, tem dias em que a gente nem se vê, mesmo morando junto."
No sobrado ou no palácio, os conflitos com os pais também são típicos de jovens de classe média. Sophia leva broncas porque deixa o quarto bagunçado, Ronan foi "enquadrado" pela mãe quando quis dormir fora sem avisar, Geraldo Neto escondeu do pai um olho roxo, e Mariana ganhou reclamações depois que colocou um piercing no umbigo.
"Piercing? O que é isso?", estranhou Genoino, quando a filha contou que tinha colocado o enfeite em uma viagem ao Nordeste. "Sempre quis fazer, mas minha mãe era contra. Em Porto Seguro, não precisava de autorização e eu aproveitei", conta a caçula, que sofreu por causa de uma infecção, mas exibe orgulhosa o resultado.
Mariana é fruto de uma relação extraconjugal de Genoino com a enfermeira Maria Goretti de Lima, 48, uma amiga de juventude em Fortaleza, que ele reencontrou anos depois em Brasília. Ela foi reconhecida, sempre teve contato com o pai e sabia que ele tinha uma família em São Paulo. O ramo paulista da família, porém, só soube de sua existência em 1999, por iniciativa de Genoino.

Broncas
Graças às dimensões do Palácio dos Bandeirantes, Geraldo Neto conseguiu evitar o pai por dois dias e adiar um pouco a última grande bronca que levou. "Mas uma hora não teve jeito. Ele viu meu olho roxo, que ganhei em uma briga por uma menina. Ficou muito bravo por causa da briga e mais bravo porque escondi."
Exceção feita às broncas pontuais, os Alckmin e os Genoino dizem não ter do que reclamar. Nunca tiveram, por exemplo, horário para voltar das baladas. "Defendo uma educação libertária, baseada em muita conversa", define Genoino. "Não sou do tipo controlador", diz Alckmin, que adota uma linha "um pouco mais dura" apenas com Sophia. "Ele morre de ciúme de mim", diz a garota. "Às vezes, estou no telefone do meu quarto, ele entra e fica enrolando para saber com quem estou falando. Mexe na estante, abre um livro, pega chocolate na gaveta e vai embora curioso."
Recentemente, Sophia despertou a curiosidade geral, inclusive do filho do "concorrente", Ronan Genoino. Entrevistado antes que ela, o caçula petista fez uma encomenda à repórter: "Pergunta se ela está namorando o Kaká [jogador do São Paulo"". "Não, somos só amigos. Já vieram me dar parabéns por ter conquistado ele, mas não tenho interesse", jura Sophia.
Na casa dos Genoino, se existe um "queridinho", é Ronan. "Acho que é a síndrome do filho mais novo. Sempre fui saidinha, dormia na casa de amigas desde cedo. Quando o Ronan chegou ao colegial, meus pais sofreram porque ele começou a sair, mas eles ainda o viam como uma criança", diz Miruna, batizada pela mãe com o nome de uma rua do bairro de Moema. "Estava na Paulista, quando passou o ônibus "Aeroporto - via Miruna", me encantei com o nome", conta Rioco.
Os herdeiros nem vacilam na hora de defender o voto nos respectivos pais, mas a fidelidade partidária acaba quando o assunto é futebol. Na casa do santista Alckmin, Geraldo Neto e Thomaz são corintianos; na do corintiano (roxo) Genoino, Miruna é da Fiel, mas Mariana e Ronan torcem para o tricolor, time de Sophia.


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