São Paulo, domingo, 20 de outubro de 2002

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PRIVATIZAÇÃO

13 milhões saem da fila do telefone; celular vira pop

Privatização da Telebrás, em 1988, eleva em 287% número de aparelhos móveis, que chegam até a classe D; universalização leva telefones fixos a aldeias indígenas, mas hoje 10 milhões de linhas encalham nas operadoras, que sofrem com inadimplência

HUMBERTO MEDINA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A maior e mais polêmica privatização da história do país -a do Sistema Telebrás, que envolveu R$ 22 bilhões e acusações de favorecimento do governo a grupos privados- permitiu a multiplicação dos serviços de telefonia no Brasil e criou um novo símbolo de consumo: o celular.
Se desde julho de 1998, data do leilão da Telebrás, o número de telefones fixos instalados no país mais que dobrou, o de celulares cresceu 287%, chegando aos 30 milhões de aparelhos neste ano.
A taxa chega a 3.487% se a comparação for feita com o período pré-FHC, quando um celular custava de R$ 1.300 a R$ 2.000 no mercado paralelo e, só na fila oficial da antiga Telesp, 250 mil pessoas esperavam por um aparelho.
Os valores atuais explicam como um bem antes restrito a poucos privilegiados se espalhou entre as classes B, C e D. Hoje, por cerca de R$ 100, é possível comprar um aparelho, já com a linha no sistema pré-pago (cartão), que domina 68% do mercado.
Numa conta feita em 2000, o Brasil, então com 23 milhões de celulares, superava o Canadá (8 milhões) e a Argentina (6 milhões). Nos Estados Unidos, havia 110 milhões de celulares.

Modelo
O planejamento para o ingresso da iniciativa privada no setor -ou, como dizem os especialistas, o modelo da telefonia- ajuda a entender o avanço dos números.
O modelo se baseou em três objetivos principais: universalização dos serviços, maximização do preço de venda (em razão das dificuldades de caixa do governo, que ainda persistem) e competição. Foi prevista ainda a criação de uma agência reguladora, a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações).
Há críticas à atuação da Anatel, ameaças à solidez da competição no setor e dúvidas a respeito do futuro do modelo, mas é certo que os dois primeiros objetivos foram cumpridos.
Para garantir a universalização, foram incluídas metas contratuais de instalação de telefones. A competição seria garantida com as limitações às fusões, e a maximização do preço de venda, com a divisão das áreas de concessão.
Como forma de incentivar a instalação de telefones, o modelo previa um bônus para quem antecipasse o cumprimento das metas contratuais de universalização de 2003 para 2002.
Isso gerou investimentos concentrados das operadoras. O objetivo era se beneficiar da antecipação da possibilidade de competir fora de sua área original de concessão, prestando serviços locais, de longa distância e de ligações internacionais.

Telefonia fixa
Os números são eloquentes também na telefonia fixa. Na época do leilão, existiam 13 milhões de pessoas nas filas do que era chamado então de plano de expansão. Essa era a demanda reprimida, que alavancou o preço das teles e provocou ágio médio de 63,74% em relação ao preço mínimo pedido pelo governo.
Hoje a situação se inverteu. Há 10 milhões de linhas de telefone fixo sobrando. As empresas foram obrigadas por contrato a fornecer telefones a quem pedisse e hoje enfrentam a inadimplência de quem não pode pagar as contas. Em 1998, em São Paulo, 5% das famílias da classe D tinham telefone fixo. Esse percentual subiu para 61% em 2001.
Os últimos números de comparação internacional da Anatel são de 2000. Naquele ano, apesar do aumento do número de telefones em serviço no Brasil, a Argentina continuava a ter, proporcionalmente, mais aparelhos. No Brasil, eram 18 telefones fixos para cada 100 habitantes. Na Argentina, 21.
Além do aumento no número de telefones, os contratos de concessão impuseram metas rigorosas de universalização (instalação de telefones seguindo critérios de localização geográfica e população), que levaram a telefonia fixa até a índios da Amazônia.

Valor
Quanto à maximização do valor, Fernando Xavier, presidente da Telebrás na privatização e atual presidente do grupo Telefônica no Brasil, diz que os investidores avaliaram a Telebrás por US$ 100 bilhões. "O governo vendeu 20% da ações por US$ 20 bilhões, o que significa que, na visão dos investidores, a Telebrás valia cinco vezes esse valor."
De acordo com Xavier, a privatização do Sistema Telebrás foi um sucesso. "Construiu-se em quatro anos o que não havia sido feito em décadas, fez-se o dobro. Não existe paralelo na história mundial."
A privatização significou também, para população de mais baixa renda, a possibilidade de acesso à telefonia fixa. "No sistema anterior, para conseguir um telefone, era preciso financiar a Telebrás, o que significava uma barreira ao acesso", explica Xavier.


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