São Paulo, domingo, 20 de outubro de 2002

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SEGUNDO TURNO

Sem-terra desconfiam de linha light do PT; ruralistas guardam imagem de candidato como guerrilheiro do Araguaia

Genoino desagrada a sem-terra e a ruralistas

EDUARDO SCOLESE
DA AGÊNCIA FOLHA,
NO PONTAL DO PARANAPANEMA

O atual discurso petista, concentrado na figura do candidato do partido ao governo paulista, José Genoino, tem desagradado e levantado uma série de interrogações tanto de fazendeiros como de sem-terra da região agrária mais conflitante de São Paulo -o Pontal do Paranapanema.
Na memória dos ruralistas, historicamente conservadores, ainda surge a imagem radical de Genoino ligada à guerrilha do Araguaia, da qual participou nos anos 70. Do lado dos sem-terra, a desconfiança de que a linha "light" do PT seja mantida após as eleições.
Na prática, em um eventual governo petista, os fazendeiros temem a invasão em massa das terras, enquanto os sem-terra nem querem ouvir falar da possibilidade de a ala radical do PT ser posta em segundo plano no Planalto.
Protagonistas de sequentes turbulências no Pontal, integrantes do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e lideranças da UDR (União Democrática Ruralista) são unânimes em apenas um ponto: o atual discurso petista é uma incógnita.
A excessiva colagem de Genoino na imagem do presidenciável Luiz Inácio Lula da Silva é o principal motivo desse elevado grau de desconfiança no Pontal (extremo oeste de SP) -palco rotineiro de saques, invasões e troca de tiros e onde parte das terras foi grilada no século retrasado.

Dúvidas no ar

Ao MST, no mês passado, caiu como uma ducha de água fria o fato de a coordenação da campanha presidencial petista ter ficado em cima do muro ao ser questionada se revogaria ou não a medida provisória que criminaliza as invasões de terra. Isso porque, no ano passado, o mesmo PT havia movido uma ação direta de inconstitucionalidade contra a MP.
Criada por FHC, a medida provisória proíbe por dois anos as avaliações e vistorias em terras invadidas, exclui da reforma agrária os assentados que participarem de invasões e suspende todos os processos em tramitação.
"A MP foi criada para tentar nos parar. Mas o governo pode prender todas as lideranças do movimento, pois o povo vai à luta. Corre-se o sério risco de perder o controle no campo", disse Cido Maia, da coordenação estadual do MST.
Segundo a UDR, o temor de eventuais governos petistas nos âmbitos nacional e estadual rondam o dia-a-dia dos fazendeiros do oeste paulista.
"O discurso do PT mudou às vésperas das eleições, e eu não acredito que o Lula e o Genoino tenham mudado de idéia. Hoje existe um temor dos fazendeiros", disse Luiz Antônio Nabhan Garcia, presidente estadual da UDR.
Já Genoino se defende e diz que seu "poder de negociação" evitará os conflitos. "Não vou ser refém de fazendeiros nem de sem-terra. Vou me antecipar e negociar."
Para o geógrafo Bernardo Mançano Fernandes, professor da Unesp e autor de trabalhos sobre a questão agrária no Pontal, um eventual governo petista terá de criar imediatamente na região um sistema de reforma agrária no qual o número de famílias beneficiadas seja maior do que a demanda do MST. "[Para evitar novos conflitos" o PT tem que assentar mais rápido do que a capacidade que o MST tem de ocupar."

Propostas

As próprias propostas de Genoino trazem pontos de insatisfação às partes. Enquanto o PT disse que "qualquer proposta séria de desenvolvimento da região passa por reaver para o Estado as terras griladas" (motivo de irritação aos ruralistas), Genoino afirmou em seu programa eleitoral na TV que não vai permitir invasões e, se elas ocorrerem, "o governo vai garantir o cumprimento da lei" (ponto de desagrado aos sem-terra).
Para Almir Soriano, ex-presidente da UDR paulista, o temor é o de que um eventual governo petista no Estado não consiga impor um pulso firme na região diante dos anseios dos trabalhadores rurais. "Até ontem o Genoino era um guerrilheiro."
Soriano concluiu: "embora o discurso seja de respeito às regras, uma boa fatia do PT é de esquerda radical, como o MST. Se não houver pulso do Lula e do Genoino, haverá ondas de invasões com consequências desastrosas".
Para Cido Maia, eventuais governos petistas não modificarão a pauta do MST. "O PT tem sua linha, e nós temos a nossa. Não interferimos na linha deles, e eles não interferem na nossa."


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