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ANÁLISE
Números enganosos e consenso oculto
GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Para Luiz Inácio Lula da Silva, os juros atuais do Banco
Central são a metade da taxa fixada ainda anteontem. Para
Geraldo Alckmin, os petistas
que aparelham a máquina do
governo federal somam o dobro das vagas disponíveis.
Os dois números falsos mais
evidentes de um festival de números enganosos declamados
pelos dois candidatos servem
para sintetizar o debate de ontem. Lula, como de hábito, a
exagerar os feitos de seu governo; Alckmin, que desta vez deixou as acusações de corrupção
em segundo plano, a exagerar
os defeitos do adversário.
No mundo do petista, a Selic,
a taxa do BC, já caiu a 6,85%.
Alckmin não aproveitou para
lembrar que a taxa está em
13,75%. Preferiu falar dos 40
mil companheiros de Lula supostamente empregados no governo. O presidente-candidato
não perguntou como alojar
tanta gente em 20 mil cargos de
livre provimento existentes.
O rosário de cifras nem sequer primava pela originalidade. Lula voltou a dizer que investiu R$ 10 bilhões em saneamento, dado utilizado no debate anterior e já desmentido pela
Folha. Alckmin tentou ser
mais claro ao tratar de um suposto corte de R$ 1,6 bilhão nas
verbas para a saúde, tema que
já havia mencionado na Bandeirantes -e que não passa de
uma antiga discussão legislativa sobre o que deve ser considerado gasto em saúde ou não.
Sem ouvir um ao outro, os
oponentes priorizaram repetir
à exaustão os bordões ensaiados para o evento. "Nunca antes neste país foi feito tanto",
disse Lula sobre praticamente
todos os temas abordados.
"Nós somos diferentes", dizia o
tucano no início de quase todas
as suas intervenções.
Curiosamente, porém, o candidato inédito e o candidato diferente se acusaram pelas mesmas coisas: baixo crescimento,
aumento da carga tributária,
escassez de investimentos, desemprego, piora na segurança
pública, crise na educação e na
saúde. Noves fora os dados errados de lado a lado, ambos tinham razão: as gestões tucana
e petista padeceram de males
muito semelhantes.
PT e PSDB têm, hoje, diagnósticos também muito semelhantes para as áreas econômica e social, que se tornaram,
porém, pretextos para ataques
recíprocos no debate. Os dois
partidos entendem que o crescimento econômico é insuficiente, que os gastos permanentes do governo devem ser
reduzidos, que a carga tributária não pode aumentar mais e
que os programas sociais devem ter foco nos mais pobres.
Esse quase consenso entre os
dois grupos políticos que encabeçaram as disputas nas últimas quatro eleições presidenciais é inédito desde a redemocratização -e, no entanto, fica
escondido sob perguntas-acusações sobre gastos com juros
ou intenções de privatizar.
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