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São Paulo, quinta-feira, 20 de novembro de 2003

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QUESTÃO AGRÁRIA

Acordo com cúpula do MST visa evitar invasão de prédios públicos durante a marcha dos sem-terra a Brasília

Planalto troca audiência com Lula por trégua

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O Palácio do Planalto e a cúpula do MST fizeram um acordo para evitar invasões de prédios públicos nesta semana, quando trabalhadores rurais sem-terra chegaram em marcha a Brasília.
Pelo acordo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva receberá, provavelmente amanhã, um grupo dos sem-terra, desde que cumprida a promessa de civilidade no protesto. Se houver invasão ou avaria a prédio público, Lula avisou que cancelará a audiência.
Há cerca de 2.000 sem-terra acampados em Brasília desde anteontem, quando chegaram as primeiras levas de trabalhadores que vieram protestar na marcha organizada pelo Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo.
Esse fórum, composto por diversas entidades, é liderado pelo MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura) e CPT (Comissão Pastoral da Terra).
A Folha apurou que o acordo para evitar invasão ou dano a prédio público foi negociado diretamente com o MST, movimento com método de ação tradicionalmente mais radical do que a Contag e a CPT -esta uma entidade da Igreja Católica.
A negociação foi conduzida pela Casa Civil, chefiada pelo ministro José Dirceu, e pelo Gabinete da Segurança Institucional, comandado pelo general Jorge Armando Félix. Os dois ministérios, lotados no Palácio do Planalto, desejam evitar a imagem de desordem e de eventual descontrole sobre os movimentos sociais.
Em troca, foi oferecida a audiência com Lula e um pacote de atenção política, com encontros com ministros e dirigentes petistas, para facilitar a negociação da reforma agrária com o governo.
Lula foi informado da negociação, que obedece à sua estratégia de manter boas relações com o MST. O presidente avalia que não tem como controlar o movimento, hoje muito dividido e com lideranças regionais capazes de organizar invasões sem autorização da cúpula nacional do MST.
Daí, a estratégia que explica a atenção que os ministros Miguel Rossetto (Desenvolvimento Agrário) e Luiz Dulci (Secretaria Geral) têm dedicado ao MST, bem como as missões de paz do presidente do PT, José Genoino.

Eleições à vista
Os moderados do PT, que somam 70% do partido e que são a base de Lula para controlar os próprios radicais petistas, têm reclamado em reuniões internas da legenda da relação do governo com os movimentos sociais de modo geral e com o MST de forma particular.
Para os moderados do PT, uma boa relação com os movimentos sociais ajudará o partido a ter melhor desempenho nas eleições municipais de 2004.
Apesar de a retórica pública ser dura da parte do MST e de setores da Igreja Católica, que julgam "ridícula" e decepcionante as metas do novo Plano Nacional de Reforma Agrária, há margem para entendimento com o governo.
A Folha apurou que o MST, a Contag e a CPT avaliam que a melhor estratégia é pressionar Lula sem forte radicalização no campo, apesar de alguns movimentos mais radicais fugirem ao controle dessas entidades.
Na opinião de MST, Contag e CPT, se a reforma agrária está ruim com Lula, seria pior sem ele. No governo FHC, por exemplo, a atitude delas era muito mais dura, apesar de o ritmo de assentamentos da gestão Lula decepcionar MST, Contag e CPT. Em maio, Lula prometeu assentar 60 mil famílias sem terra neste ano. O próprio ministro Miguel Rossetto já admitiu dificuldade para atingir 30 mil famílias.

Segurança reforçada
Apesar do acordo para tentar evitar invasões, a segurança dos ministérios do Desenvolvimento Agrário e da Fazenda foram reforçadas. O ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, por exemplo, passou a maior parte do dia de anteontem despachando no Palácio do Planalto.
Quando teve de ir ao prédio da Fazenda, Palocci usou uma entrada secundária. Motivo: bem em frente à portaria principal havia uma aglomeração de trabalhadores rurais, e o ministro achou prudente não correr o risco de ser parado no meio do caminho.


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