São Paulo, quarta-feira, 21 de março de 2007

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Governo gasta R$ 2,4 bi em obras sem análise técnica

TCU mostra que Ministério das Cidades liberou 90% dos projetos sem avaliação prévia

Autorizações se referem a emendas parlamentares de 2003 a 2006; para o Tribunal de Contas da União, prática facilita superfaturamentos


MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O Ministério das Cidades liberou suas obras feitas a partir de emendas parlamentares sem fazer análise técnica preliminar dos pedidos feitos por deputados e senadores, abrindo a porta para irregularidades como superfaturamento e desvios. Essas obras somam 90% dos contratos assinados entre 2003 e outubro de 2006, totalizando R$ 2,4 bilhões.
A conclusão está em auditoria aprovada pelos ministros do TCU (Tribunal de Contas da União). Criação do governo Lula para concentrar ações e verbas para infra-estrutura urbana, saneamento e habitação, o ministério será um dos principais envolvidos com o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
Menos de um ano depois do escândalo dos sanguessugas -esquema de compra de ambulâncias superfaturadas por meio de emendas parlamentares-, o tribunal identificou na rotina do ministério um convite a irregularidades.
Lá, os repasses de dinheiro público seguem duas regras: com ou sem análise técnica preliminar, antes da assinatura dos contratos. Esse último caminho é reservado às emendas.
Por conta da visibilidade, as obras da pasta das Cidades são muito disputadas por parlamentares e encontram receptividade -a maioria (90%) daquelas contratadas é resultado de emendas parlamentares. No período da auditoria, foram objeto de seleção e análise prévia apenas R$ 148 milhões em obras -as que não foram solicitadas por parlamentares.
"Obras ligadas a emendas parlamentares são contratadas sem qualquer verificação preliminar do ministério", diz o texto. "Não existe qualquer avaliação por parte do ministério antes de se proceder a assinatura do contrato de repasse."
"Tais percentuais evidenciam que o processo de seleção de obras com base em critérios técnicos ganha ínfima importância com relação ao planejamento global da infra-estrutura urbana do país", critica.
O TCU determinou mudança nas regras dos contratos, cuja administração é delegada à Caixa Econômica Federal.
A auditoria relatada pelo ministro Ubiratan Aguiar determina que o primeiro passo de liberação de verbas para emendas -o chamado empenho, no jargão orçamentário- seja condicionado a uma avaliação técnica preliminar.
"O resultado deste modelo ineficiente traz as mais diversas situações usualmente apontadas por esta Corte de Contas: superfaturamento, obras inacabadas, atraso na disponibilização das obras à população beneficiária, destinação de recursos a intervenções desnecessárias ou não prioritárias, entre outros", diz o relatório.
A equipe de auditoria do TCU ouviu a pasta das Cidades durante a análise dos contratos e rejeitou seus argumentos. "Não há amparo legal que os desobrigue de proceder a avaliação técnica, mesmo quando o beneficiário e o objeto já estão definidos", dizem os auditores.
O TCU argumenta que a lei 4.320/64 determina que só seja feita dotação para uma obra após a análise do órgão competente -no caso, o ministério.
O ministério alega que já faz a análise numa fase intermediária -após a assinatura do contrato e antes do início das obras. O TCU contesta, cobrando uma avaliação da oportunidade e conveniência técnica das obras propostas por emendas antes da assinatura dos contratos. A análise atual, diz o TCU, é falha. "Verifica-se uma temerária ausência de controle por parte do órgão sobre as ações de governo a seu cargo."


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