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ELIO GASPARI
A aerocracia adiou a multa pelos atrasos
Nelson Jobim anunciou uma coisa, entregou outra e Solange Vieira, da Anac, fez o oposto
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A MINISTRA DILMA Rousseff precisa
marcar um almoço com o ministro da Defesa, Nelson Jobim, e
com a presidente da Agência Nacional de
Aviação Civil, Solange Vieira, para estudar a anarquia das medidas compensatórias oferecidas às vítimas dos atrasos das
empresas aéreas. Há método nela: protege a aerocracia. Em dezembro de 2007,
em meio ao caos instalado nos aeroportos, Jobim deu uma espetaculosa entrevista anunciando um plano de ressarcimento para as vítimas de atrasos e cancelamentos.
Em três meses, entraria em vigor uma
medida provisória determinando que a
empresa indenizaria o passageiro de
acordo com uma tabela progressiva que
chegaria ao equivalente a 50% do valor
do bilhete, caso o atraso fosse superior a
cinco horas. Se o voo fosse cancelado, a
empresa indenizaria a vítima no equivalente ao dobro do valor do bilhete. Na
ocasião, a doutora Solange chegou a prever o surgimento de "um mercado secundário dos créditos de atrasos".
Passou o tempo e nada. A medida provisória foi desidratada numa minuta de
projeto de lei, cuja tramitação no Congresso poderia levar anos. A tabela progressiva emagreceu e o teto baixou para
20% do valor do bilhete. Sumiu a indenização pelo cancelamento.
No último dia 12, dois anos depois do
anúncio de Jobim, Nosso Guia mandou
ao Congresso outro projeto, prevendo
uma indenização de 50% do valor da passagem para os casos de cancelamento
inadvertido, overbooking ou atraso superior a duas horas em voos curtos e quatro horas nos longos. (Um projeto que
tramita no Congresso desde 2004 é muito mais rigoroso, talvez até exagerado, e,
para o caso de overbooking, prevê uma
indenização no valor da passagem.)
Três dias depois, a Anac, onde a doutora Solange acha que o ressarcimento é
um problema para ser levado aos Procons, e não à agência, soltou uma resolução ao gosto das empresas. Se o atraso levar o passageiro a desistir da viagem, ele
terá direito ao reembolso do que já pagou. Indenização, nem pensar. Se a vítima veio de outra cidade para embarcar
numa conexão, ganha um bilhete de retorno e tchau. No caso de overbooking, a
Anac diz que a vítima deve negociar com
a empresa. Como? Virai-vos.
Pelo que Jobim anunciou em dezembro de 2007, um passageiro que pagou
R$ 323 por um voo Rio-Salvador e esperou três horas no aeroporto seria indenizado com R$ 48,45. Pela primeira minuta do projeto de lei, levaria R$ 32,30. Pelo projeto do dia 12, que entrará em vigor
sabe-se lá quando, a indenização sobe
para R$ 161,50. Pela resolução da Anac,
que vigorará a partir de junho, não tem
direito a nada.
A comissária Dilma precisa perguntar
aos doutores Jobim e Solange Vieira
quem fala sério.
O MEC PLANEJOU 1+1 = 2 E OBTEVE 1+1= -3
A megalomania do MEC
cravou mais um prego no caixão do Enem como sucedâneo do vestibular. Em março
do ano passado, o ministério
informou que as notas da garotada teriam validade nacional. Assim, um craque do
Piauí poderia conseguir matrícula em São Paulo. Santa
medida, tomada em nome de
uma política de redução dos
desequilíbrios regionais.
Quem ouviu a professora
Azuete Fogaça aprendeu: "Pode acontecer o contrário, um
aluno com nota baixa de São
Paulo pode migrar para uma
faculdade do Nordeste. Um
não tem nota, mas tem recursos. O outro tem nota, mas não
tem recursos". Não deu outra.
Os repórteres Fábio Takahashi, Patrícia Gomes e Angela
Pinho descobriram que São
Paulo importou 169 alunos e
exportou 2.531. O Piauí importou 612 e exportou 85.
Minas Gerais teve 431 vagas
ocupadas por candidatos de
São Paulo. Em nome do combate aos desequilíbrios regionais, o melhor que as universidades dos Estados importadores têm a fazer é fugir dessa
arapuca.
CHOQUE DE SCOTCH
Durante a passeata do governador Sérgio Cabral, na
quarta-feira, um escorpião
viu um camelô oferecendo
uísque Johnny Walker de rótulo preto a R$ 15 a dose. Ele
aceitava R$ 5 por duas doses,
o que não fazia diferença, pois
a bebida era falsa. A cena foi
filmada.
NO COLO DE LULA
Há um travo de uísque falsificado no debate em torno
da tunga que a emenda Ibsen
pode impor aos Estados produtores de petróleo. Seu texto é um monstrengo impraticável, resultado de um cochilo dos governadores interessados e da precariedade dos
acordos que fizeram. Esse pedaço do problema poderá ser
resolvido nos próximos meses, no mínimo seis, enquanto o caso tramita no Senado.
Pensando bem, considerando-se que o petróleo está a
8.000 metros de profundidade desde o início dos tempos,
se a discussão durar dois
anos, nada de ruim acontecerá por causa da demora.
Nos últimos dias um novo
dragão mostrou seu rosto. O
que se quer mesmo é derrubar o regime de partilha,
substituindo-o por um retorno às concessões.
Não se pode dizer que um
sistema seja melhor do que o
outro, pois uma partilha mal
desenhada é pior que uma
concessão bem planejada.
Mesmo assim, o DEM e um
pedaço do PMDB jogarão no
colo do Grande Mestre a defesa da sua proposta da partilha. Durante a campanha
eleitoral ela virá embrulhada
na bandeira nacional, com o
grito de "O Petróleo é Nosso".
Depois a oposição reclama
quando é acusada de ter desejado privatizar a Petrobras.
VENTOS CUBANOS
Nosso Guia precisa se preparar para a hipótese de um
surto repressivo em Cuba. Se
a ditadura castrista decidir calar as Damas de Branco, recorrerá à mesma metodologia
da China, do Irã e de Mianmar
(último flerte da diplomacia-companheira), jogando em cima dos dissidentes todo o poder de polícia necessário para
isolá-los, amedrontando a sociedade.
Para esses regimes, as revoluções europeias de 1989 são
aulas de fracasso de ditadores.
WARHOL E TUYMANS
Há duas grandes exposições
na praça. Uma por perto, a de
Andy Warhol (1928-1987) na
Estação Pinacoteca, em São
Paulo, com 170 trabalhos do
genial artista americano.
Num palpite audacioso, Warhol é o maior pintor da segunda metade do século passado.
Sua "Gold Marilyn Monroe",
que está no MoMA de Nova
York, é um dos melhores retratos de todos os tempos.
Quem for à Pinacoteca poderá
ver outra (boa) Marilyn. A Pinacoteca pretende colocar toda a exposição no seu sítio da
internet a partir de abril.
A outra exposição, do pintor belga Luc Tuymans, de 51
anos, está no Museu de Arte
Moderna de San Francisco.
Num tempo de miserê, ele é
um dos melhores pintores vivos. Alguns de seus trabalhos
lembram Giorgio Morandi
(1890-1964) e em seus retratos há uma crueza que contrasta com a alegria e o humor
de Warhol. Um deles, da ex-secretária de Estado Condoleezza Rice, é uma maravilha.
O retrato da Rice pode ser
visto numa reportagem do
"New York Times" intitulada
"Luc Tuymans, Putting the
Wrongs of History in Paint".
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