São Paulo, Domingo, 21 de Março de 1999
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CELSO PINTO

Os juros já podem cair?

A inflação está menor do que se esperava, a cotação do dólar está abaixo do projetado no acordo com o FMI, estão entrando mais dólares do que supunham as previsões do Banco Central. O que falta para o BC começar a baixar os juros?
O diretor de Política Monetária do BC, Luiz Fernando Figueiredo, admite que tudo isso está melhor do que se imaginava. Mas, diz, "é preciso ver o quanto é firme".
O BC vai considerar o quadro com calma, até porque seria muito ruim tomar uma decisão e ter que voltar atrás mais tarde. De outro lado, no entanto, "jamais iremos derrubar o nível de atividades além do necessário", observa Figueiredo.
O Copom, conselho que define os juros, se reúne no dia 14 de abril. Como foi definido um "viés de baixa" na última reunião, no dia 3, o BC pode baixar os juros antes da próxima reunião.
O diretor de Assuntos Internacionais, Daniel Gleizer, lembra que o mercado futuro passou a sinalizar uma queda dos juros para os próximos meses, o que é muito positivo. Tanto no caso dos juros quanto no do câmbio, observa, "a velocidade é dada pelo mercado: nós preparamos a estrada e o mercado faz o resto".
Outro sinal positivo é a decisão de voltar a vender R$ 500 milhões de papéis prefixados nesta terça-feira, algo que não acontecia desde junho do ano passado. O BC parou de vender papéis prefixados porque a desconfiança sobre o futuro fazia com que o mercado exigisse juros muito altos. Se o leilão for bem-sucedido, indicará uma maior confiança do mercado na queda futura dos juros.
Figueiredo diz que a intenção do BC é trabalhar de forma simples, com instrumentos e sinais claros, que possam ser entendidos e que gerem respostas do mercado. A volta dos papéis prefixados "é mais um passo para voltar a uma situação estável".
O BC havia criado um papel "híbrido": era prefixado durante algum tempo, depois virava pós-fixado. A intenção, agora, é vender os dois tipos de papéis em separado, para atender demandas diferentes.
Nem Figueiredo nem Gleizer comentam, mas outra fonte do BC confirmou à coluna que o BC comprou dólares nesta semana no mercado, algo que voltou a acontecer na sexta-feira. Gleizer passou a sexta-feira falando com bancos e constatou uma melhora na entrada de dólares tanto por linhas de curto prazo quanto por aplicações externas.
O BC, de todo modo, quer manter a cautela. Abril é um mês pressionado. Figueiredo diz que o acerto com o FMI de que o BC poderá gastar US$ 2 bilhões para atenuar a falta de dólares em abril foi conservador: previa uma queda adicional de linhas. Se a tendência atual de recuperação for mantida, haverá folga.
Há uma certa confusão no mercado sobre quanto, além dos US$ 2 bilhões, o BC poderia gastar. Figueiredo é taxativo: tudo o que o BC captar a mais, via emissão de bônus externo, entrada de dinheiro do BID ou Bird, ou mesmo compra de dólares no mercado interno, é um dinheiro a mais que poderá ser gasto em qualquer mês e não apenas no mês em que a entrada ocorre.
Com isso, o potencial de gasto do BC em março pode ser bem maior do que os US$ 2 bilhões. As regras de gasto também não são rígidas. O Brasil tem previsto um pagamento próximo de US$ 1,4 bilhão em títulos da dívida. Poderá pagar tudo, mesmo que, com isso, supere o limite de gasto semanal escrito na regra do acordo, diz Figueiredo. "Sempre prevalecerá a regra do bom senso", define.
Desde que o acordo geral esteja sendo cumprido, haverá flexibilidade. "Nenhum preso vai para a solitária por bom comportamento", compara.
A emissão de bônus internacional deve sair em abril, conforme as condições de mercado. Gleizer já tem mais de 20 propostas de bancos na mão. Sua prioridade não é emitir um volume tão grande, porque não precisa tanto, e sim cuidar da qualidade da emissão.
Ele quer explicitar uma estratégia de médio e longo prazo que faça sentido. Quer definir uma curva de juros melhor, onde haja indicação de custos para o Brasil para vários prazos futuros, em várias moedas, e que isso sirva como base indicativa para emissões privadas. Quer, também, melhorar a comunicação com o mercado externo, algo apenas iniciado no giro das últimas duas semanas.
Encerrada a votação da CPMF, a tarefa, agora, é provar que o governo pode implementar o programa fiscal. Ainda falta muito para ganhar a guerra.


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