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CRISE NO GOVERNO/ VIOLAÇÃO DE SIGILO
Em depoimento na CCJ, ministro diz que ele e Lula só ficaram sabendo detalhes da violação no dia 27, quando Palocci pediu demissão
Bastos nega ter "maculado" cargo de ministro
MARTA SALOMON
FÁBIO ZANINI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Em longa sessão na Câmara, o
ministro Márcio Thomaz Bastos
(Justiça) disse não ter a função de
"disseminar fofocas" ao revelar
que informara o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva da existência
de indícios de envolvimento de
Antonio Palocci na quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa seis dias antes da demissão do ministro da Fazenda.
Na Comissão de Constituição e
Justiça, Bastos negou ontem participação no caso, disse que a Polícia Federal agiu com independência, descartou sair do governo e
confirmou que indicou um advogado a Palocci: "Havia, claro, suspeitas, mas não é função minha
disseminar suspeitas, fofocas, rumores. Tinha o dever de manter o
presidente informado sem avançar em juízo que podia ter conseqüências desastrosas para o país."
Lula teria recebido o primeiro
informe sobre as "suspeitas" de
Bastos no dia 21 de março. Na terça seguinte à violação, Bastos participou de reunião de coordenação política do governo. Ao final
do encontro, Palocci lhe pediu
que indicasse um advogado.
Ao longo de quase oito horas de
sessão, Bastos negou que tivesse
cobrado uma explicação de Palocci sobre o pedido. "A mim, não
cabia perguntar se o ministro Palocci era culpado ou inocente.
Não sou a instância a que o ministro Palocci devesse confessa. Ninguém me faz confidências".
Bastos confirmou que indicou o
advogado Arnaldo Malheiros a
Palocci. "Indiquei um advogado e
considero que é um dever meu."
Negou porém os rumores de que
tenha ajudado a arquitetar a defesa de Palocci e do então presidente da Caixa, Jorge Mattoso.
Na presença de Bastos, Malheiros se reuniu com Palocci e Mattoso no dia 23. Nessa mesma
quinta, segundo relato de Bastos,
o presidente Lula discutiu, pela
primeira vez, a possibilidade de
afastamento de Palocci do cargo.
"O presidente da República foi
sendo informado à medida que
eu tinha informações", reiterou.
Mas nem Lula nem ele sabiam até
aquela altura, disse Bastos, que
Palocci recebera os extratos do caseiro na noite da quebra do sigilo.
Essa informação, disse, só teria
sido revelada por Mattoso à Polícia Federal na segunda-feira seguinte, dia 27. Durante o depoimento, Palocci pede demissão e
tem o pedido aceito por Lula. Na
seqüência, Mattoso é demitido.
"Não havia nenhum indício de
cadeia causal apurada. Havia suspeitas, impressões. E não posso
avançar sobre suspeitas", repetiu.
Bastos foi enfático ao negar que
tivesse participado de suposta
tentativa de ocultar a responsabilidade de Palocci e Mattoso na
quebra do sigilo. "Não tem nenhuma procedência, consistência, não existiu", afirmou Bastos
sobre a suposta oferta de R$ 1 milhão a um funcionário da Caixa
que assumisse a autoria do crime.
O principal atestado de independência do governo no episódio, afirmou Bastos, seria a pressa
com que a PF fez as investigações,
com a indicação de Palocci como
autor do crime. Disse, porém, que
as conclusões da PF não são definitivas e que os acusados terão direito à defesa. "Existe uma coisa
chamada presunção de inocência.
O que queriam que se fizesse?
Condenasse [o ministro] à morte,
que o esquartejasse? Fui e sou
amigo do ministro Palocci."
O ministro contestou a fama de
arquiteto de defesa de pessoas ligadas ao governo Lula e negou
que esteja demissionário: "Não se
construirá, à base de ilações, que
eu sou o grande Rasputin, o grande arquiteto das teses desse governo; sou ministro e vou continuar
ministro enquanto contar com a
confiança do presidente da República. Não vou pedir demissão".
Sem convencer a oposição, Bastos repetiu que não agiu fora da lei
ou da ética: "Tenho certeza de que
não maculei meu cargo de ministro da Justiça, não tresmalhei das
veredas estreitas da legalidade,
não fui além nem aquém do que
me permitia a Constituição, do
que me permitia a lei" disse.
Ele disse que só tomou conhecimento da vontade de Palocci de
ver a PF investigando o caseiro no
dia seguinte à quebra do sigilo.
Teve os primeiros relatos "fragmentados" dos encontros dos assessores Daniel Goldberg e Cláudio Alencar com Palocci ao voltar
de uma viagem a Rondônia, no
dia seguinte à violação. Três dias
depois do crime, soube por Goldberg que Mattoso estivera na casa
de Palocci na véspera do vazamento dos extratos: "Quando
soube disso, pedi a investigação".
Era domingo, dia 19, quando o
ministro recomendou ao diretor
da Polícia Federal, Paulo Lacerda,
a abertura de inquérito.
A portaria nš 120, assinada pelo
delegado Rodrigo Carneiro Gomes em 21 de março, desmente
um dos argumentos de Bastos.
Diferentemente do que disse, o
inquérito teve como um dos objetivos investigar o caseiro por suspeita de lavagem de dinheiro, e
não apenas a violação da conta.
Confrontado mais tarde com o
texto da portaria, disse que "o foco da investigação sempre foi a indignação com a quebra do sigilo".
A portaria da PF, porém, só cita a
violação como a terceira razão para a abertura do inquérito. Sobre
o ofício do Coaf (Conselho de
Controle de Atividades Financeiras) usado para investigar o caseiro, Bastos tampouco foi fiel aos fatos: o inquérito foi aberto após o
recebimento do ofício, não antes.
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